Brasília – De frente para a gôndola de chocolates e doces de um supermercado, a estudante Maria Lana Fernandes, de 13 anos, retira um tablete, olha, e devolve. Pega outro, mas também devolve. Depois de algum tempo, abandona a pesquisa de preços e pega a barra de chocolate que confessa ser a paixão dela. Diz que a mesada está curta e a mãe proibiu a compra da marca mais cara, sua predileta desde criança.
O estudo do Instituto Nielsen mostra que a queda da atividade econômica, medida pelo Produto Interno Bruto (PIB, o conjunto da produção de bens e serviços do país), a inflação elevada e o cenário político instável geraram desesperança, tendo como resultado concreto no ano passado o encolhimento da renda familiar brasileira. Em cerca de 52% dos domicílios, algum membro da família foi atingido pelo desemprego em 2016. Nos outros 48%, alguma poupança está sendo feita para driblar as incertezas, como mostra o levantamento.
Apertar os cintos foi a saída na maioria das regiões brasileiras, depois de dois anos em que a população vem gastando acima dos rendimentos. A exceção ficou por conta do Centro-Oeste, onde as despesas em 2016 subiram 12,8% em relação à renda da região. No outro extremo, houve queda de 6,5% das despesas, por exemplo, ocorrida entre os habitantes do interior paulista.
Segundo os pesquisadores do Instituto Nielsen, castigado pela recessão continuada, o brasileiro tem se virado para tentar equilibrar as despesas. Entre as escolhas na hora de decidir comprar, sobressaiu-se a troca de marcas (42%). Depois, aparece a contenção de gastos no supermercado (22% das famílias), reduzindo o consumo mas mantendo a marca que gosta. A terceira prática para economizar foi o corte de alimentação fora de casa (7%), enquanto outros 5% escolheram diminuir despesas com vestuário e bens duráveis.
O estudo mostrou ainda que a troca por marcas de preços mais em conta foi liderada pela classe C, aquela que já puxou o crescimento do consumo em anos anteriores. Essa e outras alternativas de economia resultaram na compra de maior quantidade de produtos nos supermercados, embora gastando menos.
Mãe em tempo integral, Cecília Duarte Lima Prado, 34 anos, e quatro filhos, diz ser difícil demais sacrificar a qualidade por preço menor. “Não acho que seja tudo igual, de jeito nenhum”, diz. “Tenho uma amiga que faz isso; costuma ver o preço antes da marca do produto. Outro dia, troquei a marca de arroz, mas detestei”, exemplifica. O marido de Cecília é sushiman, por isso a família prioriza a boa alimentação e não se preocupa tanto com o preço.
EQUILÍBRIO “Muito saudável” para o mercado e para o consumidor. Assim o educador financeiro Alvaro Modernell, da consultoria Mais Ativos, avalia a troca de marcas em busca de menor preço. “A médio prazo pode levar a um equilíbrio de preços, até que o consumidor encontre a melhor relação custo/benefício”, afirma. A crise obriga as pessoas a buscarem alternativas e também abrir as portas a novas empresas que, para competir, oferecem melhor qualidade com bom preço, define o professor.
BAIXA RENDA A inflação percebida pelas famílias de baixa renda registrou alta de 0,11% em abril, depois do avanço de 0,56% em março, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor - Classe 1 (IPC-C1) divulgado ontem pela Fundação Getulio Vargas (FGV). O indicador é usado para mensurar o impacto da movimentação de preços entre famílias com renda mensal entre 1 e 2,5 salários mínimos. Com o resultado, o índice acumulou alta de 1,30% no ano e em 12 meses, a taxa do IPC-C1 ficou em 3,64%. O resultado foi influenciado pelo aumento dos preços dos grupos de itens de saúde e cuidados pessoais, comunicação, alimentação, transportes e educação, leitura e recreação.