Se tudo é jazz, tudo foi festa em Ouro Preto – onde há exatos 20 anos é realizado festival dedicado a esse gênero musical.
Cortejos com direito a fanfarra e bloco de carnaval alegraram as ladeiras da cidade, marcando a trilha sonora de momentos inesquecíveis para os noivos Ivan Alves Brandão Guilherme e Paula Moreira Mol, de Belo Horizonte.
O casamento deles, no final da tarde de sábado (6/8), teve de se “adaptar” às apresentações musicais realizadas no Largo do Rosário.
O que poderia ser um grande estresse para os noivos e os produtores do Festival Tudo é Jazz vai ficar na memória afetiva do casal.
Com o trânsito de carros proibido no Largo para permitir o acesso do público aos shows de Camila Rocha Quarteto, Felipe Continentino Trio, Thiago Espírito Santo e Sandro Haick, a noiva seguiu a pé até a Igreja Nossa Senhora do Rosário, por decisão da cerimonialista Luiza Nassau. E contou com o auxílio luxuoso do estilista Ronaldo Fraga, que participou da programação do festival, segurando o vestido dela.
Em frente à Igreja do Rosário, padrinhos e noivos puderam fazer fotos com direito a trilha sonora, durante o show do Felipe Continentino Trio no Tudo é Jazz.
Madeleine Peyroux homenageia Biiça
Muito mais do que grande festa a céu aberto, a vigésima edição do festival foi um momento de celebração e homenagens à trajetória da produtora cultural Maria Alice Martins, a Biiça, que criou o evento e morreu de COVID-19 em 2020.
“Obrigada por estarmos aqui juntos, nesta noite, no espírito de amor e música de Maria Alice Martins”, afirmou a cantora de jazz americana Madeleine Peyroux, em sua terceira participação no festival mineiro, no sábado.
O Tudo é Jazz foi também palco de protestos políticos. Gritos de “Fora Bolsonaro!” interromperam várias vezes o show de Ana Cañas, na Praça Tiradentes.
Em coletiva antes da apresentação, a cantora, cujo show é baseado no repertório de Belchior, disse que não faz militância política no palco, apesar da latência deste momento “fundamental” para a história do país, segundo ela.
“Estou fazendo militância em defesa da vida, da igualdade, pelas minorias políticas oprimidas, pelas mulheres. O discurso de Belchior está embutido em tudo isso. Não estou levantando bandeira partidária, embora todo mundo saiba que voto em Lula”, declarou.
Mais tarde, entre uma música e outra, Ana gritou “64 nunca mais!”, referência às ameaças à democracia que ocorrem no país.
A cantora reconheceu que em certo momento de sua vida ficou próxima da militância extrema e sofreu muito, incluindo ameaças de morte. Disse que por uma questão de saúde mental, passou a evitar essa postura.
“Hoje estou focada em cantar Belchior, que traz um posicionamento filosófico e existencial que compreende o coletivo do social e defende a equidade, a igualdade”, afirmou. Ela lembrou a entrevista dada pelo compositor cearense ao Pasquim, afirmando se considerar quase anarquista. “Ele dizia que a arte é maior do que a política”, relembrou.
No show, recortes das canções remeteram ao momento vivido pelo Brasil. “As plateias se expressam abertamente, vibram com a possibilidade de mudança, o que, na minha opinião, é fundamental para que a gente mude esse cenário que está muito triste, muito duro para a cultura e para a vida das pessoas”, afirmou Ana.
Jazz alegre da Happy Feet encerra a festa
Standards jazzísticos e dançantes que empolgaram os americanos nas décadas de 1930 a 1950 fecharam o festival no domingo (7/8), interpretados pelo grupo mineiro Happy Feet.
Ao final da apresentação, o vocalista e trompetista Marcelo Costa convidou o saxofonista Emiliano Garcia e o trombonista do Bloco Magnólia, Leo Brasilino, que havia feito cortejo pelas ladeiras ouro-pretanas, para subirem ao palco.
* O repórter viajou a Ouro Preto a convite do Festival Tudo é Jazz