Jornal Estado de Minas

Pena de assistir a julgamentos é considerada inócua por especialista

Rapaz condenado por atirar em cinco policiais terá de acompanhar 10 sessões no 1º Tribunal do Júri de Belo Horizonte

Jorge Macedo - especial para o EM
Valquiria Lopes

 

Um jovem acusado de atirar em cinco policiais em agosto de 2012, em Belo Horizonte, recebeu uma punição inusitada

Denunciado pelo crime de tentativa de homicídio, JSB., à época com 19 anos, foi condenado a assistir a 10 sessões de julgamento no 1º Tribunal do Júri do Fórum Lafayette, como medida educativaA sentença também determina o cumprimento de quatro anos de reclusão, em regime aberto, porque penas iguais ou inferiores a esse período não implicam privação de liberdadeA decisão, que contraria especialista em direito por ser considerada sem efeito, é do presidente do 1º Tribunal do Júri, juiz Carlos Henrique Perpétuo Braga, que levou em consideração a necessidade de mostrar a J., as implicações e os perigos da vida no crime

Para calcular a pena, o juiz disse ter ponderado sobre o histórico de vida do jovem, afastado da família e da escola precocemente“Ele não teve a exata dimensão dos princípios da cidadania, que impõem direitos, mas também deveres”, afirma o juizPor se tratar de réu primário, com bons antecedentes e pelo fato dos policiais não terem sido atingidos pelos tiros no dia do crime, o magistrado aplicou uma atenuante para calcular a penaPrevisto no Código Penal, o benefício permite que nos casos de crimes praticados por pessoas com idade entre 18 e 21 anos, a pena seja fixada próxima do mínimoA punição para cada tentativa de homicídio varia entre seis e 20 anos de reclusão, reduzidos de um a dois terços
No caso de J., o cálculo foi feito sobre o mínimo de seis anos, e com a redução de dois terços, o que resultou em dois anos.

O rapaz ainda foi beneficiado por outro artigo do código, que trata dos crimes continuados, ou seja, praticados na mesma ocasião, mesmo lugar e com o mesmo modo de execução“Nessas circunstâncias, o juiz pode pegar qualquer das penas aplicadas aos crimes, se idênticas, ou a maior, se diferentes, e aplicar um aumento de até o triplo”, explica o magistradoEle afirma que optou pelo dobro e fixou a punição em quatro anos para os cinco crimes, que serão cumpridos em regime aberto, já que esse prazo não exige prisãoA decisão é definitiva, porque promotoria e defesa informaram que não vão recorrer, segundo o juiz.

Sobre a opção de aplicar a medida educativa, que impõe ao rapaz a obrigatoriedade de comparecer a 10 julgamentos no fórum, o juiz garante ser esta uma reação ao avanço da criminalidade“Tenho mais de duas décadas como juiz e observo que estamos perdendo a guerra par a violênciaBoa parte dos personagens dessa guerra são pessoas que se afastarem cedo dos bancos da escola e que não tiveram referência familiarAo chegarem na fase adulta, elas não têm a noção exata da verdadeira cidadania nem da gravidade de determinadas condutas”, defende Braga

INÓCUA Mas há a decisão do magistrado é contestadaPara o professor de direito penal Vitor Lanna, a medida considerada educativa não tem efetividade na ressocialização do réu“Não vejo nada de educativo
Pelo contrário, é uma decisão inócuaColocar um leigo para assistir a 10 sessões de julgamento vai resultar, no máximo, no entendimento de como funciona um júriEle não vai entender que tem que respeitar a lei”, afirma o advogado

Ele questiona ainda a legalidade da decisão“As punições, sejam penas ou ações educativas, têm de ter previsão legalO que é possível é aplicar limitações no final de semana, afastamento de determinados locais, como bares e casas de jogos, e a obrigatoriedade de frequentar cursos, por exemploEssa medida aplicada é uma exceção”, diz o especialista.