Jornal Estado de Minas

TEATRO

Galpão Cine Horto retoma a 'Mostra de monólogos', interrompida pela COVID


A percepção de que havia crescente produção de montagens com a presença de um único ator em cena, no período de 2017 e 2018, levou o Galpão Cine Horto a criar a sua “Mostra de monólogos”. Interrompido em 2019, devido à pandemia, o evento será retomado a partir desta sexta-feira (18/3), com quatro cenas curtas criadas por alunos ou recém-formados nos cursos do centro cultural, além dos espetáculos convidados “Órfãs de dinheiro”, de Inês Peixoto, e “Danação”, de Eduardo Moreira, atores do Grupo Galpão.





A terceira edição da mostra integra a programação de retomada das atividades presenciais do centro cultural. Coordenador-geral do Galpão Cine Horto, Chico Pelúcio espera resgatar a força que o formato vinha demonstrando na cena de Belo Horizonte nos anos pré-COVID-19.

AGENDA LOTADA

“Havia um volume grande de produção de monólogos na cidade, de atores profissionais e não profissionais. A gente chegou a montar programação que ocupou a agenda do Galpão Cine Horto quase durante o ano todo, com apresentações às sextas, sábados e domingos, na Sala Solo”, diz. Ele se refere ao espaço mais intimista do centro cultural, criado entre 2017 e 2018 para atender à demanda, que abrigou as duas primeiras edições da “Mostra de monólogos”.

“Naquele momento, nossos alunos começaram a demonstrar a necessidade de criar nesse formato e falar as coisas que tinham para falar. Então pensamos na mostra, que se encaixa na esfera da experiência pedagógica e ao mesmo tempo promove a abertura de espaço para dar voz a esses jovens”, diz o ator e gestor.





Uma novidade da terceira edição é o fato de migrar da Sala Solo para o Teatro Wanda Fernandes, palco principal do centro cultural, que funcionará com capacidade de público reduzida pela metade, devido aos protocolos sanitários.

Letícia Leiva em ''chamarei de qualquer coisa'', cena em cartaz neste final de semana (foto: Marcia Charnizon/divulgação)
As quatro cenas curtas, em cartaz neste e no próximo fim de semana, são “Viagem”, com Dhan Lopes; “Chamarei de qualquer coisa”, com Letícia Leiva; “Adotivo”, com Calil Rodrigo; e “Clausuras”, com Gisele Hostalácio.

Pelúcio explica que a participação na mostra se dá por meio de inscrição. Como é interesse pedagógico do Galpão Cine Horto que alunos criem e exponham trabalhos, geralmente todos os inscritos são aprovados, sem necessidade de processo seletivo.





“A gente tinha mais alunos e ex-alunos inscritos para a terceira edição, que deveria ter acontecido em 2020, mas com a pandemia restaram só esses”, diz.

A concepção dos monólogos fica totalmente a cargo dos proponentes, sem direcionamento por parte dos professores. “Eles fazem o que bem entendem. Depois de escolher temas, começam a trabalhar. Alguns têm orientação de professores, mas só à medida que precisam ou desejam”, destaca.

JUVENTUDE

Pelúcio ainda não assistiu aos trabalhos que serão apresentados este ano, mas observa que as outras duas edições do evento podem nortear o que o público verá. As produções giram em torno de temas ligados aos jovens, explorando angústias próprias dessa faixa etária.


“É muito legal ver a energia em torno de perguntas, dúvidas e questionamentos próprios da adolescência e da juventude, o que, acredito, faz bem para quem cria e para quem assiste”, diz o ator e diretor. Ele espera que a retomada da mostra anime os alunos do Galpão Cine Horto, permitindo a volta ao caminho que vinha sendo trilhado antes da chegada da crise de saúde.





Além de estrelar o solo ''Viagem'', Dhan Lopes assina direção e dramaturgia da peça (foto: Renatto Mendez/divulgação)
“A expectativa era de que a terceira edição fosse de consolidação do festival, mas naquele momento, em 2020, ela teve de ser abortada por causa da pandemia. Estamos retomando agora, em outro cenário. A gente não quis deixar de fazer, até para comemorar a volta do presencial, brindar os atores e o público com o festival. É uma forma de resiliência, para, quem sabe, em 2023, a gente fazer mostra bem maior e mais representativa”, aponta.

CONVIDADOS

Novidade em relação às edições anteriores é a presença dos espetáculos convidados. Diferentemente das cenas curtas apresentadas por alunos e ex-alunos, elas têm longa duração. O monólogo que Inês Peixoto leva ao palco do Teatro Wanda Fernandes nesta sexta-feira (18/3), às 20h, dá a largada na programação de 2022.

“A gente está convidando espetáculos profissionais para possibilitar a troca com os alunos e com o público, além de abrir espaço para os monólogos, de forma geral, pois eles têm pouca vitrine. A proposta passa também pelo desejo de manter o diálogo com o Galpão, com os atores do grupo que estão produzindo seus monólogos”, explica Chico Pelúcio.




 
Inês Peixoto em ''Órfãs de dinheiro'', primeiro espetáculo solo autoral da atriz do Grupo Galpão (foto: Nereu Jr/divulgação)

Mulheres inspiram ''Órfãs do dinheiro''

Responsável pela concepção, texto e figurino do espetáculo, Inês Peixoto tem com “Órfãs do dinheiro” sua primeira experiência em projeto solo autoral e independente, após quase 40 anos de carreira, 30 deles como integrante do Grupo Galpão.

O monólogo estreou em agosto de 2019, fez parte da Campanha de Popularização do Teatro e Dança de 2020, mas saiu de circulação devido à chegada da COVID-19.

“Fiz algumas experimentações on-line durante a pandemia, mas a verdade é que ele foi muito pouco visto presencialmente, por causa dessa contingência. Voltei ao presencial este ano, na 'Mostra de Teatro Walmor Chagas', em São José dos Campos, sob o tema ‘Mulheres que inspiram’, voltada para solos femininos. Agora retorno a Belo Horizonte, muito feliz por poder abrir a ‘Mostra de monólogos’ no Galpão Cine Horto. Esse espaço, que é nosso, também conseguiu se manter apesar da pandemia”, destaca a atriz.

CANOA METAFÓRICA

O palco conta apenas com uma canoa, símbolo de uma travessia que deve ser realizada. Inês dá vida a três mulheres em diferentes situações de vulnerabilidade, decorrentes da impossibilidade de prover o próprio sustento. A direção é assinada por Eduardo Moreira.





Inês conta que já alimentava, há algum tempo, o desejo de fazer um trabalho solo sobre histórias de mulheres. A atriz passou um período anotando ideias a partir da literatura e do cinema, além de casos e histórias que ouvia de sua família e de pessoas próximas.

“Tinha a imagem da canoa na minha cabeça, queria fazer o espetáculo dentro de uma canoa. Não sei bem explicar essa imagem, ela me veio muito forte, mas não conseguia juntar as coisas”, revela. O insight surgiu com a leitura de “Modernismo localista das Américas”, de Paulo da Luz Moreira, que analisa as obras de William Faulkner, Guimarães Rosa e Juan Rulfo.

“O capítulo ‘Órfãs do dinheiro’ traz textos de cada autor falando de mulheres em situações de vulnerabilidade muito fortes. Quando li, falei para o Paulo que aquele capítulo conseguiu dar um norte para o monólogo e pedi para usar o título. Não usaria as histórias que o livro trazia, evidentemente, mas aquela situação básica na vida de uma mulher de quando lhe tiram a capacidade de seguir o seu caminho”, detalha.





Inês criou três situações a partir de suas anotações. “A canoa serve de chão nos três momentos, que trazem três personagens completamente diferentes. Foi um desafio encontrá-las nesse momento de travessia. Escrevi para mim a prosódia que existe nas três histórias, que eu, como mulher e artista, acho muito simbólicas”, destaca.

No início de 2019, a atriz estava gravando a novela “O sétimo guardião”, da Rede Globo. Passou um bom tempo hospedada em hotel e aproveitava para desenvolver a dramaturgia de “Órfãs de dinheiro”.

“Foi um processo muito orgânico, tanto de escrita quanto de concepção. Convidei o Eduardo (Moreira) para ser o olhar de fora, fazer a direção e me ajudar, porque queria algo muito simples mesmo. Tenho muito prazer em dizer sobre as mulheres. Tem a ver com botar para fora algo que o aflige, através da ludicidade do teatro, da possibilidade de exercitar a criatividade e a indignação ao mesmo tempo”, ressalta.



Por sua vez, o ator Eduardo Moreira ocupará o palco do Teatro Wanda Fernandes, no próximo dia 25, com o monólogo “Danação”, dirigido por Marcelo Castro e Mariana Maioline, com dramaturgia de Raysner de Paula.
    
No espetáculo solo, homem narra as memórias do tempo passado por ele dentro do coração de uma mulher, onde conviveu com menina que se escondia da morte. 

Calil Rodrigo apresentará o monólogo ''Adotivo'' em 26 e 27 de março (foto: Tiago Carneiro/divulgação)

“MOSTRA DE MONÓLOGOS”

» HOJE (18/3)
20h: “Órfãs de dinheiro”. Com Inês Peixoto

» SÁBADO E DOMINGO (19/3 e 20/3)
20h: “Viagem”, com Dhan Lopes, e “Chamarei de qualquer coisa”, com Letícia Leiva

» 25/3
20h: “Danação”, com Eduardo Moreira

» 26/3 e 27/3
20h: “Adotivo”, com Calil Rodrigo, e “Clausuras”, com Gisele Hostalácio

. Promoção do Galpão Cine Horto. Teatro Wanda Fernandes (Rua Pitangui, 3.613, Horto). Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada)