Jornal Estado de Minas

Belo Horizonte mostra beleza quando vista do alto

Capital explica a quem a vê do alto, mesmo sem palavras, a razão de seu nome, revelando um panorama muitas vezes ignorado até por quem conhece o dia a dia da cidade

Jorge Macedo - especial para o EM

Sandra Kiefer

  Vista da capital com a Serra do Curral ao fundo - Foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press

 Belo Horizonte é mais do que um nomeParece mesmo um convite a cada morador, um apelo ao forasteiro ou um chamado ao visitante que pisa nestas terras pela primeira vezA cidade pede, e quem ouve não se arrepende: aproveite o céu límpido de maio e contemple a linha que delimita o céuApenas pare, por uns instantes, escolha um dos muitos mirantes, naturais ou não, que se oferecem ao observadorRespire fundoOlhe a paisagem mais uma vezE então, está vendo?

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Quem sobe ao topo do Shopping Ponteio, encravado nas montanhas, com acesso pela BR-040, vê o Sol se transformar“Ao cair da tarde, o Sol fica enorme, amarelo e vermelhoEnquanto está descendo, parece que vai girando, girando e descendoLembra um girassol”, diz o diretor de marketing Luiz Sternick, de 53 anos, enquanto abre os braços para dar ideia do tamanho do espetáculoSempre que pode, ele usa do privilégio que o cargo lhe dá para ter acesso ao teto – ponto de visitação restrita, por questão de segurança

Sternick tem olhos de artistaE dos bonsPremiado em Cannes e em Paris, na França, vai expor quadros no Museu do Louvre, de 17 a 23 de dezembroAntes disso, até o dia 30 deste mês, seu trabalho pode ser visto em Belo Horizonte, no Museu Inimá de PaulaParte da inspiração para as obras vem da cobertura do centro de comprasPraticante da cabala, Sternick crê que é preciso elevar o pensamento aos céus: “É um privilégio e é de graça! Conheço pessoas que passam anos sem reparar na paisagemSó olham para cima para ver se está chovendo”.

 No início do século passado, os contornos do pôr do sol em Belo Horizonte atraíam os olhares do memorialista Pedro Nava, então estudante do Ginásio Anglo-Mineiro, que existia onde hoje funciona a sede do Corpo de Bombeiros, no alto da Avenida Afonso Pena“Na época, havia pouquíssimas edificações na cidadePedro Nava contava que, sentado com os colegas nas escadarias da escola, conseguia enxergar o sol no horizonte, por trás das árvores da Praça da LiberdadeSegundo ele, o astro tinha um tom intenso, como se estivesse em chamas”, revela Michele Arroyo, superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em Minas Gerais

Ela conta que, ao tomar a decisão de tombar o prédio dos bombeiros, em 1996, a primeira atitude foi checar se a origem da memória do escritor teria sido preservada“Infelizmente, não se consegue mais ter essa visada”, diz a historiadora, usando termo próprio da área.

Na Av. Antônio Carlos, suavidade das curvas sem a dureza do cotidiano - Foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press

 A sensibilidade do pintor e do escritor consagram o que imagina o senso comum: a melhor visão da metrópole não está no asfalto“Nosso mirante é melhor que o do (Bairro) Mangabeiras”, compara Misael Avelino, diretor da Rádio Autêntica FavelaAcima da antena, no Aglomerado da Serra, Misael é capaz de informar na rádio comunitária o movimento de aviões nos aeroportos Carlos Prates, Pampulha e Confins“Não tenho binóculo, é só no olho”, garante, dizendo, porém, que aos poucos vão ficando ocultos pedaços desse mosaico“Já não vejo mais o Edifício JKConstruíram duas torres onde havia o antigo restaurante Favela, tampando a obra de Niemeyer”, comenta.

 Do ponto de vista histórico, Belo Horizonte fez opção pela beleza ao emplacar o próprio nomeInicialmente, a nova capital seria chamada de Cidade de MinasNa cidade planejada, confiada às mãos do engenheiro Aarão Reis, havia o bairro voltado para os funcionários públicos, separação entre zona comercial e residencial e a área destinada a abrigar a sede do governoNo entanto, os projetistas se esqueceram de incluir nos planos os operários responsáveis pela construção da cidade, as pessoas que moravam no povoado de Curral del-Rei e os escravos libertos pela recente abolição

“A Cidade de Minas não deu conta de abrigar a totalidade das pessoas dentro do traçado da Avenida do ContornoA cidade então perdeu o nome mais político e pretensioso e assumiu outro, que enfatiza a característica ambiental e a beleza do horizonte”, ensina Michele ArroyoSegundo consta no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH), o município foi registrado como “Bello Horisonte” apenas em 11 de agosto de 1901, quase quatro anos depois da fundação, em 12 de dezembro de 1897, depois de longo período de dúvidas e disputas que o novo batismo gerou entre a população

 

- Foto: Marcos Michelin/EM/D.A PressDo céu...

Com 3.800 horas de vôo, quase oito vezes mais que as 500 horas exigidas para ser patrulheiro aéreo, o tenente-coronel Ledwan Salgado Cotta (foto) comanda 138 militares da unidade de elite da PM de Minas, que completa 238 anos com ênfase em operações especiaisDe cinco a 10 vezes ao dia, os pilotos desafiam a gravidade com helicópteros sem janelas para facilitar o posicionamento de armas, cordas e facõesSão acionados para dar apoio a viaturas em terra, socorrer feridos e intervir em caso de incêndios“Quando comecei na profissão, voar era o que me dava mais prazerAgora é a missão”, define LedwanAo sobrevoar a cava de uma mineradora, o comandante nem repara na beleza da lagoa azulRevela detalhes do salvamento de dois jovens, ocorrido no lugar em 2003“Os dois estavam treinando, quando um escorregou e cortou o braço, quase separando o pulsoTombei com a aeronave e guinchei o rapaz para cimaEle havia perdido muito sangue e já estava em confusão mentalDepois, já recuperado, veio nos visitar e contou que, quando bateu a luz do farol, achou que já estava morto e que aquela luz era Deus.”

- Foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press… ao inferno

A impressão sobre BH depende do ângulo do observadorPosicionado no 36º andar do Edifício JK, o fiscal de trânsito Sílvio Simões (foto) enxerga apenas carros, congestionamento e cruzamentos lá embaixo, a uma altura de 100 metrosEle é um dos olheiros designados pela BHTrans para vigiar o trânsito da sacada do prédio, projetado por Oscar Niemeyer na década de 1950Faltando um ano para se aposentar, Simões mantém a indignação do início da carreira quando avista de longe um motorista invadindo um cruzamento“A verdadeira visão do apocalipse é o trânsito de BH depois das 18h”, desabafaQuando dá o horário marcado por Simões, a Praça Raul Soares está totalmente parada“Eu não disse? Quando um carro invade o cruzamento, prejudica o resto todoÉ igual engrenagem de relógio: se uma delas não anda, trava tudo.”