Jornal Estado de Minas

Namoradas de Idi Amin podem ganhar novo companheiro

A Fundação Zoo-Botânica de Belo Horizonte vai tentar conseguir um macho e trazê-lo para BH, mas não descarta a possibilidade de as duas serem devolvidas à Fundação Aspinall

Jefferson da Fonseca Coutinho Flávia Ayer

- Foto: Renato Weil/Estado de Minas - 25/05/2007

A notícia, ruim, correu rápido a cidade em fim de manhãA morte do gorila Idi Amin aos 39 anos, tendo na alcova duas companheiras mais jovens, virou piada pronta para engraçadinhos e embargou a garganta dos mais sériosOuvia-se em muitas esquinas que Idi “não tinha dado conta das companheiras” ou que “havia tomado estimulante sexual falsificado”Graça rasa no lixo, em outros cantos, o assunto era de apertar o coração de muitas gerações.

Veja fotos do gorila

O sujeito de nascimento sem documentação, supostamente em 1973, em meio à floresta tropical africana e levado para o zoológico francês Saint-Jean-Cap-Ferrat, chegou a Belo Horizonte ainda garoto, com 2 anos e não demorou para conquistar o coração da cidadeNão veio sóTeve ao lado a fêmea Dada, de idade aproximadaEm 1978, a jovem companhia de Idi não resistiu a uma infecção generalizada e morreu, dando início à longa história de solidão do único representante da espécie em cativeiro na América do Sul.

Reservado, discreto e robusto, o gorila ensimesmado, cada vez mais querido por todos na Fundação Zoo-Botânica de Belo Horizonte (FZB-BH), passou a vida fazendo a alegria e despertando a curiosidade de crianças e adultos, visitantes de seu recanto próximo à Lagoa da PampulhaEm 1984, o encontro anunciado com Cleópatra, fêmea vinda do zoológico de São PauloDesidratada e com diarreia, a gorila teve quadro clínico agravado e, assim como Dada, não resistiu.

Foram duas semanas apenas, antes do mais longo período de vazio e falta de graça na vida do solitário IdiPara dar conta dos dias, além da paisagem e dos cuidados de seus tratadores, um velho pneu companheiroNão foram raras as aparições de Idi Amin sob o céu, trazendo consigo a borracha fria amiga, surrada e carinhada
Do que mais chamava a atenção em Idi, o olhar profundo do moço, capaz de marcar para sempre.

CLIMA DE AMOR

Marca já bem conhecida pelas duas fêmeas Imbi e Kifta, de 11 anos, vindas da Fundação Aspinall, da Inglaterra, em agosto de 2011 para, finalmente, por fim à solidão de Idi“O amor está no ar”, estampavam as faixas de boas-vindas às duas moçoilas nas ruas do zoológicoA cidade fez festa e sonhou filhotesConforme nota da administração, “a adaptação entre o gorila Idi e as fêmeas foi perfeita desde o primeiro momento.

Agora, com a morte de Idi Amin, não se sabe qual será o destino das fêmeasA FZB vai tentar conseguir um macho e trazê-lo para BH, mas não descarta a possibilidade de as duas serem devolvidas à Fundação Aspinall, pois Imbi e Kifta vieram para a capital mineira como parte de um projeto de reprodução e preservação da espécie.

Exposição no museu da PUC

Do zoológico de Belo Horizonte para o Museu de Ciências Naturais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) Idi Amin terá o corpo taxidermizado e levado para junto das antigas companheiras Dada e Cleópatra, onde será exibido em lugar de destaqueTrata-se de um destino nobre e também alternativa para manter viva a lembrança e a história daquele que por muitos anos ostentou o título de único gorila da América do Sul.

O corpo de Idi Amin ainda passa por necrópsia, no hospital veterinário do zoo, e o laudo da morte deverá ficar pronto em 30 diasDe acordo com o diretor do zoológico, Carlyle Mendes Coelho, há duas semanas houve o agravamento de uma insuficiência renal e de uma inflamação da articulação do tornozelo direito de Idi (osteoartrite), doenças crônicas do animal“Esse quadro, aliado à idade avançada, forilterando o metabolismo e o levou a uma anemia severa e desidratação”, dizA equipe optou por submeter o animal a uma anestesia, para hidratá-lo e recolher material para exames.

Ele teve uma parada cardiorrespiratória, foi reanimado, mas depois teve outra e morreu
Por três horas, o corpo do gorila permaneceu no recinto, para que Imbi e Kifta, suas companheiras desde agosto de 2011, reconhecessem a morte do macho

Análise da notícia
Arnaldo Viana


Idi Amin era cidadão honorário de Belo Horizonte, homenagem que ele poderia recusar, com todo o direito, recusar, porque às vezes me parecia indiferente à raça humana e nunca viu uma rua sequer desta cidadeSeu olhar, às vezes, demonstrava empáfiaMas não era, não exatamentePodia ser banzoQuem veio da África, contra a vontade ou não, e até nós, com raízes no solo africano, nos sentimos, de vez em quando, absortos, com a mente longínqua e expressão nostálgicaÀs vezes, Idi Amin se comportava como nobrezaPor que não? Com 39 anos, seria rei numa floresta tropical do centro da ÁfricaE nós aqui, cobrando, de um possível rei, palhaçadas sobre um velho e ensebado pneu, num pequeno e cercado espaçoE ainda demos a ele o nome de um sanguinário ditador, que nada tinha de nobreIdi Amin usava os olhos para nos perguntar: "Acha que sou feliz aqui?” Se solto fosse, poderia escalar o Edifício Acaiaca, como fez King Kong no Empire State, não com uma loura a tiracolo, mas para gritar bem alto: "Não tenho nada a ver com o mundo de vocês"Idi Amin está, enfim, livre do fosso, da curiosidade geral e da nossa ilusão de que deixaria um herdeiro para viver eternamente na clausuraEle vai agora para outro lugar, talvez para aquele acima das montanhasLá, como dizem feiticeiros africanos, onde se pode viver na invisibilidade, imune a todos os males


Galeria de fotos da paquera no zoo de BH



Veja um vídeo de Idi Amin:
- Foto: Renato Weil/Estado de Minas - 25/05/2007