Jornal Estado de Minas

MÚSICA

Filarmônica de MG encerra 2021 com a obra que concluiria a temporada 2020

Composta por Beethoven (1770-1827), entre 1822 e 1824, a “Nona Sinfonia”, que estreou em Viena, em maio de 1824, não é somente uma das peças mais conhecidas do repertório clássico. Uma das primeiras sinfonias a ter canto, a obra-prima do compositor alemão tornou-se símbolo das aspirações de igualdade e justiça, dada a inclusão, no quarto movimento, do poema “Ode à alegria” (1785), de Schiller (1759-1805).





Muito executada mundo afora, no período natalino, a “Nona” encerraria, em 2020, a temporada da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais. No ano passado, vale lembrar, a orquestra dedicou boa parte de sua programação a Beethoven , numa homenagem aos 250 anos de seu nascimento. O que não foi possível executar no ano passado, em decorrência da pandemia, vai finalmente ocorrer agora. E como se deve: com casa cheia, convidados e a orquestra em sua plenitude.

Desta quinta-feira (16/12) a sábado (18/12), a Filarmônica apresenta, na Sala Minas Gerais, a “Nona”, com regência de Fabio Mechetti, os solistas Marly Montoni, Ana Lucia Benedetti, Fernando Portari e Savio Sperandio e o coral Concentus Musicum de Belo Horizonte, sob a regência de Iara Fricke Matte.

Não era o programa original. Como 2021 marcou o cinquentenário de morte de Stravinsky (1882-1971), a intenção era encerrar o ano com os três balés escritos pelo compositor russo. No entanto, o mais conhecido deles, “A sagração da primavera”, demanda uma orquestra com mais de uma centena de músicos no palco. Então, houve essa impossibilidade. Dessa maneira, as três noites terão início com outro balé de Stravinsky, “O pássaro de fogo” e terminarão com a “Nona”.





O coral Concentus Musicum se apresentará na Sala Minas Gerais com distanciamento entre seus integrantes (foto: Fabricio Halsmann/Divulgacao)

SEGUNDA DOSE

Adaptação é algo que a Filarmônica e seu regente e diretor artístico têm feito incessantemente, desde que a crise sanitária foi declarada, em março de 2020. Com todos os integrantes e convidados já vacinados com a segunda dose, a única modificação que foi feita para a execução da obra máxima de Be-        ethoven foi um espaçamento maior entre os integrantes do coral.

“O coro, de 62 vozes, vai ficar espalhado em um espaço de 160 cadeiras. Haverá uma cadeira entre cada um deles e uma fila entre cada uma delas. Do ponto de vista acústico não é o ideal, mas é a maneira mais segura que encontramos para a segurança dos cantores”, diz Mechetti. Já a orquestra estará com pouco mais de 70 instrumentistas em cena. Não é a totalidade da Filarmônica (que conta com 90 músicos), mas é a quantidade que a “Nona” demanda.

Os quatro solistas convidados seriam os mesmos de 2020. E o retorno aos palcos, ainda mais com a “Nona”, é motivo de comemoração. Baixo-barítono, Savio Sperandio comenta que, na música clássica, foram os cantores os que mais sofreram com a pandemia. “Quando a gente canta, sai uma nuvem de saliva. Isto acabou nos deixando limitados. Para se ter uma ideia, voltei a trabalhar somente em julho.”





(foto: Fabricio Halsmann/Divulgação)


MÁSCARA

E ainda que agora os quatro solistas se exibirão sem máscaras (que só serão retiradas na hora em que cada um canta), mas com bastante espaçamento, Sperandio comenta que, nos primeiros meses, teve que se apresentar com a proteção. “O cantor lírico não usa microfone, então (com a máscara) há uma perda da qualidade de som. O mais difícil, no entanto, foi inspirar, pois quando fazemos isso a máscara vai na garganta”, acrescenta.

Posteriormente, Sperandio relembra, foi criado um adaptador de máscara, que, segundo ele, facilitou a vida de quem atua como cantor lírico. Mas somente a vacinação os liberou. Para ele, voltar a se apresentar com a Filarmônica executando a “Nona” é motivo de muita honra. “A sinfonia traz sempre uma mensagem de esperança, paz, união e respeito mútuo. Lá atrás, quando comecei a carreira, foi uma mensagem que serviu muito a mim. E hoje, depois de tanta gente que perdeu familiares, ela traz uma mensagem de consolo.”

A soprano Marly Montony voltou aos palcos também neste semestre – e uma de suas primeiras apresentações foi no início de setembro, quando interpretou Mozart, na Sala Minas Gerais. “Para mim, interpretar a ‘Nona’ neste momento tem uma emoção maior. Foi um ano bem difícil em vários aspectos, e poder cantar esse texto incrível é uma forma de abraçar e beijar, musicalmente, cada pessoa.”





Desde o início deste mês, com a flexibilização dos protocolos sanitários em consonância com o arrefecimento da pandemia, a Sala Minas Gerais pode receber o público em sua totalidade (1.493 lugares). Mas durante um ano e oito meses foram sucessivas adaptações. Parada entre março e junho de 2020, época em que houve inclusive cortes salariais, a orquestra vem trabalhando, sem parar, desde então.

Já houve várias fases. Quando autorizada a voltar às atividades, ainda no ano passado, a Filarmônica passou a fazer concertos com pequenas formações e sem a presença de plateia. Somente em novembro de 2020, o público pôde voltar a frequentar a Sala Minas Gerais – mesmo assim, com somente 30% da capacidade. Os concertos presenciais foram até dezembro. No início deste ano, depois de apenas duas apresentações, uma vez iniciada a temporada 2021, em março, novo fechamento.

(foto: Helio Sperandio/Divulgação)


VOLTA GRADATIVA

Em julho, a casa voltou a contar com plateia e, ao longo dos últimos meses, a autorização para ocupação foi sendo estendida – de 30% para 50% da sala, até chegar aos 100%. Paralelamente ao público, a orquestra, mediante o avanço da vacinação, foi crescendo em cena, até chegar próximo à sua totalidade, como veremos nesta semana – o ano de 2021 termina com 71 concertos e 43 transmissões ao vivo, via YouTube.





“Nossa vida não tem sido fácil em vários aspectos. Mas seguimos a ciência e tanto em relação ao número de músicos quanto ao de pessoas na plateia, só aumentamos quando encontramos as condições. Reaprendemos a tocar com um espaçamento (entre os instrumentistas) grande, biombos de acrílico e cada um com sua partitura”, afirma Mechetti. 

O maestro observa que a vacinação trouxe “um conforto” para as pessoas. “Mas acho que ainda exista uma resistência grande. Mesmo agora, com nossa capacidade total, não temos tido na plateia a presença que tínhamos, embora nesta semana estejamos com quase todos os ingressos vendidos. Acho que as pessoas estão voltando a ter confiança em comparecer.” 

Acreditando que o pior já passou, o regente e diretor artístico encerra o ano de olho no próximo. Após os três concertos desta semana, a Filarmônica entra em férias. O grupo retorna às atividades no final de janeiro, para gravar obras compostas por Dom Pedro I – as gravações, que remetem ao bicentenário da Independência, serão lançadas pelo selo Naxos. 

Já em 10 e 11 de fevereiro de 2022, a orquestra inicia a nova temporada, com obras de autores brasileiros, em homenagem ao centenário da Semana de Arte Moderna de 1922. A expectativa é que o reencontro da Filarmônica com seu público se intensifique no novo ano. “Nosso negócio é a aproximação social, não o distanciamento”, diz Mechetti.





ORQUESTRA FILARMÔNICA DE MINAS GERAIS

No programa, “O pássaro de fogo”, de Stravinsky, e a “Nona Sinfonia”, de Beethoven. Nesta quinta (16/12) e sexta (17h12), às 20h30, e sábado (18/12), às 18h, na Sala Minas Gerais, Rua Tenente Brito Melo, 1.090, Barro Preto, (31) 3219-9000. Ingressos: de R$ 50 (inteira, mezanino) a R$ 155 (inteira, camarote). À venda no local e no site da Filarmônica. A apresentação desta quinta será transmitida pelo canal do YouTube da Filarmônica.

HOMENAGEM A ARAXÁ

Neste domingo (19/12), a Filarmônica faz um concerto on-line em homenagem aos 156 anos da cidade de Araxá. Gravada em julho passado, em Inhotim, a apresentação, realizada em parceria com a CBMM, traz no repertório Beethoven, Rossini e Strauss, além dos brasileiros Alberto Nepomuceno, Cyro Pereira e Zequinha de Abreu. A regência é de José Soares. O concerto será transmitido às 11h, no canal da Filarmônica do YouTube, neste link.