Jornal Estado de Minas

ABERTO AO PÚBLICO

Palácio das Mangabeiras: como viver experiências na casa do governador

Inspirada pelas lembranças do escritório onde o pai trabalhou, a arquiteta Isabela Vecci criou um ambiente de repartição pública (foto: Jomar Bragança/Divulgação)

Até então, mal se podia passar perto do portão. O Palácio das Mangabeiras era cercado por seguranças e segredos. Agora os belo-horizontinos podem, não só visitar toda a propriedade, como se sentar para comer na sala da casa do governador. Com menu assinado pelos chefs André de Melo e Paulo Vasconcellos, do bufê Bravo, o Restaurante do Palácio se abre para uma nova história.





 


Não estava nos planos dos sócios ter um restaurante, apesar dos inúmeros pedidos e propostas. Mas os olhos deles brilharam com o convite para ocupar um lugar simbólico, cujas paredes são testemunhas da nossa história.

“É um orgulho poder explorar, através da gastronomia, um lugar que envolve uma mística e gera muita curiosidade”, define André. “Nós também sentimos isso.”


Aos poucos, enquanto subimos a ladeira, os detalhes da casa branca se revelam. Com fachada curva e janelas de cima abaixo, fica no ponto mais alto do terreno.

 

Inaugurado em 1955, o Palácio das Mangabeiras foi construído para ser a residência oficial dos governadores de Minas Gerais. Há três anos, virou Parque do Palácio. O projeto arquitetônico original é de Oscar Niemeyer.



As portas se abrem e nos levam a um encontro com a exuberante escada que dá acesso ao segundo andar. Mais alguns passos e estamos no meio da sala do governador.

Chama a atenção o revestimento de madeira nas paredes e pilastras, que, inclusive, inspiraram o projeto de Isabela Vecci.

A arquiteta se lembrou do escritório onde o pai trabalhava, no Centro de BH, e criou um ambiente de repartição pública, com fotos e objetos antigos, como máquina de escrever, relógio, televisão e mesa de telefonista.

Dos arquivos de metal, “brotam” plantas que exibem toda a sua vivacidade. “Quando vi as plantas 'nascendo' dentro das gavetas, tive a mesma sensação de quando vi o palácio Angkor Wat, no Camboja, que foi tomado pela natureza”, comenta o chef.



No restaurante, o verde é uma extensão da Serra do Curral, que “abraça” o palácio, da mata ao redor e dos jardins de Roberto Burle Marx.

Não tem como explicar a sensação de se sentar em uma mesa posta para comer no palácio, que até então existia apenas no nosso imaginário, em um dia qualquer. Só vivendo.

A sala ao lado, onde o governador fazia os despachos, pode ser reservada para aniversários, almoços de negócios ou por quem busca um momento de mais privacidade.


O menu passeia pela pluralidade de culturas e sabores que existem em território mineiro, a começar pela mistura de povos. “Eu mesmo tenho uma avó francesa, outra italiana, um avô brasileiro e um pai libanês. Sou de uma família com origem em quatro países”, conta André.

Filé Wellington com purê de batata e alho-poró trufado e espinafre (foto: Victor Schwaner/Divulgação)

O trabalho sem fronteiras tem a ver com a própria vocação histórica do palácio. Imagina, enquanto casa do governador, quantos convidados passaram por ali, de várias nacionalidades.



A sugestão é começar pela árvore de chips de tubérculos e crocante de polvilho. Não só pelos sabores, mas pela história que conta.

“Quando comecei a frequentar o palácio, sempre que chegava a hora do pôr do sol, chamada de golden hour, via que as árvores iam mudando de cor e isso me encantava. Pensei: tenho que criar um prato consiga levar essa vivência para a mesa.”

Apoiadas no tronco e nos galhos de ferro, as “folhas” de batata inglesa, batata-doce, banana-da-terra e o polvilho representam as diferentes tonalidades do pôr do sol, um dos atrativos do Parque do Palácio.

Para acompanhar, coalhada seca, homus e guacamole, o que gera infinitas possibilidades de combinações. Segundo o chef, essa entrada simboliza o que ele busca na gastronomia: além de bonita e gostosa, a comida tem que ser divertida e, sempre que possível, compartilhada.

O pastel de bobó de camarão com catupiri é outro exemplo. Para começar, a surpresa. O recheio, bem farto, vem do lado de fora da massa, então cada um pode comer como e quanto quiser. Muitos clientes falam que aquele é o pastel mais recheado que já comeram na vida.



O varal de parma com azeitonas marinadas, muçarela de búfala e focaccia propõe a mesma “brincadeira”.

Homenagem aos clássicos

De longe, o prato mais comentado e fotografado é o inglês bife Wellington. Muito pelo ineditismo, porque não se encontra fácil em restaurante. André teve essa ideia por acreditar que fazia sentido servir, em um ambiente clássico, uma receita clássica.

Ravioli de funghi com molho de queijo canastra e cogumelos defumados (foto: Victor Schwaner/Divulgação)

“Essa foi a maneira que encontrei de homenagear uma comida clássica, que não é de autor. Nem sempre precisamos ser o mais inovador e o mais criativo. Podemos fazer uma comida confortante, para que as pessoa sintam todos os sabores.”

O chef prepara como manda a tradição. Envolve o filé, selado, em patê de cogumelos salteados na manteiga com tomilho, presunto parma e massa folhada. São dois dias, considerando os intervalos de descanso na geladeira, para ficar pronto.



O momento em que o garçom chega à mesa para partir o Wellington é o mais aguardado. Todos da mesa param para ouvir o som da crocância da casca e ver a carne rosada surgir, bem suculenta.

Este é o único prato principal para compartilhar (serve duas pessoas). André gosta de oferecer a possibilidade de vivenciar com mais alguém a mesma experiência gastronômica. Os acompanhamentos também são clássicos: purê de batata e alho-poró trufado e espinafre.

Muitos preparos são finalizados na brasa. André “surfa” na onda que ganha força neste momento em que a cozinha se volta para o rústico.

O restaurante tem como trunfo um forno a carvão, de onde saem, por exemplo, o magret do arroz caldoso de pato e o bacalhau servido com caramelo cítrico de pancetta e cebola. “Queremos colocar ainda mais coisas na brasa. Isso dá uma profundidade de sabor interessante.”

O sabor defumado é marcante em dois pratos com cogumelos, que são o ravioli de funghi com molho de queijo canastra (o mais vendido até agora) e o carpaccio de denver steak ao molho de mostarda dijon e grana padano.

Mil-folhas de batata com polvo, aioli de pimentão defumado e salsa picante (foto: Victor Schwaner/Divulgação)

Também está presente no aioli de pimentão que acompanha o delicado mil-folhas de batata com polvo e salsa picante, homenagem do chef à Espanha, onde trabalhou por seis anos.



Pratos emblemáticos da história do Bravo podem ser encontrados no menu do Restaurante do Palácio. Qual é a ideia? Apresentar a comida do bufê para quem não conhece e dar a oportunidade, para quem já conhece, de comê-la a qualquer hora, sem ser em eventos.

Alguns dos escolhidos são Caça às trufas (croquete de joelho de porco defumado e trufado) e Limoeiro (mousse de limão siciliano em casca de chocolate branco com recheio de geleia de limão e hortelã).

Também não poderia faltar o crocante em formato de jornal, que virou marca registrada. A massa de rolinho primavera, com escritos de tinta de lula, acompanha o steak tartare, nada comum, de filé-mignon angus curado com queijo e casca de laranja.

Borboletas no estômago

Outro dia, André de Melo ouviu a seguinte pergunta de um cliente: você que é o chef do palácio? Sim, ele respondeu, e logo refletiu sobre como esse “cargo” é grandioso e histórico.



Mousse de limão siciliano em casca de chocolate branco com recheio de geleia de limão e hortelã (foto: Victor Schwaner/Divulgação)

Por coincidência, o belo-horizontino estudou em um colégio nas proximidades e lembra-se de acompanhar, todos os dias, a movimentação dos seguranças em volta da residência. Mal dava para se aproximar do portão, quanto mais enxergar o que havia lá dentro.

“Hoje, sendo chef do palácio, é quase como receber o título de cidadão honorário de BH”, compara André, que ocupa a mesma cozinha onde eram preparadas as refeições para o governador.

O chef sabe da responsabilidade, mas se sente pronto para assumi-la. “O projeto chegou em momento que já temos vivência, conhecimento e expersite para abraçar uma causa de tamanha grandeza”, aponta. O bufê acaba de completar 11 anos e, como empresa, buscava novos desafios.

Não estamos falando apenas de ocupar, de forma inédita, o palácio. Para quem tinha como rotina fazer eventos, operar um restaurante traz emoções diferentes. O serviço é muito mais vivo e intenso, já que cada prato, cada mesa conta uma nova história e exige um esforço único para atender às expectativas.



“Os eventos também são um desafio, mas você sabe quantas pessoas, o que vão comer e o horário em que vão chegar. Em restaurante, todo dia é uma surpresa”, comenta o chef, que costuma circular pelo salão e interagir com os clientes.

André também valoriza a liberdade de pode incluir um novo prato, de um dia para o outro, no menu (e tudo bem se precisar volta atrás), o que não consegue no bufê.

Pessoalmente falando, o chef estava com vontade de voltar a sentir borboletas no estômago. Como estava há 11 anos na mesma função, a emoção em lidar com o novo quase não aparecia mais.

“Estou em plena idade produtiva, querendo abraçar o mundo, e o projeto vem de encontro a esse meu momento pessoal. Por isso, encarei. Se estivesse cansado, em fase criativa ruim ou com a 'casa' bagunçada, não poderia ou não conseguiria”, analisa.



Pastel de bobó de camarão com catupiri (foto: Victor Schwaner/Divulgação)

Mais do que tocar uma nova cozinha, o desafio é apresentar o Parque do Palácio como uma opção de lazer para os belo-horizontinos.

Além do restaurante, fazem parte do complexo o Café Magrí e a Margô Drinkeria. Juntos, eles querem aliar gastronomia a algo a mais, como música, moda, arte, design e arquitetura, para que os visitantes encontrem sempre uma nova diversão.

“Queremos que seja um parque de diversão para gente grande. Aqui temos uma mistura muito rica de arquitetura, natureza, vista para a Serra do Curral, pôr do sol, gastronomia”, enumera.

André adianta alguns planos. Um deles é lançar uma feijoada na área da piscina, com caipirinha e chorinho, para que vire um programa clássico de sábado aos pés da Serra do Curral.



Outra ideia é convidar chefs para assinar o menu por dois meses. Assim como um parque, ele entende que o restaurante deve ser um ambiente dinâmico e democrático, onde cabem várias gastronomias. O palácio também está de portas abertas para todo tipo de evento (já tem três casamentos agendados).

Pastel de bobó de camarão com catupiri

Ingredientes
400g de mandioca cozida; 250g de pimentão vermelho picado; 150g de cebola branca picada; 1⁄2 maço de coentro picado; 20g de gengibre ralado a gosto; 5g de pimenta dedo-de-moça picada sem as sementes; 2 folhas de louro; 40g de alho picado; 150g de tomate italiano picado; 50ml de azeite de dendê; 150ml de leite de coco; pimenta-do-reino a gosto; sal a gosto; 1kg de camarão cinza limpo; 500g de massa de pastel; 400g de catupiri; 500ml de óleo de soja

Modo de fazer
Bata a mandioca, deixando alguns pedaços. A intenção é que o creme não fique completamente liso. Tempere os camarões com sal e pimenta e refogue com o azeite de dendê em uma panela já aquecida. Retire os camarões e reserve. Na mesma panela, refogue os demais ingredientes. Acrescente a mandioca, o leite de coco e deixe ferver. Acerte o sal e a pimenta e acrescente os camarões. Reserve. Corte a massa de pastel no formato desejado e frite. Reserve. Em uma travessa ou tábua reta, coloque o bobó de camarão e, por cima, algumas porções de catupire. Finalize com a massa de pastel por cima do bobó. Decore com coentro picado ou brotos.

Serviço

Restaurante do Palácio
Rua Professor Djalma Guimarães, 157, Mangabeiras

(31) 99582-5610