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Estado de Minas

Infrações de carreteiros no trânsito ficam impunes

Mesmo com operações especiais nas rodovias mineiras, policiais só conseguem identificar em 1,3% dos carreteiros envolvidos em acidentes o uso de tóxicos, estimulantes e álcool


postado em 03/02/2012 07:07 / atualizado em 03/02/2012 10:12

Diante de denúncias de uso normal de rebites, agentes rodoviários prometem ampliar fiscalização contra o tráfico de drogas e a exploração sexual nas estradas(foto: Beto Novaes/EM DA Press)
Diante de denúncias de uso normal de rebites, agentes rodoviários prometem ampliar fiscalização contra o tráfico de drogas e a exploração sexual nas estradas (foto: Beto Novaes/EM DA Press)
Apesar da repressão rotineira e as operações especiais, as forças policiais que patrulham as rodovias federais e estaduais mineiras admitem ainda ser grande o número de caminhoneiros trafegando sob efeito de estimulantes ilegais, por vezes traficados por travestis, prostitutas e menores sexualmente explorados. Para ter uma ideia da dificuldade em identificar quem está sob efeito dos tóxicos, dos 5.665 acidentes envolvendo veículos de carga nas estradas estaduais em 2011, em apenas 74 condutores (1,3%) foi identificado uso de álcool e entorpecentes – rebites, cocaína, crack, maconha e outros. Foram conduzidos à delegacia pelo uso de tais substâncias apenas 77 motoristas de caminhões e carretas.
Os números são da Polícia Militar de Minas Gerais.

A corporação e a Polícia Rodoviária Federal (PRF) informaram que vão intensificar operações e fiscalizações nos pontos de prostituição, tráfico e também as atitudes irresponsáveis de alguns condutores que têm sido denunciadas pelo Estado de Minas desde domingo. “Vamos fazer mais operações e fiscalizar depois que nosso departamento de inteligência avaliar os locais mais vulneráveis. Nada disso ficará impune”, afirma o chefe da Seção de Técnica de Trânsito da Diretoria de Meio Ambiente e Trânsito (DMAT) da PM, capitão José Procópio Corrêa Júnior.

Segundo a PRF, só no ano passado foram duas operações contra o tráfico de entorpecentes e várias ações contra a prostituição infantil. “O alerta da prostituição inserindo estimulantes no meio dos caminhoneiros muda a figura da atividade”, afirma a inspetora Fabrizia Nicolai. “Prostituição não é crime, mas o tráfico dessas substâncias é, além de ser um dos piores fatores para acidentes, já que os caminhoneiros usam os rebites para dirigir sem dormir”, alerta.

APREENSÕES

Uma das operações dos federais foi a chamada Morfeu, o deus grego do sono, numa alusão aos rebites que mantêm caminhoneiros acordados por até um dia inteiro de viagem. A ação foi feita em 13 estados, de 19 e 21 de dezembro, e resultou na prisão de oito pessoas que distribuíam anfetaminas de forma ilegal. Foram apreendidos com a quadrilha 41.366 comprimidos desses estimulantes, R$ 30.485, sete armas de fogo, dois veículos e uma motocicleta. Em Minas foram cumpridos três mandados de busca e apreensão em estabelecimentos às margens da BR-116, perto da divisa com o estado da Bahia. Uma pessoa foi presa e mais de 2,5 mil comprimidos de medicamentos diversos (Desobesi-M, Pramil, anfetaminas), apreendidos. As ocorrências foram encaminhadas para a delegacia de Policia Civil de Pedra Azul, no Vale do Jequitinhonha. Os estados alvo foram Minas, Goiás, Mato Grosso, Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina, Bahia, Ceará, Piauí, Maranhão, Roraima e Espírito Santo, além do Distrito Federal.

De acordo com levantamento da PRF, da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da organização não governamental Childhood, as estradas federais de Minas são as com mais pontos de vulnerabilidade para a prostituição infantil no país. O levantamento, feito em 2010 por meio de entrevistas com caminhoneiros, localizou 133 locais no estado. Destes, 66 são de concentração crítica, 43 alta, 22 média e apenas dois de exposição pequena. Em todo o país são 1.820 pontos de vulnerabilidade.

PROSTITUIÇÃO

Enquanto as forças de repressão acabam perdidas na vastidão das estradas mineiras e os representantes dos interesses da sociedade pouco fazem para impedir as situações ilegais nas estradas ou exigir uma melhor fiscalização, iniciativas populares começam a ocorrer. Ontem, a Cooperativa Agropecuária de Resplendor (Capel) informou que reconheceu um de seus caminhões sendo usado para trazer cocaína para um travesti flagrado pelo jornal Estado de Minas em encruzilhada da BR-381, em Governador Valadares, no Vale do Rio Doce. Segundo o órgão, o caminhoneiro será punido exemplarmente assim que for identificado, já que há muitos veículos de carga de mesma marca e modelo na frota. Acrescenta que é uma situação inadmissível e que tem todo interesse em contribuir para a obstrução deste e qualquer outro tipo de prática criminosa, tal como neste caso, e que tanto mal trás para a sociedade.

A ONG Menina Dança informou que está começando a atuar no Vale do Jequitinhonha, onde o EM encontrou adolescentes sendo aliciadas ao tráfico e à prostituição. A organização entrou em contato com conselhos tutelares e pretende identificar as meninas e oferecer a elas atividades, como reforço escolar, música e dança, para tirá-las da marginalidade.

MP só cobra se houver omissão

Procurado desde o dia 27 para falar sobre a questão dos caminhoneiros nas rodovias de Minas, o Ministério Público Federal (MPF) chegou a informar apenas que o assunto “futuramente pode ser o caso de atuação do MPF, mas para cobrar eventual omissão por parte das autoridades responsáveis”. Mesmo após as situações de ineficiência das forças federais em cuidar de situações graves e perigosas das estradas, o órgão explicou ontem que o fato de as irregularidades acontecerem em rodovias federais não atrai a competência da Justiça Federal. “Por exemplo, se alguém praticasse um homicídio numa rodovia federal, o crime continuaria sendo julgado pela Justiça estadual. Venda de bebida e drogas em bares ou nas estradas – à exceção do tráfico internacional de drogas – é de competência da Justiça estadual, ou seja, são atribuições do Ministério Público Estadual”, acrescenta uma fonte do MPF.

Também procurado, o Ministério Público Estadual (MPE) não informou se tem alguma atuação para cobrar das autoridades e governos políticas para evitar os graves desastres ocorridos nas estradas que cortam Minas Gerais, muitas delas provocadas pela situação precárias de caminhões e carretas que furam bloqueios e rodam sem se preocupar com a fiscalização. Nenhuma ação foi especificada contra a prostituição infantil nàs margens das estradas e a venda ilegal de bebidas e drogas que ocorre livremente em postos e pontos de apoio.

O órgão, que existe para representar o interesse da sociedade, deixou claro que esses problemas são de responsabilidade unicamente policial, ao declarar, por meio de sua assessoria de imprensa, que “cabe à Polícia Rodoviária Federal, nas rodovias federais, ou à Polícia Militar, nas rodovias estaduais, fiscalizar os motoristas, registrar boletins de ocorrência e dar voz de prisão quando constatar que o condutor do veículo consumiu droga ilícita ou bebida alcoólica acima do nível permitido em lei”.

Interdições nas estradas

Carretas que tombam nas rodovias e caminhões que enguiçam no meio da estrada causaram 34 dias de interrupções em rodovias federais de Minas Gerais, no ano passado, segundo os alertas da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no Twitter. As medições foram feitas em 278 dias, entre 23 de março e 31 de dezembro do ano passado – e numa proporção de 365 dias significaria 45 dias de bloqueios. A situação foi mostrada na edição de ontem da série de reportagens “Homens-Bomba ao Volante”, que o Estado de Minas mostra desde o último domingo, sobre as condições de carretas e caminhoneiros. Números que se assomam às mortes e pessoas feridas nos desastres que ocorrem em rodovias cada vez mais povoadas por veículos de transportes pesados e longos.

Colapso nas BRs agrava situação
Bruno Batista
Diretor-executivo da Confederação Nacional do Transporte (CNT)

As condições dos caminhoneiros é agravada pela penúria das estradas. É crítico num estado como Minas Gerais, que é dono da maior malha rodoviária do país, termos 58% das estradas com algum tipo de problema (dados da Pesquisa da CNT de 2010). O reflexo se dá primeiro na redução do nível de segurança e na queda de qualidade operacional dos veículos. Não conseguimos acompanhar nenhuma avaliação positiva ao longo dos anos. São rodovias antigas, boa parte na década de 1970, 88% em rodovias de pista simples e mão dupla, mas que recebe tráfego pesado do país inteiro. Se a malha não crescer ela estará comprometida. A tendência do crescimento econômico é continuar, mas isso pode acabar sendo afetado negativamente pela falta de condições de escoamento, já que 60% do nosso transporte de carga é rodoviário. Para mudar isso é preciso investir mais nas ferrovias e hidrovias, mas isso tem de ser bem calibrado. Não podemos também cortar as verbas das estradas ou elas entrarão em colapso, já que estão saturadas.

Em 2011 entraram em circulação mais de 10 milhões de veículos, mas só 657 quilômetros de rodovias federais foram construídos. Para sanar todos os problemas encontrados seria necessário investir R$ 5,1 bilhões na recuperação do pavimento e R$ 547,1 milhões na conservação das rodovias mineiras, usando parâmetros do Dnit. O uso que se faz das rodovias para o transporte pesado não é competitivo. Cargas de grãos por meio rodoviário para serem levadas a longas distâncias significam prejuízo, mas não há alternativa. Minas Gerais tem um papel crucial no transporte de cargas. Geograficamente, as principais vias nacionais se ramificam e se ligam com o estado. Se Minas vai mal a integração do país não vai muito bem, pois é um estado de passagem para São Paulo, Santos, Centro-Oeste, Nordeste. Não temos pesquisas sobre isso no país, mas pode-se inferir que grande parte do tráfego que circula em Minas Gerais vem de fora. Daí a importância de mais investimentos da União, recuperação de estradas e duplicações.


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