Marta De Divitiis
Especial para o Feminino & Masculino
A 48ª edição da SPFW (São Paulo Fashion Week) terminou em 18 de outubro, deixando no ar um clima de consciência ambiental. De volta ao Parque do Ibirapuera, desta vez no Pavilhão das Culturas Brasileiras em vez da Arca, na Vila Leopoldina, o evento encolheu (foram 26 desfiles, seis do Projeto Estufa, sendo que na edição passada houve um total de 35 desfiles), tendo sido acrescentado um ciclo de palestras. A diversidade chegou para ficar – nunca as passarelas tiveram tantos modelos reais. O rapaz trans Sam Porto participou de nove deles, com certo destaque, assim como modelos plus size e outros mais idosos.
Priorizando a acessibilidade houve uma parceria com a Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência (SMPED), que disponibilizou nos desfiles do Projeto Estufa audiodescrição para deficientes visuais realizada por jornalistas convidados, como Lilian Pacce e o professor universitário Dario Caldas.
O que se viu na passarela foi um inverno (embora as estações estivessem um pouco difusas nas últimas temporadas, voltamos praticamente ao ciclo de outono/inverno- primavera/verão) leve, atemporal e, mais do que tudo, funcional. Reflexo do momento, o que se buscou foram peças que, quando não reaproveitadas, vieram com modelagens básicas, sofisticadas, em ótimos tecidos e com poucos detalhes. O streetwear veio com muitos bolsos funcionais nos remetendo aos anos 90 e foi visto especialmente no jeanswear da Ellus, na Beira e em algumas peças de João Pimenta e Gloria Coelho. Participante do Projeto Estufa, Korshi trabalhou peças com inúmeras funções, numa profusão de recortes e botões de pressão. Uma saia pode se transformar em corselet e um macacão em vestido, por exemplo.
O upcycling foi levado ao extremo em Fernanda Yamamoto que reutilizou, para comemorar dez anos de marca, 300 peças desfiladas anteriormente que foram descontruídas e reconstruídas de outra forma. “Foi um exercício de desapego,” concluiu.
Já carioca Victor Hugo Mattos, do Projeto Estufa, reutilizou peças de alfaiataria muito bem cortadas, que ganharam uma releitura com bordados exuberantes, alguns com viés sacro. Ao mesmo tempo usou crochê em bases femininas e leves, com bordados.
Atemporalidade funcional Modelagens confortáveis e amplas vieram em Beira, com bolsos amplos e poucos recortes. A BobStore trouxe também modelagens mais cômodas e recortes geométricos. Neriage veio leve, com tecidos escorregadios, com lindos tricôs e plissados. A Hundred também se apresentou leve, com muito linho e modelagens confortáveis, amplas que ofereceram desejo de usar. Reinaldo Lourenço mesclou elementos do punk inglês que resultaram numa coleção extremamente luxuosa, com tecidos leves, veludo e couro. A estreante Angela Brito mostrou peças em cores fortes e assimetria. Lilly Sarti veio com detalhes recorrentes em seu trabalho com resultado refinado, em transparências, franjas e brilhos. Os brilhos metálicos estiveram presentes também nas roupas de Lino Villaventura.
Inspirada no trabalho de Expedito Seleiro, nordestino famoso pelas selas de couro finamente trabalhadas, pela primeira vez a Amapô trouxe uma coleção que deixou um pouco de lado a fantasia exagerada. Jaquetas e calças vieram com estampas que nos remetem ao sertão e acessórios ganharam o desenho sofisticado do artesão. O estreante Isaac Silva trouxe o axé baiano para a passarela e veio com branco total em peças com trabalhos em renda Richelieu, típica da região.
Buscando uma diferenciação na forma de se apresentar, Another Place trocou o desfile por um filme (no teatro Itália) tendo o ator Johnny Massaro como protagonista, um psp Star dividido e vestindo vários figurinos, de calças, camisas e jaquetas, depois mostrado rapidamente por modelos no palco do teatro.
Mineiros se destacam
no Romantismo e no
reforço de seu DNA
Nesta edição foi sentida a falta de Ronaldo Fraga, que resolveu não desfilar. A Modem, cuja direção criativa fica a cargo do mineiro André Boffano (responsável também pelo estilo da BobStore), apostou numa revisitação de seu acervo. Alfaiataria com modelagem clássica e ao mesmo tempo contemporânea, trouxe peças assimétricas, tricôs dupla-face, modelagens obtidas da moulage. Sofisticada e luxuosa, a coleção mostrou pela primeira vez calçados e bolsas, estas inspiradas nas icônicas câmeras Bag. “Trabalho para ambas as marcas: BobStore e Modem, urbanas, que é o que gosto de fazer, e na Modem trago uma pegada bem mais contemporânea, meu cartão de visitas”, explica Boffano.
Luis Cláudio, do Apartamento 03, se inspirou nas imagens do artista japonês Kazuo Ono, traduzido numa coleção que reforça seu DNA, com modelos plissados, poucos bordados e elementos militares, sutis, em vestidos e calças com modelagens confortáveis e cortes impecáveis. Brilhos leves em alguns tecidos, com destaque para o veludo vermelho em uma única peça.
Fabiana Milazzo quis trazer para a coleção todo o aconchego que ela sente ao ouvir a música “Casa no Campo” cantada por Elis Regina. Assim as peças vieram românticas, floridas, com alturas variadas, do midi ao longo, em tecidos leves e fluídos. Os tricôs amplos trouxeram bordados de flores campestres. A cintura, hora marcada, hora Império, babados e saias três marias tiveram destaque. Dando atenção à sustentabilidade a estilista apresentou na passarela algodão orgânico e PIMA, seda orgânica e tecidos com resíduos de algodão e garrafas pet. Os bordados handmade, feitos todos dentro de um projeto, Mulheres de Renda, priorizou o trabalho coletivo.
PatBo buscou inspiração em Portugal, traduzido em estampas da azulejaria colonial. Buscando um espaço no mercado externo apostou novamente em moda praia, mais comportada, em maiôs e collants com mangas bufantes. Aqui e ali bordados localizados.
No Projeto Estufa, o destaque foi para a Mipinta, de Fernando Miró, mineiro de Belo Horizonte, radicado em Bruxelas, onde estuda design. “A Mipinta, costumo dizer, antes de uma marca é mais um laboratório de pesquisa e na moda estamos num momento de repensar nossos princípios, então utilizamos muito o upcycling,” diz Miró. Assim peças de brechó sobrepostas foram base da coleção. Destaque para a jaqueta toda confeccionada com diversas sacolas de feira, num exercício interessante de criatividade.
No próximo inverno valerá apostar:
» Modelagens confortáveis, mas muito bem cortadas, especialmente em peças de alfaiataria. Não se acanhe e percorra brechós onde pode-se achar verdadeiros tesouros escondidos. Se quiser, pode dar um toque pessoal por meio de bordados localizados ou algum outro detalhe diferente.
» Peças fluidas, leves, compostas com tricôs amplos e cômodos. Entram aqui os tecidos como algodão, lãs leves, cetim e seda.
Cores básicas: preto, cinza, bege, marrom e ocre, com leves pitadas de amarelo açafrão, pink e vermelho.
» Peças com bolsos funcionais, como calças cargo e parkas. Jaquetas com vários bolsos também continuam na ordem da estação. Nos acessórios unckle boots, botas estilo western, botas na altura dos joelhos. Calçados oxford e sandálias de salto meia pata. Bolsas de todos os tamanhos, em variedade de formatos.