Jornal Estado de Minas

Bichos estão sob suspeita de leishmaniose no Zoológico de Belo Horizonte

Animais de duas espécies da família dos canídeos abrigados pela Fundação Zoo-Botânica de BH teriam contraído a doença e visitantes temem ser contaminados

Mateus Parreiras
Zootecnista Aldre Brito passeava com o filho, de 2 anos, e se mostrou preocupado com a notícia do surgimento da doença no zoo - Foto: Marcos Vieira/EM/D.A Press

As doenças que levaram à morte animais como a gorila Kifta, no último sábado, quase um ano depois de o companheiro Idi Amim falecer, não trazem perigo apenas aos 3,5 mil animais do acervo do Zoológico de Belo HorizonteHá enfermidades em espécies que ameaçam visitantes menos avisadosA reportagem do Estado de Minas teve acesso a informações de profissionais ligados à instituição que dão conta de que os cinco cachorros-do-mato-vinagre e os dois lobos-guará que vivem ali estão contaminados por leishmaniose visceral, uma doença transmissível ao homem e que pode levar à morte, especialmente crianças, idosos e pessoas debilitadasO zoológico confirma que um primeiro exame apontou a doença, mas que mais testes precisam ser feitos para confirmar a situaçãoEnquanto isso, domingo passado, esses animais continuavam circulando em seus recintos a menos de dois metros dos visitantes.


A Secretaria Municipal de Saúde informou ontem que a Gerência de Zoonoses da Pampulha foi comunicada sobre a presença de um cachorro-do-mato-vinagre com exame positivo para leishmaniose, mas aguarda um novo resultado para confirmar a doençaAo contrário do que a secretaria recomenda para os animais domésticos afetados pelo tipo visceral da doença, que é o sacrifício, o órgão informou que no zoológico foram tomadas medidas como borrifação do local e isolamento do animal.

Em 2012, até novembro, o Sistema Único de Saúde (SUS) registrou pelo menos 84 internações médicas de pessoas com leishmaniose visceral em BHNos leitos desses hospitais houve pelo menos uma morteO Ministério da Saúde estima que a letalidade da doença seja de 90% quando não há tratamento logo no início da manifestação do malA leishmaniose é uma infecção causada pelo protozoário Leishmania chagasi, transmitido pelo mosquito-palhaOs cães são os hospedeiros mais comuns do protozoário, contaminando mosquitos que se alimentam de seus sangue, e estes, por sua vez, transmitem a doença aos homensBH é considerada área endêmica da doença, ou seja, ela circula com frequência pelo território.

O Manual de Vigilância e Controle de Leishmaniose Visceral no Brasil, editado pelo Ministério da Saúde, determina que animais infectados devem ser sacrificados e não submetidos a tratamento, uma vez que a pasta não considera esse procedimento eficaz

E a eutanásia, ainda que polêmica, tem sido a prática do Centro de Controle de Zoonoses de BH no que se refere aos cães errantes e de propriedade privadaContudo, essa parece não ser a estratégia a ser seguida pelo zoológicoDe acordo com a chefe da Seção de Mamíferos da Fundação Zoobotânica, Valéria Pereira, caso seja confirmado que os animais estão contaminados o procedimento será outro“Vamos procurar um tratamento para as espécies”, dissePereira não considera que representem perigo imediato aos visitantes e por isso não removeu os espécimes suspeitos de estar doentes da exposição“Nós aplicamos remédio no pelo dos animais e colocamos coleiras com repelentes para impedir que os mosquitos os piquem e depois possam ter contato com os visitantes”, diz

CRÍTICAS No domingo passado, a reportagem do EM constatou a presença de pelo menos três cachorros-do-mato-vinagre e de dois lobos-guará, todos sem coleiras no pescoçoPior do que isso, a área onde ficam é especialmente infestada por mosquitos, sendo comum ver os visitantes se abanando para afugentar os insetos inoportunosO zootecnista Aldre Brito, de 30 anos, passeava com a mulher e o filho, de 2 anos, e se mostrou preocupado com a informação de que os animais poderiam estar contaminados por leishmaniose visceral“Só de haver uma suspeita, esses animais deveriam ser afastados
Não se brinca com a saúde das pessoas que vêm aqui com suas famílias, achando que é seguro”, afirmaO psicólogo Rodrigo de Souza Lopes, de 41, que também levou a família para conhecer os animais selvagens, considera perigoso a exposição de espécimes doentes“A gente não sabe até onde essas mortes de bichos têm haver com a falta de condições ou de tratamento que recebemMas a segurança do visitante deve ser a prioridade”, salienta.

A morte da gorila Kifta trouxe vários questionamentos sobre as condições do zoológico e a situação de saúde de alguns animaisA direção confirmou que um dos tigres estava com uma doença renal gravíssima e de difícil tratamento, desde que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) o retirou de um circo e entregou aos cuidados da instituição, há 6 mesesRumores sobre a morte de um dos rinocerontes foram negados e a direção confirmou que uma praga infectou os flamingos e todos tiveram de ser mortos para não contaminar outras avesA doença teria chegado ao zoológico, segundo a instituição, trazida por aves migratórias que frequentam a Região da Pampulha.

SAIBA MAIS

PRINCIPAIS TIPOS

Leishmaniose é uma doença transmitida por protozoários do gênero leishmaniaNo Brasil há atualmente seis espécies de protozoários responsáveis por causar doença humanaAs variedades mais encontradas são a leishmaniose visceral  (LV) e a leishmaniose tegumentar americana (LTA)A primeira é conhecida como calazar, esplenomegalia tropical e febre dundum

A LV é transmitida ao homem por meio da picada do inseto vetor (Lutzomyia longipalpis) conhecido popularmente como mosquito-palha, birigui, asa branca, tatuquira e cangalhinhaEsses insetos têm hábitos noturnos e vespertinos, atacando o homem e os animais principalmente no início da noite e ao amanhecerOs sintomas mais frequentes são febre e aumento do volume do fígado e do baço, emagrecimento, complicações cardíacas e circulatórias, desânimo, prostração, apatia e palidezPode haver tosse, diarreia, respiração acelerada, hemorragias e sinais de infecções associadasQuando não tratada, a doença evolui podendo levar à morte até  90% dos doentesPor sua vez, a LTA é uma doença infecciosa, não contagiosa, que provoca úlceras na pele e mucosasÉ transmitida ao homem pela picada das fêmeas do mosquito flebótomo infectadasAs lesões mucosas são mais frequentes no nariz, boca e gargantaQuando atingem o nariz podem ocorrer entupimentos, sangramentos, coriza e aparecimento de crostas e feridasNa garganta, dor ao engolir, rouquidão e tosse.