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Estado de Minas

Conselheiro Lafaiete sofre com lixão

Enquanto aguardam construção de aterro sanitário para receber resíduos de três municípios, sitiantes da cidade cobram a recuperação e a arborização de área contaminada


postado em 19/01/2012 06:00 / atualizado em 19/01/2012 06:56

Catador enfrenta urubus para garantir sobrevivência com coleta de material reciclável no depósito a céu aberto(foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
Catador enfrenta urubus para garantir sobrevivência com coleta de material reciclável no depósito a céu aberto (foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
 

 

Dezenas de urubus, na estrada, parecem sentinelas e, ao mesmo tempo, figuras sinistras que apontam o caminho. Do mourão da cerca de arame farpado, uma ave voa certeira até o lixão e bica um pedaço de carne decomposta. Nesse espaço de 13 mil metros quadrados, a dois quilômetros do Centro de Conselheiro Lafaiete, na Região Central do estado, há lugar ainda para milhões de mosquitos, que grudam na pele, colam em caixas de papelão, sacos plásticos, garrafas e outros recipientes.

Nojo é pouco para traduzir a realidade desses espaços a céu aberto, presentes em quase todo o país e ainda em 312 municípios de Minas, que incomodam a comunidade, sufocam nascentes e produzem o tóxico chorume. Enquanto não se termina a construção do aterro sanitário, fruto de consórcio entre o município, Ouro Branco e Congonhas,  moradores de Conselheiro Lafaiete vislumbram o futuro do local, querendo vê-lo transformado em área ambiental.

Proprietário há 20 anos de um sítio perto do lixão, o aposentado Antônio Janoni defende um projeto de plantio de árvores e recuperação do terreno da prefeitura. “Aqui jamais poderá ter qualquer tipo de construção. As ações devem ser de reflorestamento”, explica Janoni, que chegou à região cinco anos antes do lixão. “Há muitas irregularidades aqui. Águas que brotam desaparecem, soterradas pelos resíduos, e o chorume vai direto para o Rio Bananeira, da Bacia do Rio Paraopeba, que deságua no São Francisco”, diz.

Adolescentes

O sitiante Valmir Almeida Zebral, também morador do Bairro Lima Dias 2, endossa as a opinião do vizinho e diz que o lixão desvaloriza os imóveis, causa problemas à saúde das crianças e cria muito movimento na estrada. Segundo a prefeitura, são 15 caminhões de lixo por dia na via pública. Sobre a situação anterior da área, ambos dizem que melhorou, mas apontam animais mortos e, principalmente, a presença de catadores, alguns muito jovens, que se misturam aos detritos. Mesmo com a orientação do Ministério Público para que adolescentes se mantenham afastados, as estudantes Josiane Gracieti Domingos, de 16, e Ivani Santos Cruz, de 18, se misturam às montanhas de lixo para retirar o sustento.

Josiane e Ivani vão à escola, usam esmalte, procuram se vestir na moda e, no caso da primeira, tem até piercing no dente. Mas, no dia a dia, elas reviram caixas, sacolas plásticas e tudo o que encontram. “Sempre tem material reciclável, muita caixa de papelão, então conseguimos um bom dinheiro com a venda”, diz Ivani, com um fardo cheio. No mês passado, a atividade, no horário das 14h às 18h, rendeu R$ 1,2 mil para cada uma. Uns 100 metros adiante, um catador faz um gesto brusco, mas as meninas são se importam. “A gente procura serviço e não encontra, então o jeito é vir para o lixão, mas nunca deixo de ir à escola”, conta uma das garotas .  

Com as moscas sobrevoando as cabeças e os cheiro forte, elas garantem não ter aversão ao ambiente. “Já me acostumei”, diz Josiane, mostrando o sorriso com os pontinhos prateados. “A situação desse pessoal é muito triste, eles até fazem comida aqui. Com o aterro, poderão conseguir um emprego”, comenta Valmir, olhando a cena, que ainda se compõe, ao longe, de tratores enterrando as toneladas de resíduos.

Aterro em demanda judicial

A expectativa é de que o aterro sanitário, que receberá resíduos de Conselheiro Lafaiete, Ouro Branco e Congonhas e está em construção perto de Rancho Novo e Alto da Varginha, fique pronto em 60 dias, informa o diretor de Meio Ambiente da Prefeitura de Conselheiro Lafaiete, Sirlei Campos Neto. Mas a conclusão da obra não garantirá o funcionamento dele, pois precisa da licença de operação. O empreendimento já foi parar na Justiça e esteve suspenso. Nova sentença garantiu a continuidade do projeto.

A suspensão da obra foi concedida pela 7ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que levou em consideração denúncias de que o empreendimento provocaria impactos no lençol freático da região, além de suprimir área de mata atlântica. A organização não governamental Reciclar, autora da ação, alegou que o empreendimento não conta com estudos de impacto ambiental suficientes. Sirlei diz que o lixão recebe 100 toneladas por dia e que todos os resíduos são aterrados e compactados por tratores.  “O objetivo é arborizar o terreno a partir da desativação do local. O projeto prevê tratamento da área e reflorestamento”, explica. Sobre a nascente no terreno, explica que, embora contaminada, “ela está viva”.

O diretor diz que as pessoas que insistem em viver do lixo são orientadas por técnicos da prefeitura a procurar a Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis de Conselheiro Lafaiete. “A coleta seletiva no município ainda é muito pequena, 10% da massa coletada é reciclada, mas estamos trabalhando para elevar este patamar”, afirma.


ENQUANTO ISSO... DESTINAÇÃO DESAFIA ESTADO

Em Minas, a destinação dos resíduos sólidos é tarefa que desafia as autoridades. Mesmo tendo avançado na política de tratamento desse tipo de matéria – iniciada em 2001, quando havia 823 lixões –, o estado está distante de cumprir a meta de erradicar as montanhas de lixo a céu aberto presentes ainda em 312 municípios, conforme a Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam). O estado dispõe ainda de 291 aterros controlados, 68 municípios atendidos com aterros sanitários e 127 usinas de triagem e compostagem, favorecendo cerca de 8 milhões de mineiros. A população urbana com acesso a sistemas de disposição final de resíduos sólidos passou de 19,8% em 2003 para 55,57% em 2011. As dificuldades para cumprir os prazos esbarram em fatores como dificuldade de firmar consórcios entre municípios para tratamento do lixo e até mesmo em regiões onde o modelo conjunto foi adotado a implantação enfrenta resistência e levanta polêmica em organizações ambientais.
 


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