Jornal Estado de Minas

Das 15 vítimas da doença em Minas, sete não chegaram a usar o antiviral Tamiflu

Demora: Tamiflu deve ser administrado até 48 horas após os primeiros sintomas

Valquiria Lopes

De acordo com a Secretaria de Estado da Saúde, basta levar receita a um posto para conseguir o Tamiflu - Foto: Ministério da Saúde/Divulgação %u2013 4/8/09

Investigação epidemiológica feita em Santa Catarina, no Sul do Brasil, pode evidenciar um problema grave também em Minas: o tratamento tardio da gripe A (H1N1)Conforme a análise feita pela Secretaria de Saúde daquele estado em parceria com o Ministério da Saúde, 28 das 52 pessoas que foram a óbito por lá começaram o tratamento com o antiviral Oseltamivir mais de cinco dias depois do surgimento dos sintomasO medicamento, indicado para evitar o agravamento da doença, conhecido comercialmente como Tamiflu, deve ser prescrito até 48 horas após o aparecimento dos sintomasNo perfil das vítimas também foi constatada a presença de doenças crônicas, como cardiopatias, pneumopatias, obesidade e diabetes

Em Minas, apesar de não haver investigação epidemiológica das mortes, o quadro do Sul pode se repetir, já que apenas 53,3% (oito das 15 vítimas) foram medicados com o Tamiflu durante a internação e grande parte dos mortos tinha doenças crônicas preexistentesExemplo disso foram as mortes do pastor Eduardo Silva, de 67 anos, e de sua esposa, a professora Maria Lúcia Soares Silva, de 59, vítimas do H1N1Moradores de Pedrinópolis, no Alto Paranaíba, eles tiveram o quadro de gripe agravado, mas não chegaram a receber o medicamento

A família afirma que houve retardo na prescrição médica, enquanto a Superintendência Regional de Saúde informa que eles demoraram a buscar atendimento na rede de saúde“Os dois eram portadores de doenças crônicas e não se trataram em tempo hábilForam encaminhados para Uberlândia, onde tiveram o teste confirmado, mas nesse caso nem chegaram a ter o medicamento Tamiflu prescrito, porque já estavam com quadro grave e o antiviral só é indicado para sintomas leves e moderadosQuando saiu o teste, eles já estavam na UTI e não resistiram”, informou o superintendente da Superintendência Regional de Saúde de Uberaba, Iraci José de Souza Neto

Responsável pelas regiões do Triângulo Mineiro e Sul de Minas, onde está concentrada grande parte dos óbitos e casos de gripe A/H1N1, Neto afirma que essa parte do estado já registrou sete casos da doença, sendo que três estão em investigação e não constam na planilha da SES.

Para a Secretaria de Estado da Saúde o percentual pode estar relacionado com a demora dos pacientes em buscar o atendimento médico diante do início dos sintomas da doença “Muitas vezes, o paciente tem os sinais da gripe e espera para se recuperar em casaIsso favorece o uso tardio do medicamento, já que o uso ideal nas primeiras 48 horasEle pode ser prescrito depois, mas o maiores benefícios ocorrem nos primeiros dois dias depois dos sintomas”, explica o médico infectologista e consultor da SES Guenael FreireCom o retardo da entrada na unidade de saúde, explica o especialista, o efeito esperado do medicamento não é atingido, já que a evolução da doença ocorre de forma rápida

A secretária substituta de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Sônia Brito, reforça a afirmação de FreireSegundo ela, tratamento dos casos agudos de gripe é uma situação relativamente nova e as pessoas ainda não absorveram completamente essa cultura“Foi a partir da pandemia, em 2009, que começamos a tratar a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e as pessoas ainda têm a ideia de que devem esperar em casa para melhorar.”

Alerta aos médicos

Sônia, no entanto, atribui também ao profissional médico o retardo na prescrição da medicação específica para o tratamento da gripe A/H1N1 “Isso tem questão cultural, da população, mas também da formação dos profissionais médicosAté pouco tempo atrás, fundamente a partir da pandemia, tinha-se a ideia de que mesmo os quadros agudos da gripe não eram tratados”, disse a secretária.

Apesar de não traçar relação da análise feita em Santa Catarina com outros estados, Sônia acredita que a investigação seja um retrato da realidade no país
“Não ouvimos outras equipes de investigações, mas é possível supor que em todo o país houve retardo no tratamento”, afirmaDiante disso, a secretária voltou a lembrar a recomendação do ministério de prescrever o Tamiflu para os casos de gripe em pessoas que façam parte dos grupos de risco (gestantes, crianças pequenas, idosos e pessoas com doenças crônicas) ou para aqueles que tenham risco de agravamento dos sintomas da gripe.

Segundo ela, o ministério já fez a distribuição de 418 mil caixas de Tamiflu para todas as secretarias estaduais de saúde, que podem pedir novas doses, caso necessário.


Sul do país já tem 108 vítimas

Porto Alegre – Com mais nove vítimas registradas no Paraná e quatro no Rio Grande do Sul, subiu para 108 o número de mortes em consequência da influenza A (H1N1) – gripe suína, na Região Sul do país (52 em Santa Catarina, 33 no Rio Grande do Sul e 23 no Paraná)Os três estados já contabilizam juntos 1,6 mil casos da doençaAs informações são de autoridades locais da área de saúde.

O Rio Grande do Sul já soma 33 mortes em decorrência da gripe A neste ano, segundo boletim divulgado pela Secretaria de Estado de Saúde na tarde de ontemSão quatro novas vítimas da doença desde o levantamento anterior, do dia 12O estado também ultrapassou a marca das duas centenas de casos de pessoas infectadas pelo vírus H1N1 no anoSão 218 casos confirmados, ante 192 diagnósticos que constavam do boletim do fim da semana passada

O número, no entanto, é bem menor do que os 635 casos confirmados e 52 mortes em Santa Catarina, conforme dados contabilizados até o dia 10 de julhoSem novas doses da vacina contra a gripe, a Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul tem focado mais no tratamento dos casos da gripe por meio da indicação do antiviral Oseltamivir, conhecido com o nome comercial de TamifluPacientes que forem diagnosticados com síndrome gripal devem ser tratados com o medicamento, que está sendo distribuído gratuitamente nos postos de saúde, com a exigência de apresentação de uma receita médica simples.

Três técnicos do Ministério da Saúde vão ao Rio Grande do Sul para investigar as mortes por gripe A no estadoEsse mesmo levantamento já foi realizado pelos técnicos em Santa Catarina, onde morreram 52 pessoas pela gripeOs profissionais federais deverão se somar à equipe estadual que já elabora um raio x das vítimas, com o objetivo de detalhar seu perfil – idade, vacinação, doenças anteriores – até a manifestação dos primeiros sintomas da doença

Mais infectados

O Paraná voltou a registrar mortes em decorrência da gripe A, alcançando 23 vítimas do vírus H1N1 neste ano, conforme boletim divulgado ontem pela Secretaria Estadual de Saúde do estadoNo boletim anterior, divulgado na segunda-feira passada, as mortes somavam 14 casos, assim como no boletim prévioAinda segundo o documento, o Paraná assume liderança de pacientes diagnosticados, 760São 172 a mais do que apontado no levantamento da segunda-feira passada, crescimento de quase 30% no número de pessoas contaminadas pelo vírus.

TIRA-DÚVIDAS SOBRE A GRIPE A (H1N1)

O que é?

Infecção pelo vírus Influenza, que se associa, em geral, com doença de evolução aguda e febril das vias aéreasOcorre em surtos anuais, de grande contágio e gravidade variávelPode produzir diversas síndromes clínicas, rinofaringite, faringite, traqueobronquite e pneumonia, além de complicações variadas, favorecendo, inclusive, a infecção por outros microrganismos

Quais são os sintomas?
O primeiro indício da doença é a febre, que pode vir associada a dor de garganta e tosseTambém são comuns congestão nasal, mal-estar, dor muscular e nas articulações, dor de cabeça, coriza e rouquidãoO quadro pode evoluir para otites, sinusites, bronquites e até mesmo quadros mais graves

O que fazer diante dos sintomas?
Procurar atendimento médico imediatamente, generalista ou especializado, da rede pública ou particular

Há grupos com maior risco de agravamento da doença?
Sim Gestantes, crianças pequenas, idosos, obesos e portadores de doenças crônicasPor isso foram escolhidos pelo Ministério da Saúde para a campanha de vacinação

Quem faz parte do grupo de risco e não se vacinou na época da campanha ainda deve receber a dose?
Sim O medicamento ainda tem benefícios na prevenção da doençaQuem se vacinou no ano passado e não recebeu a dose neste ano deve também voltar ao posto de saúde para se revacinar, pois o produto só protege por um anoA vacina é muito importante e eficiente na prevenção da doença.

Para quem desenvolveu a doença, qual é o tratamento?
O tratamento prevê a prescrição do medicamento Oseltamivir – de nome comercial Tamiflu – para as pessoas que apresentarem a síndrome gripal e fazem parte dos grupos vulneráveis às complicações – como gestantes, crianças pequenas, idosos, obesos e portadores de doenças crônicasPara aquelas fora dos grupos vulneráveis, mas que apresentem os sintomas e tenham sinais de agravamento da doença, a recomendação também é de prescrição

Em quanto tempo o antiviral deve ser prescrito depois de apresentados os primeiros sintomas?
Para atingir sua eficácia máxima, o antiviral deve ser iniciado nas primeiras 48 horas após o início da doençaEntretanto, mesmo ultrapassado esse período, o Ministério da Saúde indica a prescrição do medicamento

Onde conseguir o Tamiflu?
O antiviral já é oferecido no Sistema Único de Saúde (SUS), gratuitamente Para retirar o antiviral, no entanto, o paciente deve apresentar receita médica, emitida tanto por profissionais da rede pública, como da rede privada

Como se prevenir contra a doença?
- Higienizar as mãos com água e sabão, com frequência;
- Usar lenço descartável para higiene nasal;
- Cobrir nariz e boca quando espirrar ou tossir;
- Evitar tocar mucosas de olhos, nariz e boca;
- Higienizar as mãos após tossir ou espirrar;
- Evitar tocar superfícies, como mobiliário ou maçanetas, com luvas ou outro EPI (equipamento de proteção individual) contaminados ou com mãos contaminadas;
- Não circular dentro de hospital usando EPIs contaminadosEsses devem ser imediatamente removidos após a saída do quarto, enfermaria ou área de isolamento;
- Restringir a atuação de profissionais de saúde com doença respiratória aguda na assistência ao paciente;
- Manter ambientes domésticos arejados e evitar aglomerações

Fonte: Guenael Freire, médico epidemiologista, consultor da Secretaria de Estado da Saúde