Jornal Estado de Minas

Precisa-se de padres no país dos católicos

CNBB calcula serem necessários 10 mil novos sacerdotes para atender à demanda no país e trabalha para estimular vocação. Em BH, número teria de dobrar

Gustavo Werneck

Eduardo Parreiras, Ronaldo Brito e Eduardo Araújo ingressaram no seminário em BH: igreja aponta sobrecarga e busca mais sacerdotes - Foto: GLADySTON RODRIGUES/EM/D.A PRESS

 

Faltam padres no Brasil, a maior nação católica do mundoHá cerca de 20 mil deles atuando nas paróquias, mas para suprir a demanda dos fiéis são necessários mais 50% desse total – o ideal, na avaliação da Igreja, é um sacerdote para cada 10 mil pessoas em todas as regiões do país“Mas acredito que cinco mil religiosos já ajudariam a resolver a questão”, diz o padre Domingos Barbosa Filho, presidente nacional da Organização dos Seminários e Institutos do Brasil (Osib), entidade vinculada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)“O problema não é só a falta de padres, mas a má distribuição do clero no paísA maior parte está concentrada nas regiões Sul (25%) e Sudeste (45%), enquanto o Norte (3%) sofre com a falta”, completa ele, também diretor do Instituto Católico de Ensino Superior do Piauí

Ex-presidente da Osib, padre Paulo Batista Borges, titular da Paróquia de São Sebastião, em Uruaçu, município do Norte de Goiás, reconhece que houve grande queda nas vocações, nas décadas de 1960 e 1970, depois da realização do Concílio Vaticano II (1962-1965), que trouxe uma série de mudanças na Igreja e, na avaliação dele, má compreensão de uma nova teologia“Muitos deixaram o ministério, mas, nos anos 1990, houve uma retomada e crescimento no número de candidatos”, afirmaUma das alternativas para aumentar os candidatos está na pastoral das vocações e no trabalho missionárioNo Brasil, há 700 casas de formação de padres (seminários diocesanos, regionais e estaduais)Na capital mineira, o pioneiro é o Seminário Arquidiocesano Coração Eucarístico de Jesus, da Arquidiocese de Belo Horizonte, que comemora 90 anos e conta com 42 alunosHá também outros pertencentes a ordens, congregações e dioceses do interior



“A região amazônica é carente em padres, havendo localidades sem celebração de missas nos fins de semanaMas mesmo em áreas rurais da Arquidiocese de BH temos problemas, pois as pessoas têm dificuldades para fretar um ônibus e viajar 40 quilômetros até a igreja mais próxima”, conta o padre Marcelo do Carmo Ferreira, responsável pela secretaria do Seminário Arquidiocesano Coração Eucarístico de Jesus e coordenador do processo de admissão de candidatosAlém da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), os futuros sacerdotes contam com a estrutura da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje)“Em outras localidades, as missas dominicais ocorrem nas quartas ou quintas-feiras, devido à indisponibilidade do celebrante no fim de semana”, completa o padre MarceloA situação leva os sacerdotes a uma sobrecarga: chegam a rezar até cinco missas, quando o aceitável são três a cada domingo

Ciente do problema, padre Marcelo vai além das estatísticas“Em Belo Horizonte, precisamos do dobro de padres e, no país, o triplo.” No Brasil, a Igreja tem estimulado as vocações e um dos atrativos é oferecer gratuitamente o curso de teologia, situação bem diferente da Espanha, que chegou ao extremo de lançar uma campanha na mídia destacando que o padre é um profissional que tem salário e nunca fica desempregadoNas celebrações, o arcebispo dom Walmor Oliveira de Azevedo sempre diz, numa referência às vocações: “A messe é grande, mas são poucos os operários”, lembra o padreConforme a arquidiocese, BH tem 675 padres e diáconos.
 
VIDA RELIGIOSA

O seminário da Arquidiocese de BH acompanha a média nacional de ordenação de seis padres por anoO número foi maior em 2010 (veja quadro)

São necessários oito anos de estudos – um preparatório, três de filosofia e quatro de teologiaPara ingressar, é preciso ter acima de 17 anos e ensino médio completo e quem já tem curso superior fica apenas cinco anosAs estatísticas em BH mostram que não basta querer para chegar ao altar da igrejaNo ano passado, de 52 pessoas que pediram informações, apenas 10 ingressaram no seminárioA entrada na vida da comunidade requer frequência nas missas, experiência na catequese, presença em grupo de jovens e círculos bíblicos, conhecimento da Igreja por dentro e compromisso com o celibato

Eduardo Pereira de Araújo, de 31 anos, se interessou pelo seminárioCom porte de atleta, serviu o exército, ficou noivo e hoje está no primeiro período de teologiaDe mãe protestante, só na adolescência ele foi estudar numa escola católica e sentiu o despertar da vocaçãoHá quatro anos e três meses, Eduardo resolveu ser padre“Me atraem o trabalho pastoral, o convívio com o povo e a vida em comunidade”, diz EduardoNa capela do seminário, Ronaldo Brito, de 42, primeiro ano de teologia, diz que começou a falar em ser padre por volta dos sete, oito anosJá adulto e de casamento marcado, Ronaldo foi à Igreja de São Judas Tadeu para fazer a crisma e mudou o pensamento

“Foi nesse período, em 2003, que o desejo renasceu e eu terminei o noivadoPara ser padre, é preciso esvaziar tudo de si para doar ao outro”, conta RonaldoFilho único e de pai kardecista, Eduardo Parreiras Silva, de 32, teve trajetória diferenteEm 2000, ele entrou para o seminário e ficou três anos e meioDecidiu sair e só retornou ao seminário 10 anos depois, período em que namorou por seis anos“O chamado de Deus foi mais forte”, afirmaO padre Marcelo Ferreira ressalta que a coordenação do seminário verifica se o candidato está apto“Não é que ele pode ou não ser padreA questão é se está prontoTudo deve ser do jeito certo”, diz.