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Romance sobre feminicídio no interior de Minas vence prêmio literário

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É muito sobre a sociedade patriarcal, sobre os segredos, o silêncio corrosivo desses segredos, todos os problemas da sociedade mineira naquela época. A princípio, parece que estamos falando de um crime de honra à moda antiga, até perto do final, quando segredos vêm à tona”

Eliana Cardoso,
escritora, sobre seu livro Dama de paus


A economista e escritora mineira Eliana Cardoso venceu a terceira edição do Prêmio Kindle de Literatura, uma iniciativa da Amazon em parceria com a Editora Nova Fronteira, que visa a descobrir e reconhecer romances inéditos autopublicados pelo Kindle Direct Publishing (KDP). Concorrendo com cerca de 1.000 escritores, Eliana ganhou o concurso com o livro Dama de paus.

“Trata-se de um romance que fala sobre um crime cuja história se passa na década de 1970, em uma cidade fictícia do interior de Minas. Conta a saga de Damiana, que, ao retornar do velório da neta, intercala sua história e de suas filhas, com a conversa que ouve pela porta entreaberta do seu quarto. A conversa se passa entre quatro mulheres em volta de uma mesa de buraco. Elas comentam um crime ocorrido três anos antes. Ao mesmo tempo em que ouve a conversa, Damiana lê o testamento deixado pela neta. É o que hoje se chama de feminicídio.

O marido mata a mulher e é absolvido sob a tese da legítima defesa da honra”, conta a escritora.

Eliana diz que seu romance “é muito sobre a sociedade patriarcal, sobre os segredos, o silêncio corrosivo desses segredos, todos os problemas da sociedade mineira naquela época. A princípio, parece que estamos falando de um crime de honra à moda antiga, até perto do final, quando segredos vêm à tona”, conta.

Ela diz que “foi uma grande alegria” receber o prêmio. “Primeiro, porque é muito bom saber que tenho leitores e, em segundo lugar, por ver o meu trabalho sendo reconhecido.” O concurso oferece ao vencedor R$ 30 mil e um contrato com a editora Nova Fronteira, que se encarregará de publicar a obra em papel.

Dama de paus deve ser publicado em agosto. A autora já tem dois romances publicados, Bonecas russas e Nuvem negra, ambos pela Companhia das Letras). Ela também lançou a coletânea de ensaios literários Sopro na aragem (Editora Colibri). Antes de escrever ficção, no entanto Eliana, que é irmã da ilustradora e escritora Ângela Lago (1945-2017), produziu obras na área de economia. “O meu primeiro livro se chama A economia brasileira ao alcance de todos (Editora Brasiliense) e foi lançado em 1985”, conta.

No momento, Eliana escreve um livro infantil, com o qual pretende homenagear a irmã.
“Confesso que minha inspiração vem, normalmente, quando estou lendo jornal ou outros autores. No caso do Dama de paus, a inspiração já era antiga. Sempre me preocupei com o silêncio da família mineira, quando me lembrei de um crime em Belo Horizonte, na década de 1970. O marido atirou na esposa enquanto ela assistia TV. Segundo ele, o motivo era que a esposa o estava traindo.”

LEGÍTIMA DEFESA No episódio que inspirou a escritora, o autor do assassinato foi a julgamento e saiu absolvido. A tese apresentada foi a de legítima defesa da honra. “Mas, no meu livro, as personagens são fictícias”, avisa Eliana. Radicada em São Paulo desde 2004, Eliana está envolvida atualmente com uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre a população acima de 65 anos.

Ela se formou em economia pela PUC no Rio de Janeiro, em 1972.
É PhD em economia pelo Massachussetts Institute of Technology (MIT), trabalhou no departamento de pesquisa do Fundo Monetário Internacional (FMI) e foi economista-chefe para a Ásia do Sul, economista-chefe na China e gerente setorial para a América Latina no Banco Mundial. Na carreira acadêmica, foi catedrática da Tufts University e professora visitante do MIT e das universidades de Yale e Georgetown, além de professora titular da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Eliana afirma que não tem propriamente um livro de cabeceira, mas mantém o hábito de ler, todas as noites, um ou dois poemas de seus poetas prediletos, entre eles Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Fernando Pessoa e Wislawa Szymborska. “Estou lendo um livro maravilhoso que se chama O tempo envelhece depressa (Cosac Naify), de Antonio Tabucchi (1943-2012). É uma coletânea com nove contos sobre temas como o significado da ausência como imagem literária e existencial. As histórias se passam em diversos países europeus. O autor também faz relatos de situações nas quais não é mais possível reverter o tempo. São histórias contadas contra o tempo. O tempo foge e detém-se, gira sobre si próprio, esconde-se, reaparece a pedir contas. É fácil encontrá-lo em sebos e internet.”

BIS MINEIRO

A primeira edição do Prêmio Kindle de Literatura, realizada em 2017, também teve como vencedora uma escritora mineira, com um romance ambientado no estado. Radicada em São Paulo, Gisele Mirabai ganhou a disputa com Machamba, em que uma mulher que se mudou para Londres, é tomada pelas memórias de sua infância numa fazenda no interior mineiro, enquanto faz uma viagem por diversas capitais europeias.

 

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