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Estado de Minas

Impactos da Lei de Liberdade Econômica


postado em 04/10/2019 04:00

Felipe Rebelo Lemos Moraes
Advogado de direito do trabalho do escritório Baraldi Mélega Advogados


No último dia 20, o presidente da República sancionou a MP 881/19, que agora passa a vigorar como Lei 13.874/2019, conhecida como Lei da Liberdade Econômica. O texto traz medidas que visam à desburocratização e a simplificação de processos para empresas e empreendedores. Portanto, o escopo da lei é de impulsionar a economia, através do estabelecimento de garantias de livre mercado, com impactos em variados segmentos legislativos, especialmente nas regras trabalhistas, previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Com o fim do antigo Ministério do Trabalho e Emprego, que foi aglutinado pelos ministérios da Economia, Justiça e Cidadania, um dos reflexos impostos pela lei foi atribuir ao Ministério da Economia a competência para regulamentar os modelos de carteira de trabalho. Sobre esse aspecto, a alteração promovida pela Lei 13.874/19 não representa uma mudança propriamente dita, mas sim uma atualização da lei.

A Lei da Liberdade Econômica alterou ainda o artigo 14 da CLT, estabelecendo que a carteira de trabalho será emitida preferencialmente de forma eletrônica. Todavia, o parágrafo único do artigo 14 prevê algumas hipóteses que viabilizam a emissão da CTPS em meio físico: nas unidades descentralizadas do Ministério da Economia que forem habilitadas para a emissão; mediante convênio, por órgãos federais, estaduais e municipais da administração direta ou indireta; e mediante convênio com serviços notariais e de registro, sem custos para a administração, garantidas as condições de segurança das informações. Tem-se, pois, que a regra geral é que a CTPS seja emitida por meio eletrônico, somente podendo ser expedida por meio físico nos casos estabelecidos na lei.

Outra modificação na emissão da CTPS diz respeito às informações contidas no documento; anteriormente à vigência da Lei da Liberdade Econômica, tínhamos uma série de dados. Seguindo a tendência de simplificação, o artigo 16 da CLT agora passa a vigorar estabelecendo que a CTPS terá como identificação única do empregado o número do CPF. O prazo para anotação da CTPS por parte do empregador também foi ampliado. Anteriormente, a CTPS deveria ser anotada no prazo máximo de 48 horas corridas. Agora o prazo passa a ser de cinco dias úteis.

A Lei da Liberdade Econômica alterou ainda o artigo 74 da CLT, que obrigava a empresa com mais de 10 empregados a manter o registro de ponto de cada um. Agora, será somente quando a empresa tiver mais de 20 trabalhadores, sendo permitida a pré-assinalação do intervalo destinado ao descanso e refeição. Isso quer dizer que empresas com até 20 funcionários não têm a obrigação de manter os controles de frequência de seus empregados. A anotação do horário de intervalo intrajornada continua sendo uma opção da empresa. A ampliação do limite de funcionários, inclusive, deve ocasionar a revisão da Súmula 338 do TST.

Além disso, a Lei da Liberdade Econômica incluiu no artigo 74 da CLT a permissão para que as empresas utilizem o registro de ponto por exceção à jornada regular de trabalho, o que deverá ser feito mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho. A ideia é de somente anotar atrasos, faltas, trabalho aos sábados, domingos e feriados, ou seja, situações que fujam da rotina de trabalho pactuada entre a empresa e o empregado. Isso quer dizer que os cartões de ponto somente devem ser marcados nos dias em que o empregado, por qualquer motivo que seja, chegue atrasado ou antes do seu horário habitual; ou saia mais cedo ou mais tarde do que a jornada habitual.

O mesmo deve ser feito em relação à prestação de serviços aos sábados, domingos e feriados, caso não tenha sido avençado entre patrão e empregado o trabalho nesses dias, e ainda assim em caráter excepcional, caso o empregado trabalhe, o registro de ponto deverá ser feito, por se tratar de uma exceção. Os demais dias, em que não houver qualquer alteração em relação aos horários habitualmente cumpridos pelo empregado, tampouco em relação aos dias laborados, não será exigida a anotação do cartão de ponto.

A adoção do ponto por exceção poderá ser feita, inclusive, sem a participação do sindicato representante da categoria profissional do empregado, uma vez que a lei permitiu a sua adoção por meio de acordo individual de trabalho entre empregado e empresa. Assim como já acontecia, os cartões de ponto gozam de presunção relativa de veracidade. Todavia, ela pode ser elidida através de prova em contrário, o que poderia ser feito, por exemplo, através de depoimento de testemunha que atestasse que as informações reportadas pela empresa no registro de ponto por exceção não correspondem à realidade.

Sob o prisma dos princípios que nortearam a criação da Lei da Liberdade Econômica, a adoção da medida é salutar. Todavia, é temerária quando se observa sob a ótica do empregado, que naturalmente já se encontra em situação de vulnerabilidade em virtude da relação bilateral em que ele é o elo mais frágil. O que já se observava antes mesmo da vigência da lei eram os inúmeros casos em que os controles de ponto não representavam a realidade vivenciada entre empresa e empregado.

Pondere-se que o entendimento do TST já era de que os controles de ponto com horários uniformes não atenderiam às exigências da CLT. Isto é, anteriormente à vigência da lei, os chamados "controles de ponto britânicos", que são aqueles em que não há variação nos horários de entrada e de saída, apontados de forma visivelmente mecânica, não tinham validade probatória alguma.

Agora, com a nova dinâmica e permissão de utilização do ponto por exceção, a regra geral é justamente o contrário: os dias que não fujam da normalidade da carga horária diária do empregado não precisarão ser anotados. Importante anotar, todavia, que a adoção do ponto por exceção é uma faculdade, de modo que é possível que as empresas continuem utilizando o modelo atual.

Em última análise, fica claro que as alterações na legislação trabalhista seguem um ideal liberalista, em que é dado prestígio à autonomia privada, materializada através de ajustes feitos diretamente entre empresas e empregados, sobretudo com base no princípio da boa-fé dos particulares perante o poder público, bem como a clara intervenção subsidiária do Estado sobre o exercício de atividades econômicas.


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