Jornal Estado de Minas

Dia das Mães

De porta em porta

Cibele Guimarães (bartender), de 41 anos, e Bernardo Dainez (estoquista), de 24 - Foto: Bárbara Dutra/Divulgação

O isolamento nos fechou em casa, ao lado de quem mais amamos. A experiência traz muitos desafios, mas também pode ser transformadora. Mães e filhos que moram juntos têm a oportunidade de construir um relacionamento ainda mais próximo. Nesta semana do Dia das Mães, as lentes da fotógrafa Bárbara Dutra registraram momentos de afeto em família. As fotos, que fazem parte do projeto “Amor de porta em porta”, são um presente para as mães neste domingo.
 
Bárbara sempre gostou de registrar momentos em família, tanto que, no cotidiano, suas lentes se voltam principalmente para cenas que envolvem comemorações. Mas o Dia das Mães tem um significado que ultrapassa preferências profissionais e toca em cheio seu coração. Isso porque, há 17 anos, ela perdeu a mãe. “Esforço-me ainda mais quando vou fotografar uma mãe.
Dou todo o meu carinho e atenção.”
 
Katia Gonzalez (terapeuta corporal e consultora de feng shui), de 63 anos, e Eduarda Gonzalez (cineasta), de 28 - Foto: Bárbara Dutra/Divulgação 
 
As fotos simbolizam um gesto de carinho. Através das lentes, Bárbara demonstra seu apoio a mulheres que, neste período de isolamento, acumulam muitas funções em casa. “Tenho ouvido todo dia amigas, conhecidas, primas falando como tem sido difícil ser mãe na quarentena. Por isso, decidi levar um pouco de amor e carinho para elas, mesmo que de longe. Não posso abraçar, não posso nem chegar perto, mas só esta troca já traz um pouco de leveza”, comenta.
 
Renata da Matta (cenógrafa), de 33 anos, e Malu Monteiro (na barriga) - Foto: Bárbara Dutra/Divulgação 
 
Para a fotógrafa, os ensaios funcionam como um registro histórico de um momento único na vida das famílias. Um momento de muitas dificuldades, mas também de muita proximidade com quem mais amamos. Mães que trabalham fora, por exemplo, não teriam a oportunidade de acompanhar tão de perto o desenvolvimento dos filhos.
“Uma das mulheres comparou a quarentena ao puerpério: logo vamos nos esquecer de todo o sofrimento por que passamos. Mas, com esses registros, vamos nos lembrar do lado positivo, do tempo em que ficamos em casa com a família, de quando a casa era o nosso mundo.”
 
Paulina de Oliveira (empresária), de 58 anos, Francisco Machado (designer), de 29, e Maria Cândida Vechi (produtora de moda), de 27 - Foto: Bárbara Dutra/Divulgação 
 
Com perfis diversos, as mães que participaram do projeto são mulheres que Bárbara conheceu e fotografou em 10 anos de carreira. Tem bartender, padeira e arquiteta, médica, cenógrafa, maquiadora, advogada, influenciadora digital, política, jornalista. Mãe que está trabalhando em casa, mãe que precisa sair para trabalhar. Mãe na contagem regressiva para o parto, mãe que engravidou na adolescência. Mãe solteira, mãe transexual. Mãe de quatro filhos, mãe que mora com filhos e netos. Mãe de filho com deficiência, mãe de filho adotado.
Mãe que mora em condomínio luxuoso, mãe que mora em aglomerado.
 
Mariana Lasmar (empresária), de 41 anos, Tomás Lasmar, de 10, Olívia Lasmar, de 9, e Felipe Lasmar, de 5 - Foto: Bárbara Dutra/Divulgação 
 
Os ensaios eram agendados de hora em hora. De máscara, Bárbara tinha o cuidado de não se aproximar, não encostar em nada e não entrar na casa das famílias. O cenário se resumia à porta da casa. Houve apenas uma exceção. “A mãe não se sentiu segura de descer o elevador do prédio com o filho de seis meses, porque só o marido tem contato com o mundo externo, quando faz uma compra ou outra. Então, fiz a foto deles na porta do apartamento, mas distante, no corredor.”
 
Marina Vereza (empresária), de 33 anos, e Maya Vereza, de 4 meses - Foto: Bárbara Dutra/Divulgação 
 
Mesmo a distância, dava para perceber como as mulheres ficaram  emocionadas de participar do ensaio. Muitas não sabiam há mais de mês o que era escolher uma roupa e passar maquiagem. Espontaneamente, elas  queriam oferecer um café, uma cerveja ou um pão de queijo para a fotógrafa, mas este momento teve que ficar para depois. As fotos foram enviadas virtualmente para as mães e postadas nas redes sociais de Bárbara. No futuro, pode virar uma exposição para lembrar esta época.
 
Marcela Ballardin (designer de joias), de 37 anos, Maria Eduarda Ballardin, de 15, e Enzo Paschoalin, de 11 - Foto:  
 
Bárbara se inspirou na iniciativa de uma fotógrafa portuguesa.
Rita Ferro Alvim, moradora de Cascais, resolveu bater de porta em porta no seu bairro para animar vizinhas e amigas com a proximidade do Dia das Mães. O projeto tomou conta da cidade inteira e ela chegou a fazer 50 ensaios em uma manhã. Por aqui, muitas mulheres começaram a procurar Bárbara interessadas em participar e agora ela pensa em transformar os miniensaios em um produto de quarentena.
 
Com a palavra, as mães 
 
A bartender Cibele Guimarães, de 41 anos, conhecida como Jezebel, está totalmente parada nesta quarentena. Para ela, o único lado bom é poder ver o filho todos os dias. Até então, eles quase não se encontravam: ela trabalhava de noite e ele, de dia. Bernardo, de 24, continua trabalhando, mas eles conseguem lanchar todos os dias juntos. “Descobri que ele é muito mais parecido comigo do que imaginava. Muito trabalhador, mas sem paciência como eu”, conta, rindo.
 
Ana Victória Ulhôa (engenheira civil), de 33 anos, Laura, Maria e Beatriz, de 1 - Foto:  
 
Mãe e filho se viam pouco, mas isso não significa que não eram próximos. Cibele engravidou aos 16 anos e diz que a diferença de idade ajudou a torná-los muito amigos. Um conta tudo para o outro.
Antes do isolamento, eles conversavam o tempo inteiro, mas por mensagens. “O nosso vínculo afinou ainda mais com o olho no olho. Depois disso, vamos ter que nos ver mais, não vamos conseguir ficar sem nos encontrar”, diz Cibele, que recebe as fotos do ensaio como um afago.
 
Duda Salabert (professora), de 38 anos, e Sol Salabert, de 10 meses - Foto:  

A maternidade foi um desafio para a terapeuta corporal e consultora de feng shui Katia
Gonzalez, de 63. Mas hoje ela conta, com orgulho, como conseguiu construir uma relação de cumplicidade com a filha, a cineasta Eduarda Gonzalez, de 28, a quem chama de “oxigênio do meu sangue”, “presente de Deus”, “grande amiga”. As duas moram juntas e seguem unidas no isolamento. “Temos dado muita gargalhada. Neste momento em que as pessoas estão meio ranzinzas, ela é muito divertida e positiva.”
 
Mesmo no caso de Katia e Eduarda, que sempre dividiram a mesma casa, o isolamento traz descobertas. “Acabamos de selar que somos muito felizes juntas e a nossa cumplicidade está ficando cada vez mais forte. Você começa a conhecer e respeitar mais a pessoa.” A mãe considera um privilégio estar ao lado da filha “nesta grande virada de era, em que o importante não é ter, é ser feliz” (ela é a criadora da #TáFácilSerFelizCâmbio). Com a foto do ensaio, vai se lembrar para sempre deste momento.
 
Ângela Dariva (pedagoga e influenciadora digital), João Marcos Lara, de 16, e Theo Lara, de 9 - Foto:  
 
Parar não estava nos planos da cenógrafa Renata da Matta, de 33. Grávida da Malu, ela programava instalar um sistema em casa para conseguir trabalhar durante a licença-maternidade quando o isolamento a obrigou a colocar o pé no freio. “No início da quarentena, fiquei bastante ansiosa com a questão da maternidade e de ser empreendedora, mas vi que precisava me acalmar, que não tinha controle de tudo. Então, acabei fazendo muita meditação, ioga e reiki.”
 
 
 
À frente da Fósforo Cenografia, Renata trabalha para o mercado de eventos, que está em suspenso. No fim das contas, a pausa forçada a ajudou a se colocar no lugar de futura mãe. “O mercado de eventos é muito corrido, exige muito, em todos os sentidos, então essa pausa obrigatória foi boa para me conectar com a minha bebê. Precisava me concentrar nesta jornada que vai começar agora”, comenta. A cenógrafa já tinha feito ensaio de grávida, mas este será o último registro do barrigão.
 
Para a engenheira civil Ana Victória Machado Guimarães Ulhôa, de 33, talvez tenha sido mais fácil se adaptar ao isolamento do que à chegada das filhas Laura, Maria e Beatriz, de 1 ano e meio. A gravidez de trigêmeas foi inesperada e ela teve que lidar com muitas novidades (em triplo). Agora é diferente. “Como as meninas ainda não frequentam escola e eu trabalho de casa, a quarentena não mudou tanto nossa rotina. Mas, querendo ou não, são crianças, que gostam de liberdade”, observa.
Neste tempo, Ana Victória já percebeu mudanças. A mãe quer ficar ainda mais junto e as filhas estão mais apegadas. Fora a necessidade de pensar o tempo todo em atividades para entreter as meninas. “Quando você é obrigada a ficar em casa, não tem possibilidade de fazer o que quer, se vê em um momento introspectivo e pensa em como se reinventar para melhorar a relação com os filhos”, analisa a engenheira, que achou superdivertido fazer um ensaio artístico “no meio dessa loucura”.
 
O isolamento tem despertado sentimentos apostos em Paulina Ribeiro de Oliveira, de 58. “Ao mesmo tempo em que é desesperador, tem sido maravilhoso, porque propicia debates, encontros, descobertas, hábitos conjuntos que já tinham se perdido”, diz a empresária, referindo-se à relação com os filhos: a produtora de moda Maria Cândida Vechi, de 27, e o designer Francisco Machado, de 29. Eles moram em casas separadas, no mesmo terreno, e quase não se encontravam.
 
Ninguém poderia imaginar que esta rotina mudaria tão drasticamente. Mãe e filho agora se reúnem para comer, dividem as tarefas para cuidar da casa, criam juntos e fazem planos em família. Paulina ficou feliz de descobrir que eles se viram bem (até melhor que ela) na cozinha. Juntos, eles tocam o projeto de consolidar a casa, já batizada de Casa Rosa do Bonfim, como espaço para eventos. “Este momento está sendo proveitoso para a construção da gente como pessoa e da casa.” 
 
 
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