O crédito fácil e barato, responsável pela expansão do consumo nas classes C e D, está arrefecendo, assim como o interesse dos trabalhadores que ganham entre R$ 600 e R$ 3 mil, pertencentes a essa parcela da população, em manter as compras. Pesquisa divulgada pela agência McCann Erickson Publicidade, realizada entre 25 e 30 de outubro em metrópoles e cidades com mais de 200 mil habitantes nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste, revela que 36% dos 618 entrevistados esperam, como conseqüência da crise, reduzir o consumo.
“As classes mais baixas vão ser mais afetadas pela restrição ao crédito e haverá uma contenção do consumo para os bens não essenciais. Esse será o principal reflexo da crise”, afirma Milton Gimenes, diretor-geral da Target Marketing, empresa especializada em pesquisa de mercado. E as pessoas estão realmente dispostas a realizar cortes que, para a maioria, serão iniciados no cartão, mas ainda podem atingir o lazer da família e a compra de celulares. Além da redução dos gastos, ainda 61% dos entrevistados consideram postergar planos e projetos, como a melhoria da casa e a compra do carro.
Assim como a turbulência econômica é peculiar por ter sido iniciada nos países desenvolvidos e se alastrado para o restante do mundo, a pesquisa também revela um comportamento curioso quanto à preocupação sentida por habitantes de cidades do interior dos estados e aqueles que vivem nas capitais. O interior está mais pessimista e preocupado, já que, para 47% dos interioranos a vida já está pior, enquanto nas capitais, o percentual é de 36%. “A força do agronegócio no interior é muito grande e a economia dessas cidades está muito globalizada. Como houve uma queda nos preços das commodities, o problema já vem sendo sentido há alguns meses já que a maior parte da economia gira em torno desse negócio”, explica Aloísio Pinto, vice-presidente de planejamento da McCann.
O receio é grande: 76% dos pesquisados estão preocupados com a situação econômica do país. A diarista Valdívia Pereira Costa já demonstra certa cautela e adia o plano de iniciar a construção de sua casa. “Vou deixar a casa parada, porque acho que a crise vai atingir muito o preço do material de construção”, afirma. Na avaliação dela, o que vai pesar é o aperto nas compras, já que os produtos estarão disponíveis, mas o dinheiro para comprar estará mais difícil. “O dinheiro está diminuindo. As pessoas que ganham menos serão as mais afetadas”, explica.
O cenário de incertezas, porém, ainda não foi sentido por boa parte da população, já que, para 58% dos entrevistados, a vida nos últimos meses está semelhante ao que era antes, enquanto 25% acreditam ter piorado. Mas nem por isso impediu que o resultado quanto aos efeitos do momento econômico na família fosse avaliado por 88% das pessoas como inevitável. “O que vai indicar que a crise está na vida do cidadão será no momento em que o desemprego começar a se aproximar, seja através de um amigo ou parente ou quando o rendimento mensal não for mais suficiente para as compras habituais”, observa Aloísio. A pesquisa revela que 32% das pessoas receiam que o emprego seja comprometido.
Os dados do levantamento também revelam um perfil de consumidor das classes C e D que está mais susceptível a um comportamento reativo à crise. Seriam as mulheres, gerentes do orçamento doméstico, que decidem as compras da família e que têm a renda consumida com contas fixas, como a escola dos filhos. “As mulheres são mais preocupadas e estão cada vez mais a frente do orçamento familiar, o que justifica o resultado”, avalia Aloísio. Ainda segundo ele, a pesquisa foi realizada justamente para evidenciar a postura dos consumidores das classes sociais emergentes. “A tônica da crise será ditada pelo comportamento das classes C e D, já que o crescimento do Brasil é ditado pelo consumo interno. O aumento do alarmismo terá, cada vez mais, efeito sobre essa parcela da população.”