Jornal Estado de Minas

Vinte e cinco índios recebem diploma em ciências sociais e humanidades da UFMG

Patrícia Giudice
Na solenidade de diplomação na Faculdade de Engenharia, os formandos fizeram questão de usar trajes típicos para receber o título universitário - Foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press

Saias de palha, cocares e pinturas pelo rosto e corpoSem beca ou capelo, sob os olhares atentos e orgulhosos de parentes e amigos, a primeira turma de licenciatura em ciências sociais e humanidades, curso superior da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) voltado para os povos indígenas, se formou ontemEles receberam o diploma de lideranças e especialistas em causas indígenas e vão atuar como professores em suas tribos.

Vinte e cinco homens e mulheres, das etnias pataxó e xakriabá, colaram grau no auditório da Faculdade de EngenhariaAntes, iniciaram um ritual na na entrada do prédio da Faculdade de Educação, onde foi fixado um mastro como ponto de referência e encontroApenas cinco dos que iniciaram o curso em 2009 não deram continuidadeEles fizeram vestibular específico quando a UFMG inicioun o programa Formação Intercultural de Educadores Indígenas (Fiei)

Donizete Barbosa de Souza, de 28 anos, xakriabá do Norte de Minas, considera o momento em que viveu com os colegas uma vitória para os direitos indígenas“Significa união e é isso que passo para os alunosPrecisamos ser unidos para buscar mais saúde, educação, moradia.” Em sala de aula na aldeia, faz questão de passar aos alunos um saber maior sobre o mundo“Faço uma relação entre a universidade e a escola”, afirmou

Além de ter se tornado professor ontem, Donizete é técnico em saúde bucal formado pela Escola de Saúde Pública de Minas Gerais e atua em consultório na aldeia
Agora, já cursa gestão em saúde pela Universidade do Mato Grosso, a distância.Com o filho Txayhênawê, de 3, ao lado, Vanuzia Bonfim Vieira, de 26, pataxó, estava orgulhosa da sua dedicação nos quatro  anos de curso“Sempre esperamos por este momento, é mais uma vitória para os povos indígenas”, disseEla quer mais conhecimentosE já planeja fazer um curso de pós-graduação em história indígenaA mãe e a tia vieram da aldeia na BahiaEla dá aulas há quatro anos no ensino fundamental e médio, de história geralUm do seus objetivos é fortalecer a história dos povos indígenas

DEDICAÇÃO Há quatro meses, Célia Nunes Xakriabá, de 24, entrou na sala de aula para ensinarEla é professora de cultura para alunos de 5ª a 8ª série na aldeiaAntes, se dedicava ao movimento pelos direitos aos índios e fez parte da Comissão da Juventude Indígena e das Mulheres Indígenas de Minas Gerais e Espírito Santo
Nas discussões, busca políticas afirmativas e a luta territorial“Estamos consquistando nosso espaçoAgora, quero dar continuidade aos estudos”, disse Célia planeja ingressar no mestrado de gestão territorial da Universidade de Brasília (UNB)Para ela, o desafio na educação indígena é abrir as portas dos cursos de direito“É um curso essencial, importante par lutarmos pelos nossos direitos”, afirmou.

Entre os nove pataxós, duas formandas são mulheresNa etnia xakriabá, elas foram maioria: 11 mulheres e três homensOutras duas pessoas, não indígenas, se formaramAlém do curso de ciências sociais e humanidades, a UFMG oferece as licenciaturas em ciências da vida e natureza, matemática e línguas, artes e literaturas, hoje com 140 alunos

A diretora da Faculdade de Educação, Samira Zaidan, explicou que o curso formou professores para aldeias onde havia escolas sem educadoresQuem dava aulas para as crianças geralmente não era da triboA carga horária, segundo ela, se dividiu entre aulas na UFMG e nos locais de origem“É um currículo intercultural que mescla a cultura deles e os conhecimentos do brancos”, afirmou

Os professores acadêmicos são profissionais que já estudavam a cultura e a língua indígena e muito de cada disciplina foi sendo arquitetado ao longo dos quatro anos com os mais velhos de cada etniaAtualmente, a UFMG abriga ainda nos cursos da Fiei as etnias tupiniquins, maxakalis, pankararus, guaranis e tuxás.