Jornal Estado de Minas

Grande BH tem 1,4 milhão vivendo em condições precárias

Pedro Rocha Franco
Ângela Maria, de 33 anos, Maria Vicentina Ferreira, de 50, Maria Lima dos Santos, de 38, Maria Expedita, de 53, e Neuza Maria, de 50, contam com a solidariedade para enfrentar as condições precárias de habitação às margens do Ribeirão do Onça - Foto: Beto Novaes/EM/D.A Press
Cinco vizinhas da Vila São Tomaz, na Região da Pampulha, carregam na certidão de nascimento uma homenagem à mãe de Jesus. Mas as cinco Marias, todas com a pele marcada pela árdua labuta diária debaixo do sol forte, não têm apenas o nome em comum. Elas fazem parte de um dado alarmante divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea): 1,428 milhão de moradores da Região Metropolitana de Belo Horizonte – ou 28,7% dos 4,974 milhões de habitantes – vivem em casas com condições inadequadas. No Brasil, são 54 milhões de homens e mulheres, o equivalente a 34,5% da população urbana. Os números foram calculados com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad)/2007, elaborada, anualmente, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A situação na Grande BH é melhor do que a média do chamado Brasil metropolitano (68,8%), mas as cinco vizinhas – Maria Expedita Lima dos Santos, de 53 anos, Neuza Maria Lima, de 50, Maria Lima dos Santos, de 38, Maria Vicentina Ferreira, de 50, e Ângela Maria Ribeiro, de 33 – não levam uma vida fácil. “Há de ser observado que a situação na Grande BH é bem melhor do que a de outras regiões, pois 71,3% da população da RMBH estão em moradias adequadas. Em Porto Alegre são 71,1%. No Rio de Janeiro, cidade mais conhecida fora do Brasil, 70,6%”, observa a pesquisadora Maria Piedade, xará das mulheres da Vila São Tomaz. O pior resultado ficou com Belém (29,6%) e o melhor com Curitiba (82,1%).

As cinco vizinhas moram em pequenos barracos, construídos à margem esquerda do Ribeirão do Onça, cujo leito é infestado de ratos e baratas. Nenhuma tem emprego com carteira assinada. Ajudam os maridos a sustentar a casa com os bicos que fazem como diarista ou catadora de material reciclável. O Ipea se baseia em várias observações para classificar uma moradia como inadequada. Fazem parte da lista, por exemplo, o banheiro fora do lar, o chamado adensamento de pessoas – moradores que dividem o mesmo dormitório –, o alto gasto com aluguel, a proliferação de assentamentos precários e casos de família diferentes que dividem o mesmo lar.

É nesse último quesito que está Neuza Maria. Ela mora com o marido, José Alexandre, de 30, e a filha Joélia, de 18, no mesmo endereço do sobrinho Aloísio, de 31, que divide o barracão com a mulher, Adriana, de 24, e os dois filhos do casal: Maciel, de 6, e Michele, de 10 meses. Dona Neuza Maria não se incomoda de dividir o endereço com outra família. E justifica: “Comprar uma residência em BH é muito caro. Eles podem ficar aqui o tempo que quiserem”. O Ipea constatou que as pessoas que moram em lares urbanos com superlotação domiciliar – aqueles com densidade superior a três pessoas por cômodo – somam 12,3 milhões de habitantes. Em percentual, 7,8% da população urbana.

A história de Maria Vicentina, que não tem vergonha de dizer que sabe apenas “assinar o nome”, é repleta de bondade. Casada com seu José, de 55, a mulher, que ganha por mês R$ 100 com o material reciclável que recolhe nas ruas da capital e mora num barracão sem rede coletora de esgoto, cria a pequena Isabella, de 11 anos, desde que ela era um bebê. Apesar das dificuldades, as amigas estão sempre com sorriso no rosto. O de dona Ângela Maria ajuda a disfarçar o árduo trabalho em casa. Ela e o marido, o jardineiro Renildo, não vivem no meio das rosas, mas, como diz a mulher, “vão levando a vida”.

Quando recém-casados, compraram um barraco de madeira, onde viveram por cinco anos. Conseguiram juntar dinheiro suficiente para derrubar a antiga moradia, que deu lugar a um barraco de três cômodos – quarto, cozinha e banheiro – feito de tijolo. O teto, de amianto, ainda não é o ideal, pois, na época de calor, deixa o ambiente bastante quente. “Quero crescer e ser jogador de futebol. Quem sabe do Atlético, para ajudar minha família a morar num lugar melhor”, planeja o filho de Ângela Maria, Marcos Vinícius, de 11, que não deixa de lado os estudos. “Estou na 5ª série. Nunca fui reprovado”.

O dia-a-dia na casa de Maria Expedita também não é nada fácil: “Moro quase dentro do ribeirão”. À noite, ela deita na cama e lamenta que o filho mais velho, Luciano, de 29, tenha que fazer o mesmo no sofá. O caçula, Marcos, de 21, se aconchega num colchão na sala. Mas ela não perde a esperança de que dias melhores virão, como sua sobrinha Maria Lima. “Temos um teto. Podia ser pior.”

Todas elas, por outro lado, fazem parte de uma estatística importante: têm acesso a água encanada. Na Grande BH, 98,4% dos moradores estão nesse universo, o segundo melhor do país, que perde apenas para a Grande São Paulo (98,9%). O Ipea informou que o Brasil alcançou a meta do milênio referente à oferta de água potável nas áreas urbanas.