Jornal Estado de Minas

TECNOLOGIA

Meu chefe é um robô: o uso da inteligência artificial no trabalho

Quem trabalha na Amazon deve ter muito cuidado com as pausas que faz durante o turno. Nos Estados Unidos, um sistema de rastreamento monitora a atividade dos funcionários e pode determinar automaticamente quem dispensar quando as metas de produtividade estabelecidas pela empresa não forem atingidas. A informação foi publicada por Business Insider Itália, em 3 de maio de 2019.



A realidade já chegou no Brasil. E será tema de discussão do III Congresso Internacional de Direito e Inteligência Artificial (CIDIA), realizado pela SKEMA Business School, que ocorrerá de forma híbrida de 8 e 10 de junho.

As relações entre inteligência artificial no judiciário, com enfoque na ética e nos impactos no mercado de trabalho, compõe os principais temas debatidos pelos especialistas. Serão quatro painéis de debates distintos. 

O uso da inteligência artificial é um tema polêmico. Poderia um robô aferir se um ser humano é produtivo? Como são interpretados pelos gestores estes dados capturados pelas máquinas? Os algoritmos estariam colaborando com a demissão daqueles com menor desempenho? Como o direito do trabalho, feito em um universo analógico, pode proteger trabalhadores e empresas?

SENTEÇA RECONHECE VÍNCULO EMPREGATÍCIO

O congresso terá a participação do ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Maurício Godinho, que tratará impactos da inteligência artificial no mercado de trabalho.





É dele a decisão que reconheceu o vínculo empregatício entre um motorista e a Uber e determinou que os autos retornem à origem para que o juízo do trabalho analise os pedidos do trabalhador que ajuizou a ação contra a plataforma. 

Leia também:  Como desenvolver inteligência emocional para a carreira e para a vida.

Trata-se de um precedente inédito na Corte, a favor do trabalhador, uma vez que a 4ª e a 5ª Turmas têm entendimento em sentido contrário. A decisão é de 6 de abril e reforça o debate sobre o uso ou abuso do algoritmo na precarização das condições de trabalho. 




O MERCADO DE TRABALHO MUDOU

Segundo Caio Souza Lara, advogado, professor e coordenador do congresso, o evento propõe ainda trazer discussões acadêmicas relevantes, como a inovação no mercado de trabalho para a sociedade em geral.

O mercado de trabalho mudou e o direito precisa estar totalmente atualizado. Caio Souza Laraexplica, que não apenas a abordagem do CIDIA é pioneira, mas o formato transversal e com aplicabilidade prática é também inovador.

Além de palestras, serão formados grupos de trabalho para a discussão e avaliação de artigos e resumos expandidos de pesquisadores 

“Colocamos boa parte das discussões e resumos expandidos apresentados nas edições anteriores à serviço da sociedade. No ano passado, por exemplo, tivemos um trabalho de Gabriella Miraíra Abreu Bettio que fez um apanhado teórico minucioso sobre a Sociedade do cansaço e direito à desconexão durante a pandemia. O estudo tem sido fonte de consulta para diversos advogados em decisões trabalhistas porque compila leis e dados fundamentais para análise do abuso das empresas via tecnologia", conta Caio.





No estudo de Gabriella Miraíra Abreu Bettio, ela constatou que as pessoas passaram a viver mais a urgência porque a tecnologia e o home office fizeram a combinação perfeita para que a desconexão seja cada vez mais difícil (foto: Arquivo Pessoal)
Gabriella, aliás, usou dados de seu artigo aplicado ao Programa de Ensino, Pesquisa e Extensão em acesso à justiça e solução de conflitos da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas (Recaj), destaca Caio. 
 
Gabriella, de 20 anos, disse que partiu sua pesquisa sobre o impacto da tecnologia no universo do trabalho durante a pandemia vendo o esgotamento da mãe, da irmã e o próprio cansaço.

A autoexigência pelas hiperconexão compensatória da ausência física e alguns abusos de contatos de empresas e colegas de trabalho e colaboradores fez com que ela começasse a pesquisar sobre a necessidade de uma (re)educação pelo limite.

“Passamos a viver ainda mais a urgência porque a tecnologia e o home office fizeram a combinação perfeita para que a desconexão fosse cada vez mais difícil. E isso provocou uma série de transtornos mentais mascarados por uma suposta produtividade e um excesso de positividade. Depois que eu estudei para escrever meu artigo e apresentar no Congresso, reorganizei minha jornada. E passei a construir material informativo sobre estes direitos porque não é claro o nosso direito à desconexão, ao ócio, ao lazer e a uma vida saudável. E passei a usar o Recaj para informar as pessoas sobre isso”, revela Gabriella.




A DRISCRIMINAÇÃO ALGORÍTMICA

Outra ideia que saiu do papel e tem promovido educação em direito e trabalho foi o trabalho de Natália Vitoriano, de 21 anos, estudante de direito. Ela pesquisou sobre a discriminação algorítmica como um reformo do preconceito contra a mulher no mercado de trabalho

Trabalho da estudante Natália Vitoriano mostrou que numa seleção de currículos feitas por robôs, as fotos de mulheres negras podem ser menos selecionadas para melhores postos de trabalhos e mulheres jovens podem ter privilégios em relação às mais velhas (foto: Arquivo Pessoal)
“Eu fiz uma análise sobre como o big data reforça o preconceito que existe na sociedade, inclusive, o contra a melhor em geral e também no universo do empregatício. O algoritmo, o pouco que sabemos dele, é elaborado por homens, brancos e ricos. E todo o corte de seleção já parte deste rasgo patriarcal que privilegia pares da mesma natureza."

Ela conta que, então, numa seleção de currículos feitas por robôs, as fotos de mulheres negras podem ser menos selecionadas para melhores postos de trabalhos. "Mulheres jovens podem ter privilégios em relação às mais velhas, brancas em relação às negras e por temos um universo enorme de variações de preconceitos possíveis em relação à mulher na hora de conseguir um emprego, ser avaliada e até demitida", alerta a estudante.

PARTICIPÇÃO NO CONGRESSO

Podem participar especialistas, estudiosos ou cidadãos interessados no assunto. As categorias são: ouvinte, apresentador de painel e apresentador de artigo.





A comissão organizadora premiará até três autores dos trabalhos apresentados no evento com a concessão de bolsas aos seus autores, parciais ou totais, em cursos de curta duração ou pós-graduação promovidos pela SKEMA Brasil. O evento será transmitido ao vivo pelo youtube da SKEMA neste link.
 

A PROGRAMAÇÃO

DIA 08/06 – quarta-feira
  • Abertura (painel I): 19h
  • Saudação de abertura: Geneviève Poulingue
  • Pós-graduação de Direito e Tecnologia e o NEXT Law Lab: Edgar Gastón Jacobs Flores Filho
  • Tema: Sistemas de Inteligência Artificial no Poder Judiciário - análise da experiência brasileira e colombiana
  • Painelista: Felipe Calderón-Valencia (Colômbia)
  • Debatedores: Caio Augusto Souza Lara e Valter Moura do Carmo
DIA 09/06 – quinta-feira

  • Painel II: 09h
  • Mediador: Nelson Rosenvald
  • Tema: Responsabilidade Civil e tecnologia: questões contemporâneas
  • Painelistas: José Luiz de Moura Faleiros Júnior, Caitlin Mulholland e Manuel Ortiz Fernández (Espanha)
  • 13:00h – Diálogo Brasil-França com Prof. Frederic Marty
  • 14:00h - Grupo de Trabalho Especial da SKEMA França – “Digital Sovereignty, how to depend less on Big tech?” - Profª. Isabelle Bufflier
  • Grupos de Trabalho (on-line) – 14h às 18h 
  • Painel III: 19h
  • Mediadora: Adriana Goulart de Sena Orsini
  • Tema: Desafios contemporâneos do gerenciamento algorítmico do trabalho
  • Painelistas: Maurício Godinho Delgado e José Eduardo de Resende Chaves Júnior
DIA 10/06 – sexta-feira
  • Painel IV: 09h (Encerramento)
  • Mediador: Caio Augusto Souza Lara
  • Tema: Inovação e Poder Judiciário
  • Painelistas: 1º Momento: Rodrigo Martins Faria e equipe da Unidade Avançada de Inovação do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. 2º Momento: Vicente de Paula Maciel Júnior, Fabrício Veiga Costa e equipe do Processo Coletivo Eletrônico – Projeto vencedor do 18º Prêmio Innovare
  • Grupos de Trabalho (on-line) – 14h às 18h