Jornal Estado de Minas

Polícia Militar reage ao medo na Savassi e monta operação especial

Após denúncias, militares reconhecem fragilidade na segurança e deflagram ofensiva para conter onda de arrombamentos. Um dos alvos é casa abandonada que abrigaria criminosos

Entre os focos de queixas está a Rua Fernandes Tourinho, considerada pouco iluminada e onde houve pelo menos 10 ataques nos últimos dois meses, cinco deles depois da inauguração da praça da Savassi remodelada - Foto: Rodrigo Clemente/Esp. EM/D.A Press

Em uma tentativa de dar resposta à onda de arrombamentos na Savassi, Centro-Sul de Belo Horizonte, e às queixas de comerciantes sobre a insegurança noturna na região, divulgadas nessa terça-feira pelo Estado de Minas, a Polícia Militar deflagrou a Operação Nix, em uma referência à deusa grega que personifica a noiteUma casa abandonada – no número 1.022 da Rua Rio Grande do Norte, ao lado de um prédio também vazio, no 1.008 – foi o principal alvoO imóvel foi invadido por cerca de 20 moradores de rua e viciados em crack, que estariam arrombando lojas de madrugada para manter o vício, segundo os militares“A casa é o nosso referencial do problema”, disse o comandante da 4ª Companhia do 1º Batalhão da PM, major Carlos Alves, responsável pela área.

À noite, sete carros com 20 PMs e funcionários do setor de assistência social da Prefeitura de BH cercaram a casa abandonada e invadiram o imóvel pulando a gradeUsando lanternas, eles deram buscas nos dois andares e encontraram muita sujeira e colchões espalhados pelo chão, além de uma faca, roupas e restos de alimentosNinguém foi encontrado nos cômodos depredados, pichados e onde os invasores deixaram inclusive rastros de fogueiraMais cedo, a equipe do Estado de Minas havia flagrado moradores de rua nos fundos do terrenoO tenente-PM André de Oliveira Miguel, que participou da ação, disse que hoje vai procurar os donos dos imóveis e retornar ao localSegundo ele, a lei permite à PM entrar em imóveis abandonados quando são ocupados por suspeitosComo no prédio ao lado, que supostamente estava desocupado, havia iluminação nos corredores, os militares preferiram não entrar no imóvel.

- Foto: Leandro Couri/EM / D.A Press

A operação se estendeu à praça da Savassi e ruas próximas, com objetivo de prender suspeitos e tranquilizar a populaçãoVários PMs percorreram a área e conversaram com donos de bares e restaurantes e frequentadores, distribuindo dicas de segurança
Como denunciou o EM em sua edição de ontem, em apenas dois quarteirões da Rua Fernandes Tourinho, entre as avenidas Getúlio Vargas e Cristóvão Colombo, 10 lojas foram atacadas em menos de dois meses, cinco delas depois da reinauguração da praça, no dia 10A reforma custou R$ 11,8 milhões, mas, segundo as vítimas, não houve investimento na segurança, como policiamento noturno, iluminação e instalação de mais câmeras de vigilância.

Galeria de fotos da operação

O empresário Marcelo Assunção, de 37, está entre as vítimas da onda de arrombamentosSua loja, o Café Clube Restaurante, na Rua Paraíba com Inconfidentes, foi invadida há três semanasAs câmeras de segurança registraram toda a ação do ladrão, que estava sozinhoEle escalou a parede para chegar à varanda do segundo andar e conseguiu passar pela cerca elétrica“Quando entrou, virou as câmeras para o lado e desligou o circuito de tevê”, conta Marcelo.

O ladrão carregava uma mochila nas costas, possivelmente com ferramentas, e conseguiu arrancar a porta do cofre, de onde levou R$ 1,5 mil, um celular e um par de óculos“Registrei o boletim de ocorrência, imprimi a imagem do ladrão gravada pelo circuito e mostrei para a PMCoincidentemente, o policial tinha a foto do suspeito no seu celularFoi o mesmo que arrombou uma empresa de computação aqui da esquina”, disse o empresárioPara proteger o restaurante, Marcelo reforçou a segurança
“Instalei sirene e infravermelho, além de arame farpado na marquise do prédioMesmo assim, ainda não tenho segurançaNão guardo mais dinheiro no restaurante”, disse

João Antônio Pimenta, de 56, é dono de um bar há 27 anos na Rua Tomé de Souza com a Avenida Getúlio Vargas“O movimento no meu bar é que garante a segurança dos lojistas ao lado de madrugadaNa praça da Savassi é tudo muito lindo e iluminado, mas nos quarteirões do entorno não há iluminação e há muitos assaltosJá presenciei um homem armado assaltando uma moça no ponto de ônibus, e vários carros são arrombados todos os dias”, disse João.

Mudança de tática no patrulhamento

Paralelamente à operação policial desa terça, a PM lançou um pacote de segurança especial para a Savassi, que consistirá em reforço no efetivo na região, inclusive à noite, orientação aos comerciantes e a manutenção de patrulha exclusiva para a áreaDe acordo com o major Carlos Alves, comandante da 4ª Companhia do 1º BPM, os crimes contra o patrimônio caíram 40% no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado, mas ele admite que está havendo uma “febre de arrombamentos” na regiãoSegundo o militar, a Operação Nix vinha sendo planejada desde marçoSomente ontem, porém, a polícia decidiu entrar na casa abandonada que serviria de abrigo a criminosos.

No total, foi mobilizado efetivo de 50 policiais e 15 veículos da 4ª Companhia, com apoio do Tático Móvel do 1º BPMPara a ação de ontem, a Savassi foi dividida em quatro setores de atuaçãoO major garantiu que vai manter uma viatura do programa Polícia e Família exclusivamente empenhada na vigilância na área, das 20h às 6hEle também pediu apoio do serviço de inteligência do 1º Batalhão na identificação de suspeitos.

O major sustenta que os arrombamentos que se espalham pela região são cometidos por moradores de rua e menores que vivem na Savassi“Semana passada, conseguimos identificar alguns com um macaco hidráulico usado para abrir lojasAbrem pequenas brechas, por onde devem entrar os menores”, disseTodos os suspeitos presos na região, segundo ele, são reincidentes“Eles ficam escondidos durante o dia, quando dormem, e saem à noite para praticar delitos e sustentar o vício das drogas Muitos se passam por tomadores de conta de carros e ficam observando a fragilidade das lojasAlguns menores já foram conduzidos até 10 vezes pela PM, mas logo estão de volta ao crimeÉ preciso articular um alinhamento com outros órgãos de segurança pública, além da participação efetiva da comunidade no combate a esse tipo de problema”, disse o militar.

A casa abandonada onde ficam os suspeitos, segundo a PM, tem dois andares e ocupa um terreno de mil metros quadradosNos fundos, há um barracão com quatro cômodos, onde os suspeitos se escondemSegundo os vizinhos, a casa está abandonada há seis meses e o prédio residencial ao lado foi desocupado recentemente“A polícia tem vindo com frequência à casa, mas não resolveMenores viciados em crack são apreendidos, mas voltam”, conta o sócio de uma corretora de valores ao lado do endereço, Bernardo GuimarãesSegundo ele, a casa e o prédio residencial, que tem três andares e seis apartamentos, pertencem a um instituto evangélico e estão em negociação com uma construtoraEnquanto isso, há acúmulo de lixo na casa e o mau cheiro incomoda quem passa pela rua

Donald Matoso, de 37, que também trabalha na corretora, conta que uma menina de 12 anos que frequentava a casa abandonada foi estuprada por adolescentes“Há crianças e adultos na casaEles usam drogas, assaltam na rua e aprontam muita confusãoPor volta das 13h, sai aquele bando descendo a Rua Rio Grande do Norte, fumando maconha e cheirando tínerTodo mundo que mora ou trabalha na rua está amedrontado”, disse DonaldPorteiro de um prédio residencial em frente, Jorge Cardoso, de 60, conta que os moradores de rua passam o dia dormindo na casa e começam a sair quando anoitece“Já cheguei a contar 15 pulando a gradeO mais velho deve ter 17 anosÉ um do cabelo vermelho”, disse JorgeSegundo ele, a casa estava perfeita antes de ser invadida“Quebraram tudo lá dentroQuando há briga entre eles, um grupo fica na rua, jogando pedras na casa, e outros jogam pedras lá de dentroJá acertaram o prédio onde trabalho”, relatou o porteiro.