Jornal Estado de Minas

Nova lei pode pegar quatro vezes mais motoristas ao volante em BH

Caso as mudanças que endurecem a lei seca já estivessem em vigor em BH, o número de motoristas que bebem e são processados criminalmente saltaria de 183 para 726

Valquiria Lopes

Sinal cada vez mais vermelho para motoristas que bebem

As mudanças definidas pelo projeto aprovado no Senado e em tramitação na Câmara dos Deputados, tornando mais rigorosa a Lei Seca, complicariam a situação de quem ingere qualquer quantidade de álcool e dirige em BHSe o projeto já valesse desde julho, o número de motoristas processados criminalmente passaria de 183 para 726, um aumento de 296% ou quase quatro vezes maisA constatação pode ser feita levando em consideração os dados de condutores flagrados nas blitzes da Lei Seca desde o início da campanha Sou pela vida, dirijo sem bebida, em julhoConforme os números, 543 pessoas cometeram infrações de trânsito por apresentar níveis de álcool de até 0,33 mg/l de ar expelido no bafômetro (nível considerado tolerável apenas para punição administrativa)Se a nova proposta já valesse, elas poderiam engordar a lista dos 183 condutores pegos com níveis acima de 0,34 mg/l de ar e que estão sendo punidos criminalmenteO resultado: 726 pessoas seriam acusadas por crime de trânsito.

Em Minas, a lei é mais branda do que em outros estados, que toleram o limite de 0,29 mg de álcool por litro de ar expelidoA diferença de 0,04 mg/l, que corresponde à margem de erro do bafômetro atestada pelo Inmetro, foi adotada no estado “para evitar que o cidadão fosse punido injustamente”, segundo a Secretaria de Defesa Social.

E, para quem teve participação efetiva na elaboração do Código de Trânsito Brasileiro, a medida é tratada como “mais do que oportuna”, como explica o advogado Carlos Cateb, ex-secretário geral da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Minas Gerais“O projeto é bom, importante e já vem tarde, pois endurece a legislaçãoDiante da dimensão de acidentes no país, o que não é diferente em Minas, estimo que o Congresso Nacional tenha a responsabilidade de aprová-lo com urgência”, afirma

Dados do Mapa da Violência 2011, elaborado pelo Ministério da Justiça, mostram que a taxa de morte entre jovens por consequência de acidentes de trânsito passou de 20,9 em cada grupo de 100 mil jovens em 2008 para 25 por 100 mil em 2010
Em BH, os números confirmam que a violência no trânsito também cresceuDos 15,7 mil acidentes em 2008, a capital registrou no ano passado 16,8 mil ocorrências, um aumento de 7%O número de vítimas também cresceu e passou de 20,7 mil pessoas há três anos para 21,1 em 2010

A punição mais rigorosa, conforme o autor do Projeto de Lei nº 48, senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), foi o motivo para propor o texto em fevereiro“A Lei Seca foi muito bem recebida e respeitada no início, em 2008, mas, quando a Justiça alegou que ninguém poderia produzir prova contra si mesmo, ela não foi cumprida em sua totalidadeEstamos tentando agora resgatar a essência da Lei Seca, que é punir quem dirigir embriagado e, de forma irresponsável, provoca acidentes e mortes no trânsito.”

Conforme o senador, o pedido de recrudescer a legislação que pune a embriaguez ao volante partiu também dos Detrans no paísSegundo ele, em reunião realizada neste ano, os órgãos elaboraram um documento em que se posicionavam quanto à necessidade de tornar a lei mais rigorosa

Além de aprovar, sem ressalvas, o texto do projeto, Carlos Cateb faz sugestões que dariam novo destino a crimes de trânsito que chocaram a população“Uma emenda deveria ser apresentada ao projeto prevendo a extinção do pagamento de fiança e a prisão em flagrante para condutores que provocarem acidentes com mortesA prisão deveria ser mantida, inclusive, até que o processo fosse concluído
Para os casos em que o motorista não quiser soprar o bafômetro, também acredito que o crime deveria ser tratado com agravante de pena”, afirma



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Tramitação

Apresentado no Senado em fevereiro, o projeto  foi aprovado pela Comissão de Constituição,  Justiça e Cidadania da Casa em caráter terminativoCom isso, não precisará mais passar por outras comissões na CasaA partir de agora, o texto será apreciado nas comissões da Câmara dos Deputados e depois será votado em plenárioSe não for alterado, vai para sanção da presidente Dilma Rousseff – se for alterado volta ao Senado e segue para sanção presidencialProcurada, a Secretaria de Defesa Social não se posicionou sobre as possíveis mudanças no Código de Trânsito Brasileiro, já que o projeto de lei ainda está em tramitação

 

LEI SECA EM BH

Fiscalização de 14 de julho a 6 de novembro

- 183 motoristas flagrados em blitzes respondem por crimes de trânsito por dirigir com nível de álcool no sangue acima de 0,34 mg/l)

- 543 condutores parados nas blitzes respondem administrativamente por estar ao volante com índice de álcool no sangue entre 0,14 e 0,33 mg/l ou por se recusarem a soprar o bafômetro após 5 de agosto, quando a conduta passou a ser passível de punição

- 7.159 motoristas foram abordados em blitzes entre 14 de julho e 30 de outubroDestes, 1.106 (15,44%) se recusaram a fazer o teste do bafômetro

Perfil dos motoristas embriagados

- 92% homens e 8% mulheres

- 24% entre 18 e 25 anos

- 39% entre 26 e 35 anos

- 22% entre 36 e 45 anos

- 13% entre 46 e 60 anos

- 2% acima de 60 anos

FONTE: Secretaria de Estado de Defesa Social



O que o projeto prevê?


Qualquer quantidade de álcool no sangue do motorista já configura crime.

Além do bafômetro, provas testemunhais, imagens de
circuitos internos, depoimentos e vídeos que comprovem a embriaguez podem ser usados para incriminar
o motorista que dirige bêbado
A regra já está no artigo 277 do Código de Trânsito Brasileiro,
mas não vem sendo cumprida porque há entendimento de alguns magistrados de que a prova técnica
é necessária.

Altera as penas para quem dirigir embriagado e causar acidentes com lesão corporal grave ou morteA punição máxima passaria de 12 anos para 16 anos.

O projeto também caracteriza esse crime como dolo eventual, ou seja, a pessoa não tem intenção de matar, mas assume o risco pela sua conduta

O que mudaria caso o projeto seja aprovado?

A dinâmica do processo judicial será modificadaQuando um processo  com embriaguez envolvendo morte ou lesão já tem tipificação de crime como dolo eventual, que é mais rigorosa, o réu é julgado no tribunal do júri, que tem a participação da sociedade e não só do juiz

Ao aumentar a pena, o tempo para prescrição também aumenta, o que evitaria que crimes de trânsito prescrevessemAtualmente, o percentual de prescrição para crimes de trânsito que envolvem morte é de 85%.

O projeto fala em mudança de penas para condutoresEm que caso elas mudam?

Somente nos casos em que houver acidente com morte ou lesão

A prova testemunhal vale para quais casos?

Para todos os casos em que o motorista for flagrado dirigindo embriagado, havendo acidente ou não.

Qual é a punição hoje para quem é flagrado dirigindo embriagado?

Detenção, de seis meses a três anos, multa de R$ 957 e suspensão ou proibição para obter permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor

Como seria a punição caso o projeto seja aprovado?

A punição seria a mesmaSeria alterada somente para casos de morte

Qual é a pena hoje para quem dirige embriagado e mata no trânsito?

Detenção de dois a quatro anos, multa de R$ 957 e suspensão ou proibição para a permissão ou a habilitação para dirigirSe houver agravante, pode chegar a seisSe houver entendimento do juiz de que houve dolo eventual, pode chegar a 12 anos.

O que muda em caso de acidente de trânsito em que a conduta do motorista resultar em lesão ou morte?

Lesão leve (ferimentos leves)

A pena passa de detenção de seis meses a dois anos para um a quatro anos Multa e suspensão ou proibição para permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor permanecem.

Lesão grave (fraturas de membros, por exemplo)

Antes não tipificada, a pena estabelece reclusão de três a oito anos, multa e suspensão ou proibição para permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor.

Lesão gravíssima (vítima pode ficar incapacitada, perda de membros, ter trauma na coluna)

Antes não tipificada, pena estabelece reclusão de seis a 12 anos, multa e suspensão ou proibição para obter a permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor.

 Se da conduta resultar em morte

A pena será de reclusão de oito a 16 anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.


Ponto crítico


DIRIGIR SOB EFEITO DE QUALQUER QUANTIDADE DE ÁLCOOL DEVE SER CRIME ?

JOÃO LUIZ DA SILVA
CONSULTOR DE TRÂNSITO E TRANSPORTE


SIM

Precisamos tirar qualquer nível de subjetividade da legislaçãoBebeu, não dirige! Não ficar nessa de que bebeu pouco ou muito, de que tem ou não condições de dirigirHá interpretação equivocada da lei atual no tocante a um limite que foi estabelecido para evitar erro, no caso de alguém que tomou remédio ou comeu bombom de licorA bebida é uma droga tolerada pela nossa sociedadeÉ necessário o rigor da legislação e ações mais abrangentes que acabem com a impunidadeE não se deve limitar aos esforços que a Secretaria de Defesa Social fazA sociedade deve se mobilizar para uma mudança de comportamento, no sentido de que não se consuma bebida alcóolica antes de dirigirE a recusa do bafômetro não pode ser encarada como não produção de prova contra o motorista

JOSÉ APARECIDO RIBEIRO
CONSULTOR DE TRÂNSITO URBANO

NÁO


Pôr no mesmo patamar quem toma um cálice de vinho e os que bebem uma garrafa de cachaça é uma falhaO texto da proposta de lei fere o princípio da razoabilidadeO efeito no álcool é diferente em cada pessoaAlgumas podem tomar 10 garrafas de cerveja e dirigir bemOutras bebem um cálice de vinho e não podem pegar o volanteO importante é identificar quem tem condições de ir para casa, dar condições para que se possa beber um vinho ou uma cerveja e não virar um marginalA nova legislação deveria prever não apenas a fiscalização por bafômetro, mas incluir a possibilidade de realização de testes simples de serem feitos e que conseguem identificar se o motorista está ou não bêbadoAndar sobre uma linha, por exemplo, demonstra se há ou não embriaguezNos Estados Unidos e Europa.


 

 


Eles Não Respeitam