Jornal Estado de Minas

Assistência do Mais Médicos cai pela metade em Minas Gerais

Mais de 50% dos 107 profissionais formados no Brasil e indicados para municípios mineiros desistiram ou foram dispensados pelas prefeituras antes de começar a trabalhar

Tiago de Holanda
Mais da metade dos 107 profissionais formados no Brasil já selecionados para Minas pelo Mais Médicos desistiram de participar do programa ou foram dispensados pelas prefeituras antes de começar a trabalhar
O Ministério da Saúde havia anunciado na terça-feira que, dos 72 bolsistas designados para o estado na primeira etapa do programa, apenas 37 assumiram o cargo (51,4%)Levantamento feito pelo EM mostra que, na segunda fase, a proporção foi ainda menor: dos 35 escolhidos, somente 15 (42,8%) estão trabalhando ou confirmaram participação.


Os 416 médicos graduados no país selecionados na segunda fase teriam de se apresentar até segunda-feira passada aos municípios onde trabalhariam, ou seriam desligados do programa, segundo o ministérioQuem fosse recusado pelas prefeituras poderia, se quisesse, ser encaminhado a outras cidades

Dos 35 bolsistas que deveriam ter ido para 21 prefeituras, segundo a lista divulgada pelo governo, 14 informaram que desistiram ou não apareceram nem deram explicaçãoOutros seis foram dispensados pelos gestores municipais.

Segundo a Secretaria de Saúde de BH, uma médica inscrita na segunda etapa trabalha desde o dia 10 no centro de saúde do Bairro Jardim Vitória, Região NordesteOs outros dois indicados para a capital atuariam em unidades do Barreiro e da Pampulha, mas não se apresentaram

Em Brumadinho, na Grande BH, o médico foi contratado pela prefeitura antes de ser publicada a lista de selecionados do Mais Médicos“Havia uma vaga para saúde da família, ele entrou em contato conosco e contratamosNão sabíamos que ele tinha feito a inscrição”, informou a coordenadora de Atenção Básica, que se identificou apenas como Patrícia

Em Sete Lagoas, na Região Central, a profissional chegou a confirmar participação à coordenadora de Atenção Primária da Secretaria de Saúde, Sueli Barbosa, mas desistiu.

Em Coronel Fabriciano, no Vale do Aço, uma médica atende desde segunda-feira, mas as outras duas desistiram, segundo a coordenadora de Atenção Básica, Caroline Luz Pinheiro

“Uma delas disse que trabalha em Governador Valadares, onde ganha o mesmo valor da bolsa do Mais Médicos (R$ 10 mil), e por isso não compensaria se mudar de cidade”, contaOutra bolsista, Samaira Prado Coelho, de 34 anos, está fazendo especialização em dermatologia em BH e tentou adiar o início do trabalho, o que não é permitido“Quero trabalhar lá, mas só posso começar no fim de novembro ou no início de dezembroFalta apenas um mês para acabar a pós-graduaçãoMandei um e-mail para o ministério pedindo para adiar, mas não obtive resposta”, disse ao EM.

- Foto: Arte EM

Em Ipatinga, na mesma região, a única médica designada desistiu, segundo o secretário de Saúde, Eduardo Penna, porque queria trabalhar menos de 40 horas semanais, como exige o programa“Ela não queria cumprir essa carga horária”, informou PennaA médica atenderia de 15 a 25 pacientes por dia na cidade, que pediu oito médicos ao programa e conseguiu dois na primeira etapaEm Timóteo, no Vale do Aço, o médico alegou que desistiu “por problemas pessoais”, informou a coordenadora de Atenção Primária, Juliana Ávila de Souza.

Os dois designados para Passos, no Sul do estado, também desistiram, mas a Secretaria de Saúde não informou se eles se justificaramDos quatro bolsistas selecionados para Januária, no Norte de Minas, apenas dois estão trabalhando

Um dos três médicos destinados a Ubá, na Zona da Mata, desistiu
Em Fervedouro, na mesma região, o médico foi dispensado pela prefeitura depois de reclamações dos profissionais já contratados pelo município para a  saúde básicaSegundo o prefeito Carlos Corindon, os servidores têm salário de R$ 6,5 mil e queriam ganhar R$ 10 mil, valor da bolsa do colegaEle afirmou que a prefeitura só continuará no programa se o governo repassar verba suficiente para pagar R$ 10 mil a todos os médicos“Não vou criar mal-estar entre os médicos que já estão conoscoCorreria o risco de ganhar um médico e perder os outros”, disseCorindon informou que o profissional foi recusado também porque a prefeitura constatou que ele não tem experiência em atenção básica

Em Coração de Jesus, no Norte de Minas, cinco profissionais foram recusados, de acordo com a secretária de Saúde, Neila Souto“Não pedimos cinco, e sim quatroQueríamos pelo menos um para a unidade que está sem médico desde julho, mas eles demoraram demais para se apresentarContratamos em agosto um profissional que já morava aqui”, explicouA prefeitura desistiu de manter os bolsistas também ao descobrir que teria que dar auxílio para moradia, alimentação e transporte“Não poderíamos arcar com esses gastosO programa é muito confusoTivemos dificuldade para conseguir informações com o ministério”, criticouEm Itacambira, também houve uma desistência

Lincoln Lopes Ferreira, presidente da Associação Médica de Minas Gerais - Foto: JUAREZ RODRIGUES/EM/D. A PRESS %u2013 7/4/12CRÍTICA

As desistências já eram esperadas, na avaliação do presidente da Associação Médica de Minas Gerais (AMMG), Lincoln Lopes Ferreira“Se conversarmos com todos os médicos que desistiram, acredito que eles apontarão problemas de infraestrutura entre suas razõesO principal motivo que leva o brasileiro a não encarar esses lugares é a precariedade totalSem estrutura, planejamento e financiamento adequado, médico não faz milagre.”, analisa.