Ruas e avenidas repletas de automóveis são o retrato das mudanças na economia. Por um lado o governo incentiva a compra de mais veículos, reduzindo os impostos, por outro tenta conter as emissões de gases nocivos à atmosfera. Na prática, uma contradição. Em 10 anos, o tamanho da frota brasileira dobrou. Hoje, o país tem cerca de 70 milhões de veículos, segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Somente no ano passado, quase 150 mil veículos novos foram emplacados em Belo Horizonte. De acordo com o Departamento Estadual de Trânsito de Minas Gerais (Detran-MG), a cidade tem quase 1,5 milhão de carros, motos e caminhões, o que explica os congestionamentos cada vez mais frequentes.
O número é recorde também, por exemplo, na telefonia celular. Entre 2007 e 2011, o número de linhas dobrou, passando de 120 milhões para 242 milhões, segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
De acordo com dados da Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), a produção de lixo no Brasil cresceu seis vezes mais que a população, que aumentou apenas 1%. Ricardo Guedes, doutor em ciências políticas pela Universidade de Chicago e diretor do Instituto de Pesquisas Sensus, é cético quanto à possibilidade de uma conscientização em massa acerca da necessidade de se reduzir o consumo. Por uma razão simples: o que está por trás do aumento do consumo é um sistema econômico muito forte.
"Vence a disputa pelo mercado quem vender mais. O consumo é consequência dessa concorrência mercadológica. É muito mais do que apenas um hábito do consumidor. E não há percepção de que estamos na iminência de uma crise."
Tendo em vista a reduzida possibilidade de se obterem resultados pela via da conscientização do consumidor, Guedes considera como única alternativa uma maior intervenção do poder público sobre o mercado, taxando, por exemplo, os automóveis que consomem mais combustível. Na contramão da ideia, o governo reduziu o IPI dos carros para estimular o setor.
Envolvimento
Quem também defende a regulação do consumo é o jurista Paulo Affonso Leme Machado, vice-presidente do Centro Internacional de Direito Comparado para o Meio Ambiente. "O Estado e o mercado devem coexistir. Mas o mercado não pode regular tudo. É preciso a presença do Estado para gerir e conter o superlucro", diz. Para o jurista, caberá ao Estado assegurar bem-estar suficiente de modo a não colocar em risco os limites do planeta."Acho que está na hora de se pensar mais claramente nisso. Em vez do crescimento ilimitado do consumo, a sustentabilidade ilimitada", afirma.
Para Victor Bicca Neto, presidente do Compromisso Empresarial pela Reciclagem (Cempre) - associação empresarial dedicada à promoção da reciclagem e gestão integrada do lixo -, o aumento do consumo não é algo ruim. "Esse crescimento do consumo, por si só, não é problema. O importante é que ele venha acompanhado de medidas que façam com que o material descartado (embalagens em geral, por exemplo) retorne à cadeia produtiva e reduzam ao máximo o consumo de recursos naturais novos", explica.