Jornal Estado de Minas

Buracos nas ruas de Belo Horizonte atrapalham a vida de pedestres

Calçadas esburacadas, com canaletas de drenagem abertas ou galerias mal tampadas fazem de simples caminhada pelo Centro uma aventura que pode acabar no hospital. Em 11 meses, a prefeitura recebeu 2,6 mil queixas, mas número de fiscais é pequeno e multas, brandas

Valéria Mendes
Altair Ferreira se revolta com situação que considera absurda e arriscada, em passeio da avenida Getúlio vargas - Foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press
Andar a pé por certas calçadas de Belo Horizonte tornou-se uma espécie de aventura em campo minadoQuem usa o passeio, que deveria ser um caminho seguro para pedestres, está sujeito a despencar em uma armadilha com prejuízos que vão desde um simples susto a torções e fraturas que custam dias de afastamento do trabalho e das atividades diáriasA dimensão do problema, que está longe de se restringir a bairros de periferia, pode ser medida pelo número de vezes que o telefone da central telefônica BH Resolve, da prefeitura, tocou este ano acionado por cidadãos revoltados com as condições das vias em que caminhamApenas até novembro, foram 2.636 queixas, pedidos de reconstrução ou construção, média diária de quase oitoO número já é maior que o registrado em todo o ano de 2009, quando foram 2.537 chamados, e também em 2010, com 2.616Um desafio para apenas 120 fiscais e uma legislação com multas brandas para quem deixa obstáculos no caminho do cidadão.

O tema é tão importante que a maior capital do país, São Paulo, formou um grupo de trabalho específico para tratá-lo, estabeleceu punição pesada para infrações e só no primeiro semestre disparou 2,4 mil multas contra donos de imóveisMas em Belo Horizonte basta dar uma volta pela cidade para perceber o descaso com as calçadas: buracos, caixas de telefonia abertas, grades de canaletas d’água retiradas e tábuas que escondem estragos da construção civil podem ser encontrados em alguns dos pontos mais movimentados e nobres da cidadeAo proprietário do imóvel cabe a responsabilidade de construir e manter o passeio em bom estado de conservaçãoPorém, muita gente tem fechado os olhos para essa regraFoi o que comprovou da pior maneira possível a manicure Tânia Demaria Passos, de 50 anos, que caiu em um buraco coberto por uma camada de cimento fresco, sem isolamento, em plena Rua Espírito Santo, no Centro de BHO acidente aconteceu na terça-feira, quando Tânia se encaminhava para uma consulta ao ortopedista, já que se recuperava de uma cirurgia no joelho.

No dia em que a manicure anunciava a intenção de processar a prefeitura e a firma responsável pela armadilha, que ainda não foi nem identificada pelo município, a reportagem do Estado de Minas foi às ruas da capital conferir a condição dos passeios
E os flagrantes de descuido e de perigo foram muitosCenas como as que são testemunhadas diariamente pela dona de banca de revistas Maria Lúcia Alves Batista, de 56 anos, na Rua Goiás, esquina de Avenida Álvares CabralTrabalhando a um quarteirão da sede da Prefeitura de Belo Horizonte, a comerciante precisa todos os dias ajudar pessoas a se levantar, após tombos provocados pela falta de uma grade em uma canaleta de água no passeio“Todo dia alguém cai ou tropeça aquiÉ tanta gente que às vezes estou ocupada e nem dá para vir ajudarUm dia, a vítima foi um desembargador (do Tribunal de Justiça, também na Rua Goiás)Tem idoso, criança, gente adulta que passa correndoE isso está assim há cerca de seis anos”, denuncia.

A diarista Maria José Magalhães, de 61, constata o que está à vista de todos os que usam as calçadas do Centro: falta fiscalização“A prefeitura precisa tomar conta dissoTem que fiscalizar, porque passeio malconservado é um sinal de desrespeito com as pessoas”, cobra, enquanto tenta desviar de um buraco na Avenida Francisco Sales, altura do número 1.663, no Bairro Santa Efigênia.

Mudam as áreas da cidade, mas o descaso se repete
Em 15 minutos na mesma Rua Espírito Santo em que a manicure Tânia se acidentou, mas na esquina com a Avenida Amazonas, pelo menos três pessoas se desequilibraram ao passar pela calçada malconservadaO que à primeira vista nem parece um grande buraco torna-se um enorme percalço para pedestres“Esse é um lugar por onde muita gente passa e nem assim resolvem o problemaTodos os dias, mais de 10 pessoas tropeçam aquiSó hoje foram seisAlgumas apenas se desequilibram, mas outras só param no chão”, conta o pipoqueiro Cláudio Pereira, que mantém o carrinho bem em frente à armadilha no passeio.

Entre as pessoas surpreendidas pelo buraco está a operadora de caixa Rosalice Saraiva de Almeida Silva, de 30 anos“Passei olhando para os lados, porque aqui é muito movimentadoNem percebi o buracoQuando vi, já estava caindo em cima de uma mulherAinda bem que ela me amparou, porque eu poderia ter me machucado”, disseMinutos depois foi a vez de a operadora de telemarketing Taciane Adão, de 23, quase ir parar no chão“Passeio é coisa sériaTem que estar em bom estado, porque a gente pode se ferir com tanto buracoFoi por um triz que não caí.” Delaine Lourenço, de 22, que trabalha como atendente de telemarketing em um prédio próximo, reclama: “Os passeios em Belo Horizonte são de péssima qualidadeOs problemas estão por toda parteNo Centro a gente percebe mais, mas nos bairros é a mesma coisa”.

CAIXA ABERTA Armadilha perigosa também deixou quem passava pela Avenida Getúlio Vargas, na Savassi, indignadoNo cruzamento com Rua Santa Rita Durão, uma caixa aberta de uma operadora de telefonia expunha pedestres ao risco de desabar em um buraco de aproximadamente um metro e meioRelatos de quem passou pelo local dão conta de que a situação ocorria desde a segunda-feiraProvidência? Apenas a sinalização precária com pedaços de isopor, feita por funcionários de uma loja em frente “O pessoal do estoque colocou o isopor, com o objetivo de sinalizar para quem passa, pois o movimento de pessoas aqui é grande e tem quem ande distraído, falando ao celular ou correndo”, contou o vendedor Leandro de Souza, de 27 anosO porteiro Altair Mateus Ferreira, de 54, se impressiona com o perigo“Essa situação é absurdaUm desrespeito com o cidadãoQuem cair aqui pode bater a cabeça e ter um traumatismo sério”, constatou