Jornal Estado de Minas

CINEMA

Dê boas risadas com o multiverso de "Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo"


Multiverso: esta é a palavra do momento nos blockbusters hollywoodianos. O complicado conceito, relacionado a hipotéticos universos paralelos possíveis, inspira “Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo”, longa da produtora independente A24 em cartaz em salas de BH.





O título longo e pouco convencional resume perfeitamente o clima do filme. São 140 minutos de muita informação, detalhes minuciosos, situações absurdas e hilariantes, além de efeitos visuais deslumbrantes.
 
A cada cena, somos apresentados a um novo conceito, um novo cenário ou a uma nova possibilidade. Entrar na sala de cinema sabendo o mínimo possível deixa toda a experiência mais intensa. Portanto, vai o aviso: nesta matéria há spoilers.

Chama a atenção a simplicidade do roteiro, que segue a clássica estrutura começo, meio e fim, acompanhando a personagem principal em sua jornada.
 
Veja trailer da saga interdimensional da chinesa Evelyn:
 

 

Viagem

De forma elegante e didática, o enredo apresenta as regras do multiverso e da viagem interdimensional – provavelmente, a parte da história mais difícil de contar.





Em entrevista à plataforma Vulture, os diretores Daniel Kwan e Daniel Scheinert, que se autodenominam “Os Daniels”, revelaram ter começado a desenvolver a história em 2010. Enquanto produziam o longa, foram lançados a série “Ricky e Morty” (2013) e o filme “Homem-Aranha: no aranhaverso” (2018), que exploram o conceito de multiverso.

“Ficamos um pouco chateados, porque percebemos que, ah, merda, todo mundo vai nos vencer nesse projeto no qual estamos trabalhando”, disse Daniel Kwan. Realmente, se o filme tivesse sido lançado há cinco anos, seria uma referência de ficção de universos paralelos.

“Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo”, o TTLMT, pode parecer cópia dos antecessores. Mas a forma de abordar o tema o torna único. Nesta era de continuações, franquias e adaptações, é ótimo assistir a um filme original, com cara de blockbuster.





Nele, tudo é possível. Os Daniels elevam o absurdo ao máximo. Quem se desapontou com “Doutor Estranho no multiverso da loucura” (2022) poderá ter outra experiência agora.

O mote não é tão complicado quanto parece: o nosso universo é apenas um entre os infinitos planos que compõem o multiverso. Vamos ao enredo: a inesquecível Michelle Yeoh de “O tigre e o dragão” (2000) interpreta Evelyn Wang, chinesa que se mudou jovem para os Estados Unidos com o marido em busca do sonho americano de prosperidade.

Dona de lavanderia, ela tenta seguir com seu negócio em meio a complicações financeiras e à família nada funcional, de seu ponto de vista.

Chamada à Receita Federal para se explicar, uma ruptura dimensional traz algo improvável: a versão alternativa de seu marido Waymond. Vindo do Universo Alfa, ele diz a Evelyn que só ela é capaz de pôr fim a um terrível mal que ameaça destruir o multiverso.
 
Stephanie Hsu interpreta o vilão Jobu Tupaki, versão alternativa de Joy, a jovem rebelde e lésbica (foto: A24/reprodução)
 

Sai Chan, entra Michelle

Segundo os diretores, o papel foi originalmente escrito para Jackie Chan. Mas, durante a produção, decidiu-se readaptá-lo para uma mulher. Michelle Yeoh foi a escolhida.





Depois de 20 anos longe das telas, Ke Huy Quan volta como o adorável e ingênuo marido de Evelyn, Waymond. Quem cresceu nos anos 1980 vai se lembrar dele como Short Round, o jovem fiel escudeiro de Indiana Jones, em “O templo da perdição” (1984), e como Data, em “Os Goonies” (1985).

Stephanie Hsu é Joy, a filha rebelde de Evelyn e Waymond. A relação entre as duas é o foco do enredo: a mãe tem dificuldade em aceitar a homossexualidade da filha e de conviver com a namorada dela, Becky (Tallie Medel).

O ator veterano James Hong interpreta Gong Gong, pai de Evelyn, que vem da China visitar a sua família. E, claro, a relação dos dois não é das melhores desde que ela decidiu se mudar para os Estados Unidos.



Jamie Lee Curtis está quase irreconhecível no papel da burocrata do "Leão" americano (foto: A24/reprodução)


Por último, mas não menos importante, Jamie Lee Curtis faz o papel de Deirdre, a inspetora da Receita Federal com a qual Evelyn e família têm de lidar.

Ke Huy Quan, Stephanie Hsu, James Hong e Jamie Lee Curtis interpretam as versões alternativas de seus personagens, que “saltam” do Universo Alfa para o de Evelyn. O elenco se dá bem nesta multimissão.

Prepare-se para chorar de rir do início ao fim. As cenas de ação são “tarantinescas”, hipercoreografadas, sem a menor intenção de fazer sentido no nosso mundo real. Até conceitos científicos entram na brincadeira: o buraco negro assume a forma de rosquinha.




Imigração e niilismo

Apesar do humor, o foco do filme é a condição humana. A questão da imigração, o sentimento de dúvida e incerteza são bem trabalhados no casal de protagonistas; o niilismo cada vez mais presente nas novas gerações assume forma em Joy; e o confronto entre tradição e modernidade passa por Gong Gong.

TTLMT é história humana: a mãe tentando encontrar a melhor versão de si mesma e o melhor para sua família. Não é sobre os Vingadores tentando salvar o mundo. Nem é sobre Darth Vader e Luke Skywalker em luta pelo destino da galáxia. Mas um dilema humano que, por acaso, precisou de pequenas viagens interdimensionais para ser solucionado

“TUDO EM TODO O LUGAR AO MESMO TEMPO”
EUA, 2022. 140min. Direção: Daniel Kwan e Daniel Scheinert. Com Michelle Yeoh, Stephanie Hsu, Ke Huy Quan, James Hong e Jamie Lee Curtis. Em cartaz nas salas das redes Cineart e Cinemark.

* Estagiário sob supervisão da editora-assistente Ângela Faria