Jornal Estado de Minas

CINEMA

CineOP vai destacar filmes realizados por indígenas brasileiros


Recentemente, uma equipe da Universo Produção passou três meses trabalhando no levantamento da criação audiovisual indígena. A ideia era fazer uma pesquisa histórica, das primeiras experiências com a câmera até os dias atuais. Sem banco de dados que reunisse toda a produção, que está espalhada pelo país, tal investigação foi realizada para verificar a viabilidade da exibição de número representativo de obras.





Nesta quarta-feira (22/6), a CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto dá início a sua 17ª edição. Até a próxima segunda (27/6), serão exibidos 151 filmes, entre curtas, médias e longas-metragens. Trinta e cinco foram realizados por indígenas pertencentes a 17 nações.

EIXOS

A partir do tema “Preservar, transformar, persistir”, a CineOP coloca o cinema indígena no norte da discussão em torno de seus três eixos: histórico, preservação e educação.
 
“O que representa o cinema para os indígenas? Memória e transmissão, pois eles, ao mesmo tempo em que fazem registros para passar para outras gerações, estão sempre transmitindo alguma coisa”, comenta Raquel Hallak, organizadora do evento.



"Abdze Wedeo - O vírus tem cura", de Divino Tserewahu, sobre a pandemia na aldeia Sangradouro, no Mato Grosso (foto: Universo Produção/divulgação )

 
A mostra também vai discutir acervos de outros grupos considerados minorias: LGBTQIA+, negros, imigrantes, comunidades periféricas. E ainda trabalhará, a partir da questão indígena, a relação do cinema com educações, no plural mesmo.
 
“A ideia é mostrar que não existe um só cinema, uma só educação”, explica Raquel, dizendo que esta edição da CineOP “será inovadora dentro da história do cinema brasileiro.”
 
Vários filmes têm como diretores M’byas Guaranis Kuaray (Ariel Ortega) e Pará Yxapy (Patrícia Ferreira), cineastas homenageados em Ouro Preto. Na abertura oficial, na quinta-feira (23/6), serão exibidos os documentários “Bicicletas de Nhanderú” (2011), direção conjunta da dupla, e “Nossos espíritos seguem chegando – Nhe’e Kuery Jogueru Teri” (2021), codirigido por Ariel com Bruno Huyer.



PRESENCIAL

Depois de três anos, a CineOP volta a ser presencial. Mas a experiência adquirida durante as edições de 2020 e 2021, exclusivamente remotas em decorrência da pandemia, não será deixada de lado. O evento híbrido terá parte da programação em Ouro Preto e outra on-line.
 
As sessões ocorrerão na Praça Tiradentes, num cinema para 600 pessoas, e no Cine-Teatro (para 510 espectadores), no Centro de Convenções, que vai abrigar ainda a programação de debates, encontros, oficinas, masterclasses.
 
Como estamos na semana de São João, no domingo haverá festa junina no mesmo local, com a venda das barraquinhas totalmente revertida para instituições sociais de Ouro Preto.
 
O formato híbrido é complementar. “O evento é todo presencial, algumas ações pontuais serão on-line. Isso foi pensado pela curadoria. Alguns títulos têm perfil para o presencial, para serem exibidos na praça, por exemplo. A maioria mesmo (disponibilizada na plataforma do evento) é de outros títulos”, continua Raquel Hallak.




 
O modelo fez com que a mostra crescesse – os filmes selecionados são de oito países e os nacionais, de 21 estados. “Para a gente, parece um festival de 15 dias, mas são seis dias de evento. Com o formato on-line, ganhamos outro espaço de exibição”, diz a organizadora.
 
Segundo Raquel, a experiência remota dos anos anteriores fez com que o público aumentasse. “Foram mais de 90 países acessando a programação, então a ideia é manter a fidelidade desse público.”
 
Mesmo assim, o presencial continua sendo prioritário. “É muito importante o formato, porque festival permite troca de informações, encontro das pessoas e gera fluxo turístico para a cidade, estimulando a economia criativa. Sempre vamos primar por levar para o presencial o que é imperdível, como os filmes em pré-estreia”, diz Raquel.



"Belchior - Apenas um coração selvagem", de Natalia Dias e Camilo Cavalcanti, terá sessão de pré-estreia em Ouro Preto (foto: Universo Produção/divulgação )

STREAMING

A explosão do streaming, que mudou a forma como o público consome cinema, afeta toda a cadeia, observa a produtora mineira.

“Tem realizadores batendo nisso, nessa coisa de ‘guardar’ o filme para estrear nas salas. Não adianta ficar pensando que esta é a única estratégia para chegar ao público. O papel do festival vai ser preponderante neste cenário. O público não irá mais só para ver o filme, mas pela experiência”, afirma.
 
A CineOP é o primeiro evento presencial que a Universo Produção realiza desde março de 2020. Desde então, todas as edições desta e das demais mostras (de Tiradentes, em janeiro, e de Belo Horizonte, entre setembro e outubro) foram remotas. De acordo com Raquel Hallak, as próximas edições desses eventos seguirão o modelo da CineOP.




 
“A gente se acostuma muito rápido com as mudanças, mas o formato está representando um desafio em todos os sentidos. Requer muito planejamento e expectativa. O retorno ao presencial reforça a nossa missão de ser um espaço coletivo de transmissão. Também mostra a força da nossa cultura no momento em que precisamos fortalecer as ações e a importância do nosso patrimônio, pois sem memória, sem imagem, não existimos”, finaliza.

17ª CINEOP – MOSTRA DE CINEMA DE OURO PRETO

De quarta (22/6) a segunda-feira (27/6), com eventos presenciais em Ouro Preto e transmissões on-line. Toda a programação é gratuita. Horários e sessões estão disponíveis no site www.cineop.com.br
 
"História da Guerra Civil" registra momento histórico da Rússia (foto: Universo Produção/divulgação )
 

Resgate da Revolução Russa


Como evento que trata, desde sua fundação, da memória do audiovisual, a CineOP vai destacar filmes que passaram por recente processo de restauração. Entre eles está o documentário russo “História da Guerra Civil” (1921), que terá sessão especial no domingo (26/6), às 20h, no Cine-Teatro.




 
Entre 1918 e 1921, o cineasta Dziga Vertov (1896-1954), junto a um grupo de cinegrafistas, partiu para o front de combate entre o governo bolchevique, alçado ao poder com a Revolução de 1917, e seus opositores, boa parte deles apoiadores do regime czarista. O longa de 90 minutos traz imagens de figuras históricas, como Leon Trotski (1879-1940).
 
Lançado no 3º Congresso da Internacional Comunista, realizado em 1921, o filme cobre a Guerra Civil na Rússia em 12 partes. Passado tanto tempo, era considerado perdido, até que o historiador de cinema Nikolai Izvolov tomou para si a tarefa de restaurá-lo.
 
O trabalho consumiu quase dois anos e seguiu as indicações deixadas pelo cineasta Grigory Boltyansky (1885-1953). O longa ganhou trilha produzida pela Anvil Orchestra, formação especializada em trabalhar com filmes mudos.