Jornal Estado de Minas

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Documentário de Silvio Tendler defende a eficácia do SUS


“Saúde tem cura”, documentário do diretor Silvio Tendler, defende a importância do Sistema Único de Saúde (SUS), o único no mundo que atende a 190 milhões de pessoas gratuitamente. É o maior programa público de transplantes de órgãos do planeta, financiando 95% dos procedimentos no Brasil.





O médico Drauzio Varella, um dos entrevistados, afirma que o grande problema dos 20% da população que conta com plano de saúde é acreditar que não necessita do SUS.

“O ideal de qualquer pessoa da classe média é fazer um convênio. Quando isso ocorre, por mais barato que seja o valor do plano, ela pensa que nunca mais colocará os pés no SUS. Porém, estamos vendo agora que a situação é diferente. Em várias cidades brasileiras, os leitos particulares foram esgotados e foi o sistema público que atendeu muitos cidadãos, ficando evidente a importância do SUS”, defende.

VACINAS 

Anualmente, o SUS vacina 10 milhões de crianças contra a poliomielite em apenas um dia. O sistema disponibiliza 300 milhões de doses gratuitamente à população.

“Em países desenvolvidos, o governo apoia parte dos programas de vacinação nacional, mas a outra parte é da iniciativa privada, como os seguros. No Brasil, é gratuito para todos”, destaca Akira Homma, ex-presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).





Filmado durante a pandemia de COVID-19 e produzido com apoio da Fiocruz, o documentário entrevistou usuários, profissionais da saúde e representantes da sociedade civil.

A modelo e atriz Tarcinara Vieira conta que se curou da tuberculose graças ao SUS. “Consegui todos os remédios necessários e nenhum faltou durante os seis meses do tratamento. Se o SUS não existisse, eu não estaria aqui, porque eu e minha mãe estávamos desempregadas e não teríamos condições de arcar com os remédios.”

O longa-metragem mostra o desamparo histórico da população em termos de saúde pública. No final do século 19, o tratamento de doenças se dava por meio de favores ou de instituições de caridade. Na década de 1920, trabalhadores com carteira assinada e contribuintes para a previdência passaram a ter acesso ao sistema de proteção social.

Em 1963, no governo João Goulart, durante a 3ª Conferência Nacional de Saúde, discutiu-se a criação do sistema unificado. “Foi a primeira vez que se falou sobre municipalização, saúde como direito. A medicina previdenciária caminhava para um lado e o sistema público caminhava para outro”, comenta a médica Ligia Bahia, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).




GOVERNO MILITAR 

A ditadura militar, a partir de 1964, financiou empresários do setor de saúde para construir hospitais com o objetivo de comprar esses serviços, via previdência. “Ao final do regime militar, denúncias de fraudes eram intensas”, diz Ligia.

O processo de redemocratização levou à implementação do SUS, garantindo saúde como direito de todos e dever do Estado, conforme determina a Constituição de 1988.

A implantação do sistema nunca seguiu a lei à risca. Fragilidades ficaram ainda mais evidentes durante a pandemia da COVID-19. “Começa pela necessidade de ter base de financiamento e apoio político. É o maior sistema público universal com a menor proporção de financiamento público do mundo. Nenhum sistema público mundial tem financiamento menor que 70%. No Brasil, ele corresponde a 45% do gasto total com saúde”, explica Carlos Gadelha, doutor em economia.

Apesar disso, o SUS, por meio de pesquisa, atendimento, programas de prevenção, campanhas de vacinação e distribuição de remédios, fornece acesso a tratamentos oncológicos, sessões de hemodiálise, cirurgias de grande porte, implantes e internações em Unidades de Terapia Intensiva (UTI), por exemplo.





“No hospital universitário onde trabalho, construímos uma UTI em 20 dias, com recurso 100% SUS. Vejo um SUS que resiste muito. Com todas as suas fraquezas, lacunas e falhas, tem uma potencialidade enorme. Sem sombra de dúvida, é o maior patrimônio que o povo brasileiro tem nas mãos”, afirma Pedro Carvalho Diz, membro da Rede Nacional de Médicos e Médicas Populares.

VILÃO 

“Geralmente, vemos somente fotos dos corredores lotados, de pessoas que morreram na fila de espera, de pessoas que não conseguiram um exame. Muitas vezes, o SUS se resume a hospital e fila do corredor. Na verdade, querem esquecer que o SUS é muito maior. Existe uma grande política e discurso que o invalidam e o personificam como um grande vilão”, ressalta o médico Pedro Carvalho.

Nadine Clausel, diretora-presidente do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, defende que o Estado assegure recursos para o sistema.

“Com a perda de emprego e renda, as pessoas não conseguiram mais pagar os convênios e, consequentemente, o SUS acabou abarcando um contingente ainda maior de dependentes. O sistema público de saúde deveria ser uma política de Estado com orçamentação protegida, independentemente de quem esteja no governo”, afirma.
 
* Estagiário sob supervisão da editora-assistente Ângela Faria

“SAÚDE TEM CURA”

Documentário de Silvio Tendler. 95m. Disponível no canal da Caliban Cinema no YouTube.