Jornal Estado de Minas

Centro de BH é uma arena da diversidade

EM mostra as nuances da Região Central, que se reinventa para dar lugar a diversas tribos

Jorge Macedo - especial para o EM
Jefferson da Fonseca Coutinho (textos)
e Alexandre Guzanshe (Fotos*)


Na estação do metrô, o vai e vem de passageiros é constante - Foto: Alexanadre Guzanshe/EM/D.A Press

Duas avenidas sangram e o vermelho da terra se moveNo redesenho das duas artérias – Santos Dumont e Paraná –, as estações ganham corpo para aliviar o asfalto e abrir passagemEspera-seEnquanto o futuro não vem, há quem reclame do escuro, da falta de segurança, do comércio ruim e da poeira dos canteirosAlheios às britadeiras, personagens de todas as tribos e gerações tocam a vida no vaivém das sombrasTrês turnos são pouco para a dimensão de diversidade no perímetroEndereço de trabalhadores, estudantes, aposentados, mendigos, viajantes, estrangeiros, religiosos, índios, hippies, amantes, trambiqueiros, pichadores, viciados e prostitutas, o Hipercentro, ainda que em grande parte feio e sujo, se reinventa frente ao crescimento desordenado de Belo HorizonteMas lá é possível ganhar a vida com gosto, envelhecer bem entre amigos e vivenciar prazeres raros na região

Fotos, ipês e mata-ratos

“Foto na hora! Foto!” é o grito de ganha-pão de Carolina Márcia, de 20 anosHá três anos, das 6h às 12h, a moça, mãe de Alex, de 3, atrai a clientela para o estúdio da Rua Carijós, na Praça Sete de SetembroO movimento é fraco e o cinza da manhã fria ofusca o famoso Pirulito no eixo das avenidas Afonso Pena e Amazonas
As lanchonetes populares ganham os primeiros trocados, enquanto o ciclista vence a faixa de pedestresA um quarteirão dali, na Praça Rio Branco, o ipê-rosa distribui flores que suavizam o concretoSob a garoa, homens e mulheres apressados se cruzam sem sorrir bom-dia.
No caminho para a estação do metrô, vendedores de cigarro madrugamDo alto da passarela, veem-se os restos dos pacotes e caixas de tabaco afearem o espaço próximo aos trilhos – é mais fácil livrar-se do lixo pelas costasSombrinhas coloridas dão alguma beleza ao lugar de passagemOs mais simpáticos não dão conta de esconder a cara amarrada“Acordar cedo é osso, fi!”, diz o freguês ao ambulante“Dá um mata-rato desse aqui, fi!”, emenda o compradorIncendeia o picado, paga em moedas e faz graça com a fumaçaOs shoppings populares, terras estrangeiras, ainda estão fechados.
Na rodoviária, no desembarque, a moça bonita espera o táxi
Puro charme, ereta, com o pé esquerdo pela ponta, exibindo o sapatinho dourado como quem dançaDelegação de jovens atletas espera a liberação da comissão técnica para o caféNo piso acima, o chão espelhado reflete a limpeza da estação rodoviária – chega a lembrar o aeroporto de Confins de outros temposO barbudo quer saber da música que vem da distribuidora de jornais e revistas“Não é CD, meu filhoÉ rádio”, diz a caixaA boa canção é “Nascente”, de Flávio Venturini e Murilo AntunesNos bancos de espera da plataforma, trio dorme sentadoNormal.

Beleza, betoneiras e BRT

Lorena Gomes, de 17, em salão de beleza na Rua Curitiba, espera a clientelaA jovem cabeleireira revela que chega a ganhar R$ 400 por dia de trabalho, com jornada de 12 horasNo JMX, o corte custa R$ 13 e a escova progressiva R$ 300Na Avenida Santos Dumont, o caos pelo amanhãAs obras do BRT – que vai se chamar Move, quando sair do lugar – deixa muito comerciante aborrecido na regiãoNo alto, o operário se confunde com a pichação que degrada os prédiosPróximo à Rua da Bahia, a restauração do Centro Cultural da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) é a boa notícia do quadrante.
O ponto de ônibus florido mal dá conta de tanta gente à espera do lotação na Avenida dos AndradasNo canteiro, os regadores banham o verde rasteiroDe longe, a paisagem é belaDe perto, o lixo no chão queima o filme do lugarBasta virar a cabeça para enxergar alguma beleza nas antenas comuns, ladeadas, sobre o Edifício Itatiaia, na Rua da BahiaPerto dali, na Rua Aarão Reis, a feiura da degradação é de doerMiséria e sujeira em combinação tristeSujeitos de pouca sorte disputam espaço com os que esperam a conduçãoNa Estação Central do metrô, o entra e sai diminui pelo andar da hora.
No vagão em movimento, sentido Eldorado, distante dos subterrâneos, o rapaz, de pé, lê O céu, livro de Rodolfo Caniato, o matemáticoViagem breve até a Estação LagoinhaPelo caminho, um esbarrão, dois sorrisos e um “olá”De resto, o avanço longe dos engarrafamentosAs betoneiras em trânsito mandam ver concreto na Avenida Paraná, tomada de “busões” em mão únicaNo riscado em obras, em meio às bancadas de cuecas e calcinhas baratas – R$ 2 –, moteizinhos fazem dinheiro com as promoções: R$ 30 a hora

Contrastes no labirinto


Na Avenida Olegário Maciel, trupe de clowns dá lição de respeito às leis de trânsitoO motoqueiro abusado avança o sinal e por muito pouco não vira estatística na esquina de Rua dos TamoiosUm dos clowns leva as mãos à cabeça: palhaçadaInstrumentos musicais reluzem no Mercado NovoJá no Mercado Central, uma festa sensorialViagem de texturas, cheiros, sons, cores e sabores no labirinto mais interessante do HipercentroDo lado de fora, na Avenida Augusto de Lima, meia dúzia de pássaros canta liberdade na amoreira de copa alta, longe do alcance dos homens.
O Centro de Referência da Moda é atração na Rua da Bahia, junto ao Conjunto Arcangelo MalettaUm mundo numa esquinaConfluência de história da vida política e cultural da cidadeAinda não é meio-diaO Parque Municipal Américo Renné Giannetti é um conviteEntre gatos, no ponto do trenzinho, o casal de namorados é um só no balaço em banco verde e branco.                    
  
* As fotos foram feitas com celular