Guerra e paz, os dois monumentais painéis que Cândido Portinari (1903–1962) fez na década de 1950 para a sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, é a obra escolhida para inaugurar o V&M Brasil Centro de Cultura, ex-Cine Theatro Brasil, na Praça Sete, Centro de Belo HorizonteA exposição ficará em cartaz por 60 diasO mês de abertura da nova casa de arte e entretenimento também já foi definido: setembro do ano que vem, informou ontem o presidente da Fundação Sidertube, mantida pela empresa V&M do Brasil (VMB), Alberto CamisassaFechado desde 1999 e adquirido em 2006 pela empresa, o prédio com mais de oito décadas de história vai abrigar duas salas de espetáculo – uma com 1,1 mil lugares e outra com 200 –, auditório, galeria e café-livraria“O local vai funcionar como cinema e teatro”, adiantou Camisassa
Na tarde de ontem, o presidente do Projeto Portinari, João Cândido Portinari, filho do pintor, fez o anúncio oficial da exposição, lembrando que os painéis, cada um medindo 14 metros de altura por 10 metros de largura e pesando duas toneladas, estarão no Brasil, sob responsabilidade da entidade que ele dirige, até o fim o serviço de restauração da sede da ONU“Apresentar essas obras em Belo Horizonte é motivo de emoçãoMorei aqui quando criança, por volta dos cinco anos, quando o meu pai trabalhou no projeto da Pampulha Tenho, portanto, uma relação antiga e forte com a capital mineira”, disse João Cândido, ressaltando que poucas cidades têm um espaço de grandes dimensões, como o futuro centro de cultura da Praça Sete, para receber Guerra e paz
A obra será exposta junto de alguns dos 180 estudos, muitos gigantescos, que o pintor modernista fez durante quatro anos até pintar os painéis, num prazo de 90 dias, em 1955, disse João CândidoA mostra terá também filmes sobre o trabalho
Dedicados pelo autor “à humanidade”, os painéis chegaram ao Brasil em 2010 e foram mostrados em exposições no Theatro Municipal do Rio de Janeiro – em 12 dias, compareceram mais de 40 mil pessoas – e no Memorial da América Latina, em São Paulo SPNo Palácio Gustavo Capanema, no Centro do Rio, os murais foram restaurados por especialistasA próxima mostra será em Brasília (DF), sendo BH a quarta capital do país a receber a exposiçãoDepois de estar presente na entrega do Prêmio Nobel da Paz, em Oslo, na Noruega, e de uma visita à China, os murais poderão retornar ao Rio para nova exposição durante a Copa de 2014“Ganhamos o prazo de mais um ano para devolução dos painéis”, disse João Cândido com satisfaçãoTambém ontem foi lançado o site www.vmcentrodecultura.com.br, no qual é possível conhecer os passos da reforma e a trajetória da casa.
Revitalização
Com investimento de R$ 50 milhões, o V&M Brasil Centro de Cultura teve as obras de restauro iniciadas em 2007De acordo com a Fundação Sidertube, braço da V&M do Brasil, do grupo francês Vallourec, para projetos sociais e culturais, os serviços de restauro do prédio, inaugurado em 1932 e tombado pelo Instituto do Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha/MG), preservaram as características originais
O evento de divulgação da primeira exposição e do mês de abertura, comunicado de manhã ao governador Antonio Anastasia pela direção da empresa e por João Cândido, foi realizada no sétimo andar do prédio Também foi assinado um termo entre representantes da empresa e João Cândido“Uma exposição dessa natureza inclui Belo Horizonte no circuito internacionalUm espaço assim para a cidade é fabuloso”, comemorou o superintendente de Museus e Artes Visuais da Secretaria de Estado da Cultura, Leonardo BahiaPara o superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Leonardo Barreto de Oliveira, o empreendimento vai ajudar a revitalizar o Centro da cidade e criar uma ligação com a Casa do Conde, sede do Iphan, Museu de Artes e Ofícios (MAO), na Praça da Estação, Serraria Sousa Pinto, prédios da Rua Sapucaí e outros do início do século 20
Obra de arte
Outros tempos
Uma cortina que se reabre
Recordo-me da primeira vez que fui ao Cine Theatro Brasil, em 1966, para assistir ao filme Cortina rasgada, de Alfred Hithcock, com Paul Newman e Julie Andrews, Fiquei boquiaberto com o confortoPor ser central, era uma sala das preferidas pelos cinéfilos da épocaProcurei saber de sua história e soube que o cinema, em estilo art-déco, abriu pela primeira suas portas em 14 de julho de 1932, depois de quatro anos de construção Na plateia havia 1,6 mil pessoas vestidas com trajes de gala, e na tela, o filme Deliciosa (Delicius, 1931), estrelado por Janet Gaynor e Raul RoulienDurante o período em que funcionou, a casa teve, além da fitas, animados bailes de carnaval, shows e muitas festasNa década de 1970, quando eu já estava no jornalismo, a sala levou muita gente às filas para ver faroeste-spaghetti ou bangue-bangue à italiana e fitas de artes marciaisOs áureos tempos do grande cinema estavam distantes e o declínio foi se aproximando, principalmente com a chegada de salas mais modernas e com equipamentos (para a época) de última geraçãoO anúncio da reinauguração do prédio onde o cinema funcionou, com novo enfoque, nos dá a sensação que a história de BH começa ser reescritaPara o bem da nossa cultura. (Otacílio Lage)