Jornal Estado de Minas

A velha feição da praça central

Local onde cabeça de Tiradentes foi exposta é uma incógnita

Quem vê hoje a Praça Tiradentes pulsando no coração barroco de Ouro Preto nem imagina o seu formato nos tempos da Conjuração Mineira
O diretor do Museu da Inconfidência, Rui Mourão, revela que o espaço, antes conhecido como Praça da Cadeia, era metade do que existe hoje, portanto, o monumento inaugurado em 21 de abril de 1892, centenário da execução de Tiradentes, não seria o ponto certo onde ficara pendurada, numa gaiola, a cabeça do mártirMesmo assim, há placa afixada no granito: “Aqui em poste de ignomínia esteve exposta sua cabeça”

Mourão esclarece que as ruas Cláudio Manoel (antiga Ouvidor) e Conde de Babadela (Direita) não estavam abertasDessa forma, a praça parava aliÉ possível que a estaca tenha ficado uns 20 metros acima do monumento contemporâneo, em direção ao Palácio dos Governadores, uma construção bem menor do que a atualHavia ainda o pelourinho, a Igreja de Santa Quitéria e a Santa Casa, ambas demolidas, além de moradias, destacamento da polícia e a cadeia“A Câmara tinha apenas o lado esquerdo pronto, sendo edificada pelo governador da Capitania de Minas (de 1783 a 1788), Luís da Cunha Menezes”, diz MourãoUm desenho que teria sido elaborado em 1780, nove anos antes da Inconfidência, contido no livro Imagens de vilas e cidades do Brasil Colonial, de Nestor Goulart Reis, mostra o aspecto da praça nos primórdios

 O certo mesmo é que, caminhando por Ouro Preto, alguém sempre aponta um lugar onde estaria a cabeça do líder da conjuraçãoAfinal, muitos livros registram o episódio, alguns à luz do espiritismo, e gerações não se cansam de discutir o assunto
“É uma história recheada de mistérios, é melhor deixar como está”, pondera a escritora Angela Leite Xavier, autora da obra Tesouros, fantasmas e lendas de Ouro PretoMas, refletindo um pouco mais, Angela acredita que, se o crânio fosse encontrado, Tiradentes ganharia finalmente um rosto, como ocorreu com o conjurado José Resende Costa, que viveu na Região do Campos das Vertentes e morreu, aos 70 anos, em 1798, no degredo, na Guiné-Bissau, na ÁfricaHá dois anos, foi divulgada a reconstituição facial do heróiPara isso, desde 1993 a equipe do professor Eduardo Daruge, da Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), esteve envolvida com pesquisas e minucioso trabalho sobre os restos mortais.

No livro de Angela, um capítulo contempla o caso que intriga moradores e visitantesCom ilustração do artista plástico e restaurador José Efigênio Pinto Coelho (três encapuzados sob a estaca com a cabeça), o texto conta que um homem comprou uma casa nas Lajes, “guiado por suspeitas de que a cabeça do herói estaria enterrada ali”Vasculhou cômodos, o quintal, até achar uma estrutura de pedra identificada como altar maçônico, devido aos desenhos“As buscas continuaram, mas, de concreto mesmo, só foram localizados cachimbos de barro de escravos, moedas antigas e objetos de ferro.”

Inspiradas pela busca que nunca chegou ao fim, histórias ligadas à cabeça de Tiradentes se multiplicaramUma lenda antiga ainda pode ser ouvida na cidadeDepois da morte do herói, um frade andava à noite segurando a cabeça no Morro da Forca, com escadaria de 100 degraus, e na Cruz das Almas, onde há uma capelinha dedicada a São Miguel e Almas, atualmente com movimento intenso de veículosChafarizes também viraram alvo das especulações
“A vida de Tiradentes é muito romanceadaFalam até que a cabeça teria sido enterrada com o ouro dos inconfidentes”, lembra a turismóloga Angélica Gonçalves, que trabalha em um hotelEla já ouviu que um dos pontos onde o crânio poderia ter sido sepultado seria o chafariz do Bairro Taquaral, de 1866Pena que o lugar esteja malcuidado, sujo, com muito mato e cacos de vidroApenas um filete escorre na pedra, sendo impossível provar da água

Já nas Lajes, há outro chafariz, com jorro intenso, apontado também como forte candidato a ser o lugar secreto, pois remonta à época da InconfidênciaAlguns donos de imóveis coloniais citados como candidatos em potencial a “guardar” a cabeça nem gostam de tocar no assuntoE até se irritam“Eles têm medo de que façam escavações no terreno e destruam a propriedade”, diz um morador de Ouro Preto.