Jornal Estado de Minas

S.O.S. para um cassino

Restauração de cassino gera expectativas em Lambari

População da cidade do Circuito das Águas está otimista quanto à preservação de um dos ícones arquitetônicos da região, depois que o MP conseguiu liminar na Justiça neste sentido

Gustavo Werneck

O imponente prédio construído às margens do Lago Guanabara, na instância sul-mineira, foi inaugurado em 24 de abril de 1911 - Foto: Beto Novaes/EM/D.A Press - 11/2/05

Moradores e defensores do patrimônio cultural de Lambari, no Sul de Minas, a 345 quilômetros de Belo Horizonte, estão em grande expectativa quanto à restauração do Cassino do Lago, construído em 1911 e considerado um dos ícones arquitetônicos e turísticos, embora abandonado, do Circuito das ÁguasNa segunda-feira, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) conseguiu, na Justiça, uma liminar determinando que a Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig), proprietária do imóvel, adote medidas para preservação do bem tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG) e municípioA decisão inclui também a prefeitura, que é concessionária do prédio por meio de um comodato firmado com a Codemig em 1980 e em vigor até 2015.

“Temos que pensar no cassino de Lambari como uma paisagem cultural, um grande complexo aquífero”, diz o historiador e professor Francislei Lima da SilvaPara ele, é fundamental que toda comunidade participe do processo de preservação do conjunto formado pelo lago, parque e prédio“Ele engloba o patrimônio material e também imaterialAcreditamos que o melhor será transformá-lo, depois do restauro, em museu da cidade”, propõe o historiador.

Pela decisão judicial, a Codemig está obrigada a implantar, em 60 dias, um sistema de vigilância armada no local, além de apresentar, nesse mesmo prazo, um projeto de restauração integral do imóvelO descumprimento da sentença gera multa diária de R$ 10 mil, conforme determinou o juiz Márcio Augusto Oliveira BuenoAutores da ação, os promotores de Justiça Marcos Paulo de Souza Miranda, coordenador das promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico (CPPCs); Cláudio de Oliveira Filho, da ´Comarca de Lambari; e Bérgson Guimarães, coordenador de Meio Ambiente da Bacia do Rio Grande, afirmam que a empresa não tem zelado pelo imóvel

Na ação, os promotores destacam o Cassino do Lago como obra-prima da arquitetura e um dos mais importantes bens culturais de Minas: “A edificação de estrutura centenária e suntuosa, como a de antigos palácios, impressiona e chama a atenção de visitantesOs azulejos, ladrilhos, vasos sanitários e telhas foram importados da França e da Inglaterra, e sua decoração recebeu obras de arte da China e do JapãoA construção gerou altos custos aos cofres públicos

E na solenidade de inauguração, estiveram presentes o presidente da República, Marechal Hermes da Fonseca (1855–1923), e o governador de Minas, Júlio Bueno Brandão (1858–1931)

Marcos Paulo conta que o MPMG tentou firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Codemig, mas a empresa se recusou a acordá-lo“Estamos tentando o entendimento se há dois anos, sem sucessoNesse período, o cassino foi deteriorando, virando pouso para andarilhos e moradores de rua, tornando-se alvo de pichações e outros problemas”, diz o coordenador do CPPCOs três promotores querem ainda que, no fim da ação, a Codemig restaure o prédio, depois de apresentar o projeto arquitetônico ao Iepha“Um bem restaurado deve ter função social, podendo ser um centro cultural ou até mesmo um hotel”, ressalta Marcos Paulo, citando Araxá como bom exemploAlém de Lambari, o MPMG tem procedimentos instaurados para garantir a conservação dos parques das águas de Cambuquira e do distrito de Águas de Contendas, em Conceição do Rio Verde, ambas no Sul de Minas

Projeto

A secretária de Turismo de Lambari, Ana Paula Nunes dos Santos, participou de uma reunião recente na Codemig e adianta que a empresa já tem um projeto de restauro pronto para ser submetido à apreciação do Iepha-MG“Também está concluído um plano de ocupaçãoO cassino vai ser o Museu Regional das Águas”, afirma a secretáriaHá 10 anos, diz Ana Paula, a comunidade está na luta para preservação do prédio, que foi fechado em 2010
“Numa visita a Lambari, o governador Antonio Anastasia almoçou no cassino e mostrou o seu empenho pela recuperação”, revelaA direção da Codemig, empresa pública vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais, informa que vai aguardar a notificação judicial para falar sobre o assunto.


Tombado desde 2002

Tombado em agosto de 2002, o cassino de Lambari, de características ecléticas, fica às margens do Lago GuanabaraFoi idealizado por Américo Werneck, que nasceu na antiga província do Rio de Janeiro, freguesia de Bemposa, município de Paraíba do Sul, e foi jornalista, engenheiro, agricultor político e escritorConvidado em 1909, pelo governo mineiro, para assumir a Prefeitura de Lambari, Werneck recebeu a incumbência de transformar a cidade em uma das melhores estâncias hidrominerais do paísA firma carioca Poley e Ferreira executou os projetos do então prefeitoEm 24 de abril de 1911, com a presença de políticos ilustres, foi inaugurado todo o Complexo Lambari, que inclui o cassino (o maior dos edifícios), o Lago Guanabara, leiteria, fábrica de gelo, um mercado de flores, avenidas etc

O cassino de Lambari ocupa 2,8 mil metros quadradosSegundo pesquisas do Iepha, profissionais do Japão vieram para embelezar os salões, os quais foram decorados com rico acervo de bens móveis e arte aplicadaLustres de cristal, candelabros, quadros, estatuetas de gueixas, jarras, espelhos incrustados, dragões e garças douradas compõem os vários ambientesO Salão das Senhoras (Salão Japonês) e o principal são destaquesAs fachadas receberam exagerado tratamento de detalhes ornamentaisPor causa de desavenças entre o prefeito e o governo estadual, o cassino de Lambari funcionou apenas por um breve período


MEMÓRIA: Ameaça de fogo
Na madrugada de 29 de abril, um incêndio atingiu o prédio do antigo cassino de Lambari, destruindo grande quantidade de livros guardados num cômodo, no andar térreoO fogo foi contido por uma equipe da prefeitura e voluntários, que usaram extintores e um caminhão-pipa Quando os bombeiros chegaram, verificaram as estruturas e fizeram o rescaldoO local foi isolado para perícia da Polícia CivilNa tarde do dia anterior, moradores deram um abraço coletivo no prédio pedindo melhorias para o ponto turístico da cidade.