Jornal Estado de Minas

Hotéis, restaurantes e locais turísticos de BH estão despreparados para receber visitantes

Junia Oliveira
Parece até piada, mas é caso real, ocorrido em plena Avenida Raja Gabaglia, no Bairro Cidade Jardim, Região Centro-Sul de Belo Horizonte
Um argentino pediu informação a um taxistaQueria apenas saber como chegar ao Mineirão, já que a sinalização não o ajudavaAtencioso, o motorista disparou numa velocidade incrível: “Vai toda vida, toda vidaNo fim, você vira la direita, depois la esquerda e verá uma plaquita escrita PampulhaÉ só seguir”A intenção foi muita boa, mas o idioma deixou a desejarAté porque plaquita, em espanhol, significa uma chapa de raios X ou aparelho dentário para bruxismoDessa vez, o portunhol falhouSituações como essa fazem parte do cotidiano de estrangeiros em BH, cidade que pretende receber importantes jogos da Copa do MundoSeja na dificuldade para se comunicar ou na falta de sinalização, quem fala idioma diferente do português está sujeito a situações bizarras
No ramo dos serviços, histórias mostram que é o nível de preparação está longe do idealNão conseguir reservar um hotel, passar aperto em restaurantes e até ser preso são alguns riscos para estrangeiros na capital.

Indiana Manju Sharma tinha de recorrer ao marido, Avishek Nigam, que estava longe, para se comunicar com a recepção do hotel - Foto: Marcos Vieira/EM.D.A/PressNos restaurantes, os olhos dos garçons arregalam quando o cliente é estrangeiroEles sofrem por antecipação, prevendo a dificuldade no atendimentoGeralmente, estão tão armados que quando o freguês estrangeiro abre a boca em bom português nada é compreendidoAo cliente resta esperar que o garçom se acalme e recupere forças para repetir o pedidoFinal feliz se o estrangeiro falar um mínimo de português, mesmo com sotaqueMas no outro cenário, em que o idioma do freguês não dá samba, instaura-se um pesadelo para ambos os lados.

Tudo poderia ser facilitado se o restaurante fosse o de um hotelMesmo nesse caso, é bom rezar para que haja alguém que fale alguma outra língua e possa ser tradutorParece exagero? O Estado de Minas comprovou que a realidade é mais dramática do que se imaginaAlguns serviços básicos, que todo viajante pensa em contratar para maior comodidade ou pode precisar em caso de emergência, são desafios para turistas estrangeiros na capital.

Três repórteres se passaram por turistas de língua espanhola, inglesa e francesa e pediram ajuda a personagens reais
Por telefone, tentaram obter informações sobre disponibilidade e preço de quartos em hotéis e de aluguéis de carro, sobre as atrações turísticas da capital, na Empresa Municipal de Turismo de Belo Horizonte (Belotur), o preço de uma corrida de táxi até o aeroporto internacional de Confins, o tipo de atendimento prestado no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII e, no número 190 da Polícia Militar, qual procedimento deveria ser tomado depois de perder um documentoNo caso de hotéis e locadoras de veículos, foram escolhidas empresas que são referência na cidade.

Os atendimentos foram bem variados: da completa falta de informação por pura incompreensão de quem estava do outro lado da linha a informações passadas em idiomas pouco fluentes ou ainda com a mistura típica de quem não fala um nem outro, mas no fim fala de tudo e consegue passar o recado, se quem ligou estiver também disposto a se abrir ao improvisoEm duas vezes apenas, os atendentes responderam fluentemente, sem titubear – uma em espanhol e outra em inglês.

DIFICULDADE

A indiana Manju Sharma Nigam, de 31 anos, sabe bem como é issoEla já passou por experiências curiosasNum hotel de BH, era preciso ligar para o marido, que trabalha na cidade, para que ele telefonasse para a recepção todas as vezes que ela precisava de um serviço“Havia apenas um funcionário que falava um pouco de inglês, e mesmo assim, era preciso esperar horas por eles”, contaO cúmulo ocorreu no restaurante do estabelecimentoPedir comida se tornou uma missão impossível.

Vegetariana, lhe foram servidos vários pratos, incluindo frango, até que algo realmente desse universo fosse posto à mesaMas, da forma como foi feito, o melhor talvez fosse ficar com fome“Pedi uma salada e, depois de várias tentativas e explicações, o garçom chegou com um alface, cortou a raiz na minha frente e jogou no meu pratoFiquei olhando sem entender”, conta“Mesmo no hotel cinco estrelas não havia garçons falando inglêsAchei um absurdo, pois venho de uma família do ramo e, para se ter a licença dessa classificação o mínimo exigido são funcionários fluentes em outra língua”, relata.

No táxi, vale a mímica para indicar direitas e esquerdas e o velho hábito de anotar o endereço no papelNo supermercado, gestos entram sempre em cena quando necessárioO marido de Manju, o diretor-executivo Avishek Nigam, de 34, também estranha o despreparo“Será terrível para a CopaSe você quiser ir a pontos turísticos, como o Mercado Central e a feira de artesanato, ninguém sabe informarDiferente do Rio, por exemploNa feira de Copacabana, táxis e hotéis, todos falam outro idiomaA Copa é oportunidade para BH se tornar uma cidade turística, mas é preciso interagir com quem visita a cidade, pelo menos em inglês”, completa.

O presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Belo Horizonte e Região Metropolitana (Sindhorb), Paulo César Pedrosa, afirma que os profissionais estão em fase de capacitação em língua estrangeiraMas cobra interesse dos funcionários, que devem se inscrever nos cursos, e dos empresários, que devem liberá-los para estudar“Em 2012, entraremos a todo vapor com treinamento de garçons, recepcionistas, camareiras e barmans”, diz(Colaborou: Alysson Lisboa)