Jornal Estado de Minas

MÚSICA

'Meridiana' revela a percussionista Naroca como cantora e compositora

Após 12 anos de carreira como percussionista, a mineira Nara Torres, mais conhecida como Naroca, se revela como cantora e compositora. Já está nas plataformas digitais o álbum “Meridiana” (Tratore), com 11 faixas autorais – entre elas, parcerias com Rafael Fantini (produtor do disco) e Rafael Fares.





A pandemia “provocou” a percussionista a, finalmente, se dedicar ao projeto solo. “Foi como um espelho que apareceu na minha frente”, comenta Naroca, dizendo que isso é fruto da paralisação total de eventos coletivos, festivos e realizados na rua dos quais participava. “O encontro com o Rafa (Fantini) me proporcionou as ferramentas, os instrumentos e o apoio para tirar as músicas do papel.”

LÔ BORGES

Instrumentista desde 2008, Naroca está entre os criadores do bloco Chama o Síndico e da Fanfarra Feminina Sagrada Profana, integrou as bandas Trovão das Minas e Baque de Minas, trabalhou com os grupos Frito na Hora, Iconili e Orquestra Atípica de Lhamas. Recentemente, contribuiu com sua percussão para o último disco de Lô Borges.

O álbum “Meridiana” foi surgindo do resgate de “caderninhos e gravações”, conta ela. “Há canções compostas há mais tempo, mas também cheguei a compor algumas durante o período pandêmico, inclusive durante o processo de gravação.”





A liberdade é o fio condutor do trabalho de estreia dela. “Tenho uma trajetória de tocar vários estilos de música, sempre com pegada mais percussiva, mais rítmica, mas sem me limitar a um ritmo específico”, comenta.

Naroca gosta, mesmo, é de misturar: “Digo que sou da linhagem tropicalista.” Em “Meridiana” há samba-reggae, funk, bossa nova, afrobeat, rap, percussão experimental, coral e beatbox.

As letras vieram das leituras dela sobre o mundo. “Falo de natureza, feminismo e machismo, sobre o carnaval de rua de Belo Horizonte.” Outro tema é a questão indígena. O título do álbum, “Meridiana”, é metáfora que remete tanto aos meridianos geográficos quanto ao autoconhecimento.

“Tirei esse conceito da acupuntura. Meridianos são canais que temos em nosso corpo, segundo a medicina chinesa, ligando nosso universo interior ao mundo exterior. Este disco liga meu universo interior ao mundo”, afirma. O repertório ora é extrovertido e dançante, ora introspectivo, voltado para a solitude, segundo ela.





O projeto foi gravado em casa por Naroca e Rafael Fantini. “Misturamos eletrônico e instrumentos orgânicos como violão, percussão e voz.” O hibridismo é a base da sonoridade. “Recursos eletrônicos podem ser grandes aliados de percussionistas e bateristas, porque agilizam a questão logística dos instrumentos, gerando resultados interessantes”, comenta Naroca.

O clima caseiro ajudou a cantora estreante a se soltar. “Se tivesse gravado no estúdio, com pessoas me olhando, talvez fosse diferente. Fui entendendo minha voz no sentido mais amplo da expressão, da comunicação, e não apenas como ferramenta técnica do cantar”, explica.

“Durante a pandemia, fiz um mergulho interior e passei a cantar cada vez mais, estudando cantoras incríveis como Nath Rodrigues, Júlia Vargas, Vanessa Moreno, Josy.anne e Claudia Manzo”, comenta. Mariana Cavanellas, ex-Rosa Neon, divide com ela a faixa “Curumim tupinambá”.




HIPPIE

Ao comentar o repertório, Naroca diz que “Tangará” mostra seu lado bucólico, “neo-hippie”, enquanto “Quero” traz outros ambientes, com hip-hop, R&B e trap. Já a feminista “Tempos sombrios” usa o rap como base sonora e reverencia a fanfarra Sagrada Profana, formada por mulheres.



Depois de “Meridiana”, a artista mineira realizará outro sonho, viabilizado pela aprovação de seu projeto pela Fundação Municipal de Cultura de BH. “Vou fazer o LP, um formato mais duradouro. Há essa coisa de o vinil estar voltando, mas além da durabilidade, de atravessar gerações, ele tem algo muito legal: a relação com a arte visual.”

A lei de incentivo é fundamental para o LP de Naroca. “Prensar é muito caro para um artista independente”, comenta, observando que o apoio também permitirá que o vinil chegue ao consumidor com preço razoável.





Outra luta é financiar clipes – por ela, cada uma das 11 faixas teria o seu. “Artisticamente, é muito interessante fazê-los. Acho até que completam o sentido da música, além de mostrar a estética do trabalho. Mas para o artista independente isso se torna difícil, principalmente em tempos de pandemia”, diz Naroca.

“Foi um desafio enorme lançar três single-clipes. O primeiro, ‘Tangará’, fiz com equipe maior, com locação e tudo. Os outros dois, ‘Quero’ e ‘Tempos sombrios’, fiz em casa mesmo, filmando com o celular e investindo mais na pós-produção.”

Por falar em dificuldade, Naroca manda seu recado para o público: “Para nós, artistas independentes que estamos batalhando, não é fácil fazer música neste momento sem shows, a nossa fonte de renda. É muito importante que as pessoas escutem, compartilhem, deem play nas plataformas. A música está aí para nos fortalecer nestes tempos tão difíceis.” Os shows de “Meridiana” estão previstos para dezembro.




(foto: Luiza Ananias/Divulgação)

“MERIDIANA”

. Disco de Naroca
. Tratore
. 11 faixas
. Disponível nas plataformas digitais

REPERTÓRIO

» “TANGARÁ”
De Naroca e Rafael Fares

» “OMOLU”
De Naroca e Rafael Fantini

» “AVE”
De Naroca

» “QUERO”
De Naroca

» “TEMPOS SOMBRIOS”
De Naroca

» “AMOR DE CARNAVAL”
De Naroca e Rafael Fantini

» “UM CANTINHO”
De Naroca

» “SOU LUA”
De Naroca

» “CURUMIM TUPINAMBÁ”
De Rafael Fantini

» “MATIAS”
De Naroca e Rafael Fantini

» “DJUN DID”
De Naroca e Rafael Fantini

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