O último episódio de Game of thrones, que será exibido neste domingo (19), às 22h, pela HBO, coloca o ponto final na maior produção televisiva já realizada, considerando-se os recordes de audiência, orçamento e prêmios recebidos nas sete temporadas anteriores da série. Além de números expressivos, a produção criada por David Benioff e D. B. Weiss, baseada nos romances de As crônicas de gelo e fogo, de George R. R. Martin, conquistou uma legião de fãs intensamente apaixonados pela trama.
Porém, ter cativado tanta gente tornou a dupla de produtores perigosamente responsável pelas expectativas de quem aguardava há quase dois anos pelo desfecho de sua história predileta. Depois de cinco dos seis capítulos finais irem ao ar, o grand finale chega cercado de reclamações, desapontamentos e críticas, feitas por quem mais amava o seriado.
Os acontecimentos da temporada final foram tão inaceitáveis para uma parte do público que até uma petição on-line foi criada pedindo sua completa refilmagem. O documento ultrapassou as 500 mil assinaturas no site Chance.org na quinta-feira passada, três dias portanto antes do episódio final.
Muitos dos comentários eram recheados de termos técnicos como “arma de Tchekhov” (segundo o dramaturgo russo Anton Tchekov, se uma arma é mostrada no primeiro ato de uma peça, ela deve reaparecer até o último) e “Deus ex-machina” (este para se referir a um conflito encerrado com uma solução simples e inesperada), entre outros argumentos para condenar as falhas dos roteiros. As discussões, dignas do futebol, no qual qualquer torcedor costuma arriscar palpites mais elaborados sobre o tema, mostram que o interesse do público pelas minúcias da produção audiovisual está em alta.
“O povo está mais atento. Hoje, o público sabe o que é uma trilha, um arco de um personagem. Sabe identificar quando o roteiro extrapola em algum ponto e por quê. É um fenômeno que ocorre em várias áreas. Na medicina, por exemplo, qualquer um pode entrar no Google e ficar sabendo de milhares de informações sobre uma doença. Estamos muito mais bem informados.
“Você pode ter contradições, mas nunca incoerências. São palavras mágicas. Pode ser ficcional, mas nunca perder a credibilidade”, afirma Doc Comparato, que diz acompanhar Game of thrones “apenas por alto”, por não apreciar fantasias. Para o roteirista de séries nacionais como Mulher (1998), O tempo e o vento (1985) e Lampião e Maria Bonita (1982), a insatisfação em casos como o de GoT se deve também ao comportamento passional dos espectadores.
INFANTILIZAÇÃO “Todo mundo se acha roteirista.
A julgar pelas declarações de muitos fãs nas redes sociais, o que eles queriam era um desfecho mais condizente com o que foi apresentado nas temporadas anteriores e com as motivações de cada personagem. Muitos estranham, por exemplo, o confronto contra o Rei da Noite (Vladimir Furdik), chamado ao longo de toda a trama de “A Grande Guerra” ter sido sumariamente resolvido.
No penúltimo episódio, exibido domingo passado, a personagem Daenerys Targaryen (Emilia Clarke), uma das protagonistas e muito querida pelo público pela personalidade forte em sua trajetória de conquistadora e libertadora, decepcionou muita gente ao se enfurecer e matar várias pessoas inocentes.
Ainda que Game of thrones tenha como características mais exaltadas as reviravoltas imprevisíveis e a complexidade de personagens, quase nunca totalmente bons ou maus, as surpresas dessa vez não agradaram. Os principais alvos da insatisfação foram David Benioff e D. B. Weiss, mentores da série e roteiristas dos últimos três episódios, precisamente os mais criticados. Os dois primeiros da atual temporadaforam escritos por Dave Hill e Bryan Cogman, respectivamente). A temporada final de Game of thrones também foi criticada por falhas técnicas, como um episódio escuro demais e até um copo de café esquecido no set, que acabou aparecendo em uma das cenas.
Por outro lado, no entendimento de Doc Comparato, o calor do momento também pode influenciar nas avaliações do público. “É preciso pensar quando o roteirista escreveu isso. Há mais de um ano? Às vezes, agora a cabeça e o coração estão em outro lugar. O maior prazer do roteirista não é o produto feito, mas quando se escreve. Quando o produto é finalizado e exibido, depois de um tempo, muita gente muda de opinião.
Com sua relação com os maiores admiradores de Game of thrones posta à prova nesta temporada final, D & D, como são chamadas os dois realizadores, devem lidar com outro público muito complexo em breve. A dupla será responsável por uma nova trilogia de Star wars, que deverá ser lançada em 2022, em continuação à trama que se encerra ainda neste ano com o Episódio IX: A ascensão de Skywalker, cuja estreia está marcada para dezembro..