Ser criança é coisa do passado para as novas gerações de brasileirinhos
Preocupados com essa realidade, pelo menos 100 casais passaram a manhã de ontem na Paróquia Nossa Senhora Rainha, no Bairro Belvedere, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, discutindo maneiras de lidar com o fenômeno da chamada adultização infantilO workshop foi promovido pelo movimento Resgatando a Infância, fundado há um ano e meio por especialistas de diversas áreas, que já conta com a adesão de cerca de 300 pessoas no Facebook“Por mais que a gente alerte nos consultórios, os pais não conseguem enxergar a gravidade da situação dos seus filhos, que estão tendo sua infância encurtada e a adolescência esticadaElas estão embarcando na ondaSe a filha da fulana faz, a minha também pode”, diz a coordenadora do movimento, Cristina Silveira, psicopedagoga e psicanalista infantil.
Antes da hora, meninos e meninas são chamados a participar do mundo dos adultos, seja assistindo à televisão até tarde, navegando descontrolados pela internet ou saindo à noite para restaurantes com os pais, que não têm mais tempo livre com as crianças
Na semana passada, a pediatra atendeu o caso de uma pequena paciente que, aos 10 anos, parecia profundamente entristecidaApertou os pais contra a parede, que buscaram apurar a causa da mudança de humorPor intermédio da rede de relacionamentos virtuais Facebook, a garota tinha acessado um site de pornografia“Ela ficou tão chocada com o que viu que ficou triste, não sentia mais vontade de viver nem conversarEra demais para alguém que não tinha glândulas mamárias”, explica FilomenaEla se reuniu com a criança para explicar a diferença entre a pornografia e o sexo feito com amor
As cenas se repetem cotidianamente nas portas dos colégios particulares da capital mineiraNo aguardo dos pais, babás ou motoristas, os alunos travam uma guerra de celulares para avisar que a aula acabou e já podem ir buscá-losAs meninas retocam o batom e postam fotos das colegas na internet“Queria que o quadro negro fosse um espelho bem grande”, brinca M., de 10 anos, que usa a câmera do telefone para checar se o cabelo está arrumadoEla conta que a amiga Jleva no bolso do uniforme duas cores de batom, rímel e espelho“Em todo intervalo da aula ela retoca a maquiagemAcho uma bobagemNo lugar do espelho, levo meu telefone”, explica.
A mãe da menina, a empresária A., é dona de loja de roupas infantojuvenis em shoppings de luxo na capitalPara a empresária, o comportamento é geral: “Quem não sofre com isso está mentindoTenho mães que compram R$ 5 mil em roupas para as filhas e deixam elas usarem saias minúsculas de paetêsNem é tanto a roupa que incomoda na minha filha, é o fato de ela achar que é dona do próprio nariz e querer ir ao cinema sozinha com a turma da escolaNão dá”, desabafaSegundo a psicopedagoga Cristina Silveira, as meninas se vestem como mocinhas, mas ainda não têm maturidade para enfrentar o assédio que vão passar a receber“As escolas viraram um shopping para oferecer produtos extraclasseNão basta ofertar o ensino ou a parte cognitivaÉ preciso ajudar as famílias a nutrir com valores e criar uma moldura social para proteger as criançasA família tem de ser forte e não ceder”, ensina.
Números
47%
das crianças com idade entre 9 e 16 anos, no Brasil, entram na internet todos os dias, segundo a pesquisa TIC Kids On-line 2012
59%
das crianças de 5 a 9 anos já utilizaram um celular e 24% dos pequenos já têm um aparelho próprio aos 9 anos, segundo pesquisa TIC Crianças 2010
5h
é o tempo médio que a criança brasileira fica na frente da televisão por dia, segundo dados de pesquisa do Ibope em 2011Elas assistem a cerca de 40 mil propagandas em um ano