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Estado de Minas DA LENTIDÃO À IMPUNIDADE

Demora para exame pode aliviar punições a motoristas suspeitos de embriaguez, alertam especialistas

Condutor acusado de matar no Belvedere só esteve no IML oito horas depois


postado em 18/09/2012 06:00 / atualizado em 18/09/2012 06:36

Estudante Michael Donizete Lourenço ficou detido no Detran e só foi examinado muito depois da batida (foto: Maria Tereza Correia/EM/D.A Press)
Estudante Michael Donizete Lourenço ficou detido no Detran e só foi examinado muito depois da batida (foto: Maria Tereza Correia/EM/D.A Press)
Entre o acidente que matou o estudante de administração Fábio Pimentel Fraiha, de 19 anos, na madrugada de sábado, na Avenida Nossa Senhora do Carmo, no Bairro Belvedere, Centro-Sul da capital, e o momento em que o motorista Michael Donizete Lourenço, de 22, foi submetido a exame clínico no Instituto Médico Legal (IML) para constatar embriaguez, passaram-se oito horas. Com sintomas de ter ingerido bebida alcoólica, Michel atingiu com um Land Rover o Focus de Fábio, se recusou a fazer o teste do bafômetro e foi autuado por homicídio com dolo eventual.

Segundo a Polícia Militar, ocorrências complexas, principalmente com vítimas, podem levar, sim, todo esse tempo. Em abril, um securitário de 22 anos que, ao bater de carro no Bairro Ipiranga provocou duas mortes e deixou três pessoas feridas, só foi submetido ao exame clínico no IML depois de ser atendido no hospital, mais de 24 horas depois do acidente. Ele também apresentava sinais de embriaguez e estava em alta velocidade. Para especialistas, a demora pode prejudicar os exames e a punição dos culpados.

O coordenador de Operações Especiais do Detran, delegado Ramon Sandoli, não quis falar ontem sobre os prejuízos na demora para a confirmação dos sinais de embriaguez dos motoristas, mas no fim de semana ele chegou a dizer que o atraso da PM em apresentar Michael poderia influenciar o resultado do exame. De acordo com especialistas, o álcool é uma substância química que sofre metabolismo ao passar do tempo, diminuindo sua concentração e, consequentemente, seus efeitos aparentes. Michael foi autuado por homicídio com dolo eventual, quando se assume o risco. O rapaz, que também estaria em alta velocidade, se recusou a soprar o bafômetro, alegando não confiar no aparelho.

Exame físico

O delegado Cláudio Utsch, chefe da Delegacia Especializada em Acidentes de Veículos (Deav), assumiu o inquérito onte. Ele ainda não recebeu o laudo do exame clínico de Michael, que pode levar pelo menos 15 dias para ficar pronto. O médico legista, nesses casos, observa batimentos cardíacos, pressão, aspecto avermelhado dos olhos, alinhamento das vestes, coordenação motora e grau de memória do suspeito. Há ainda entrevista e exame físico, inclusive de caminhada em linha reta.

O estudante também não forneceu amostras de sangue para exame, uma vez que a lei lhe faculta o direito de não produzir provas contra si. No inquérito, porém, policiais militares relatam sinais de embriaguez. No caso do exame clínico, ele é apenas submetido à avaliação do médico.

“Quanto mais tempo se leva para fazer qualquer exame para constatar embriaguez é pior porque o álcool se desfaz e diminui sua concentração no organismo”, diz o chefe do Laboratório de Toxicologia da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Carlos Alberto Tagliati. Segundo ele, qualquer exame consegue ser mais fiel quando avalia o indivíduo duas horas depois que ele bebeu. Se tiver apenas 15 minutos, por exemplo, o teste do bafômetro acusará um teor alcoólico altíssimo, mas precisa ser repetido, uma vez que a substância medida foi a que se concentra na mucosa bucal. “Quando ele sopra o bafômetro, queremos medir o ar que sai dos pulmões e que mostra a concentração de álcool no sangue. Por isso, deve-se esperar um pouco mais e refazer o teste”, explica.

Para o especialista, o exame clínico pode ter sido prejudicado, já que, oito horas depois, a concentração de álcool no sangue estaria muito mais baixa do que a real, sobretudo se o rapaz tiver bebido água ou eliminado a substância pela urina. “Se bebeu café forte, então, ele pode ter ficado mais inteiro e já não estar mais cambaleante”, afirma Tagliati.


Morosidade na ocorrência

 Médica, professora de psiquiatria da Faculdade de Medicina da UFMG e pesquisadora sobre alcoolismo, Tatiana Mourão lembra que a concentração de álcool varia de acordo com o ritmo do metabolismo de cada um, estilo de vida, quantidade de álcool ingerido, tempo que parou de beber e se ele tinha se alimentado. “Depois desse tempo, ele não vai mais estar como no começo porque o álcool sofre metabolismo hepático ao passar das horas e a concentração diminui. Mas outros elementos também interferem nisso”, diz ela.

O acidente ocorreu pouco antes das 4h, no sábado. Responsável pelo atendimento, a viatura do 22º BPM foi acionada às 4h20. O boletim de ocorrência foi elaborado na 127ª Companhia da Polícia Militar em vez de ter sido feito diretamente na delegacia do Detran. Michael só foi apresentado à Polícia Civil às 11h30, onde foi novamente ouvido e foi ao banheiro pelo menos uma vez. Só ao meio-dia ele foi levado ao IML, para passar pelo exame clínico.

De acordo com o assessor de imprensa do 22º BPM, tenente Paulo Geovanny, a equipe teve trabalho em elaborar o documento de 10 páginas, com histórico do acidente e informações de sete envolvidos. Ele considera o tempo razoável e afirmou que a equipe iniciou o registro às 6h30 no Detran, argumentando que é responsabilidade do delegado determinar o encaminhamento do suspeito ao IML. Ao ser informado de que os militares só chegaram às 11h30 à delegacia, ele explicou que o procedimento pode ser feito em qualquer posto ou unidade.

“Normalmente vão para a DP, mas eles podem ter se deslocado para a companhia por causa do computador à disposição para iniciar a ocorrência. É preciso sinalizar e isolar o local, chamar socorro, reboque e perícia”, justificou o policial. “Só esses policiais (que estavam ontem de folga) poderiam dizer se houve algum problema ou o motivo do atraso. Acho que é um tempo normal pela complexidade do acidente, com vítima fatal, mas, numa análise básica, até concordo que o rapaz poderia ter sido levado antes. No entanto, não é nossa conduta levar o caso fracionado. A gente conduz as partes e as informações à delegacia de uma vez.”

Memória
Avaliação clínica 24 horas após acidente

 

Em abril, o securitário Rodrigo de Oliveira Campos, de 26 anos, provocou um acidente na Rua Jacuí, no Bairro Renascença, ao bater no carro de uma família. Um cadeirante e a mulher dele morreram. Três pessoas ficaram feridas. Apesar de o limite de velocidade da rua ser de 40km/h, o velocímetro do carro parou na marca de 130km/h com a batida. A PM relatou que o securitário apresentava hálito etílico e olhos avermelhados. Alcindo Souza, que era cadeirante, foi atirado de seu veículo a 30 metros e morreu na hora. A mulher dele, Maria do Carmo Gomes de Souza, de 52, e o filho do casal, Pedro Henrique Gomes de Souza, de 12, também foram jogados para fora do Uno. Duas pessoas que estavam no Vectra de Rodrigo também ficaram feridas. O rapaz chegou a ser preso e responde por homicídio com dolo eventual (quando se assume o risco) e lesões corporais dolosas. Mas só fez exame clínico 24 horas depois do acidente.


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