No presépio, junto à manjedoura, um nome faz brilhar o recorte de papel: Carolina Antunes Terzis Parreiras – bilhete de amor chegado à imagem do Menino Jesus. A letra é da mãe, fé e fortaleza. Em 2011, pedido de desespero em tempos de dor. Há um ano, enquanto a menor bebê do Brasil lutava pela sobrevivência na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal do Hospital Vila da Serra, em Nova Lima, na Grande BH, a família reunida no Bairro das Mangabeiras, na Região Centro-Sul da capital, em prece, celebrava o milagre. A bênção de todos os dias desde 16 de novembro – data em que a pequeníssima Carol, com 360 gramas e 27 centímetros, veio ao mundo para fazer história e tocar profundezas. Ano corrido, arrastado por vezes, o bilhete de amor nominal, luminoso, segue entre os três reis magos, que guardam a menina-estrela. Carol, valente que só ela, chegou a pesar 280 gramas. Contrariando estatísticas que em todo o mundo indicavam apenas quatro sobreviventes nessa incrível faixa de medida, a mocinha surpreendeu especialistas e desafiou a medicina.
Na casa do avô grego Konstantino Terzis, de 65 anos, até o Papai Noel, como quem escala enfeite de entrada, parece querer vencer as paredes para se juntar ao grupo pelo sorriso sem igual de Carolina, carinhosamente chamada de Carol. O vovô ateniense, coruja, anuncia: “Essa menina é incrível. Uma médica me disse, emocionada: ‘Os anjos estão voltando’”. Sem demora, lá vem ela: vestidinho azul, arranjo brilhante no cabelo, sapatilhas prateadas, bem ao estilo bailarina, e sorriso lindo, cativante, de envergar e fazer valer a luta. A pequena notável, traquinas e sorridente, como a boa gente miúda e saudável, de futuro, já sabe até brincar com o pai e divertir a mãe.
“Ela ri. Só ri. Não sei como essa menina aguenta. É uma luta”, diz Alexandra, orgulhosa, entre um mimo e outro. Difícil mesmo saber de onde vem tanta força e vontade de viver. Não bastasse o tempo de UTI – cinco meses e 18 dias –, ainda são regulares os encontros com a equipe médica, que inclui, além do pediatra, especialistas em oftalmologia, nutrição, fonoaudiologia e fisioterapia. Tudo para que Carol, intrépida, tenha o melhor desenvolvimento, sem a menor sequela.
Thiago interrompe o chamego na filha para reviver aquele 16 de novembro, parto às pressas pela salvação da mãe e do bebê. “Tive com ela meia hora depois do nascimento. Era inacreditável. O dedão da Carol era do tamanho da cabeça de um palito de fósforo. Todos disseram que as chances eram mínimas. Daquele tamanho seria inviável, disseram.
“E ele escondeu muito bem, porque parecia estar forte o tempo todo, aguentando firme, sempre que entrava no quarto do hospital depois de ter notícias da Carol”, sorri, cúmplice, Alexandra. As imagens, como filme, parecem voltar à retina de Thiago: “Fiquei chocado com o primeiro contato na UTI. Difícil até dizer. Ela lá, pequenininha, entubada. Criaram um cordão umbilical artificial para ela se alimentar. Taparam os olhos dela. Era pele e osso.” Alexandra cobre o silêncio, suspiro sentido do marido: “Me marcou muito quando pude vê-la. O tamanho. A finura da pele, que eu vi tremer.”
As lições de tempos difíceis
É a vez do pai, forte outra vez, cobrir o embargo emocionado da mulher, aos pés da árvore iluminada.
Interessadíssima na roda, olhos brilhantes, falta ainda força para Carol manter-se firme no colo dos pais. Daí a fisioterapia, para unir força e vontade naquele milagre do nascimento. Thiago volta ao assunto daqueles dias de novembro, que não lhe deixam a cabeça: “No quinto dia, não vou esquecer nunca, toquei a mão dela e ela apertou, assim, o meu dedo. Ela apertou forte o meu dedo, foi o que bastou para me dar força”, sorri. Das lições dos tempos mais difíceis, o mecânico fala em fé. “É preciso acreditar que, se é da vontade do Senhor, tudo vai dar certo. É importante ter paciência para esperar pela recuperação e sabedoria para ajudar no que for preciso”, diz.
O milagre aos pés da manjedoura
Alexandra não desfez o presépio do ano passado. Manteve o escrito, apelo de amor, com o nome da filha na manjedoura. A psicóloga revela que o recorte de fé foi sugestão da especialista em neonatologia, tamanha a gravidade do estado de Carol. “A doutora perguntou se eu tinha um presépio em casa.E falou para eu colocar o nome dela na manjedoura”. Naquele dezembro, com complicações no intestino e nos pulmões, a pequena sobrevivente apresentava ainda menor chance de futuro. “Ouvimos que ela não chegaria até o Natal”, diz, comovida. Mãe coragem, fé e esperança, Alexandra trouxe o Menino Jesus à gruta de Belém por todo 2012. Na noite de amanhã, mãos ao céu, nova prece pelo milagre da vida..