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BH recebe mostra de Ai Weiwei com obras feitas pelo chinês no Brasil

'Raiz' ficará em cartaz no CCBB até o mês de abril, quando o artista pretende voltar ao país e realizar um filme, a partir da tragédia de Brumadinho


postado em 05/02/2019 05:02

A obra Deixando cair uma urna da Dinastia Han (2015), crítica de Ai Weiwei à Revolução Cultural chinesa, faz parte da mostra, que ficará em cartaz até 15 de abril, no prédio da Praça da Liberdade (foto: Fotos: CAROL QUINTANILHA/DIVULGAÇÃO)
A obra Deixando cair uma urna da Dinastia Han (2015), crítica de Ai Weiwei à Revolução Cultural chinesa, faz parte da mostra, que ficará em cartaz até 15 de abril, no prédio da Praça da Liberdade (foto: Fotos: CAROL QUINTANILHA/DIVULGAÇÃO)

Mil, duzentas e cinquenta e quatro bicicletas formam a imensa instalação montada, nos últimos dias, na lateral externa do Centro Cultural Banco do Brasil. À vista de qualquer um que passe em frente ao prédio da Praça da Liberdade, a obra Bicicletas forever (2015) é um cartão de apresentação e tanto para a exposição Ai Weiwei – Raiz, que será aberta na noite desta terça (5) para convidados e amanhã para o público.

Primeira itinerância da monumental exposição inaugurada em outubro na Oca, em São Paulo – a maior do artista chinês já realizada no mundo –, a versão de Raiz que chega nesta semana a Belo Horizonte traz todos os núcleos conceituais da mostra original, só que em menor escala.

Menor escala, neste caso, é quase uma liberdade de expressão, já que os trabalhos de Weiwei são gigantescos, numerosos, diversos. A começar pela obra que deu o ponto de partida para a mostra brasileira, uma parceria com o curador Marcello Dantas, que trouxe Weiwei para uma imersão no país em 2017.

Em pouco mais de um ano, o artista, hoje radicado em Berlim, veio seis vezes ao Brasil, passando pela Bahia (Trancoso, onde foi instalado um grande ateliê), Ceará (Juazeiro do Norte) e São Paulo (São Caetano do Sul).

Em 2010, Dantas viu na Tate Modern, em Londres, a obra Sementes de girassol. O trabalho reuniu 100 milhões de pequenas peças de porcelana pintadas a mão – juntas, elas formavam uma única superfície. Cada peça era única, original, e foi criada ao longo de dois anos por 1,6 mil artesãos, a maioria mulheres, de Jingdezhen, cidade do interior da China.

“Weiwei gera impacto de transformação social por meio da arte. O processo de fazer é tão transformador quanto o resultado. Ele pegou uma tradição chinesa (a porcelana) e deu um protagonismo internacional a essas pessoas”, diz Dantas. Foi por causa desse trabalho que Dantas entrou em contato com o artista. Sua intenção era trazê-lo ao Brasil para uma grande exposição – no momento inicial das conversas, a mostra de Weiwei inauguraria o CCBB-BH, em 2013.

Só que o artista dissidente chinês foi preso no aeroporto de Pequim, em 2011, e só pôde deixar a China em 2015. Já em Berlim, em 2016, Dantas voltou a fazer contato com ele. “O Brasil é antropofágico em sua essência. Com a exposição, fizemos surgir uma nova palavra, mutuofagia. Weiwei veio ‘comer’ o Brasil e também foi ‘comido’ por ele”, comenta o curador, que espera para abril uma nova visita do artista ao país – Weiwei pretende fazer um filme  aqui. “A data ainda está dependendo de algumas coisas. Mas, depois que soube de Brumadinho, ele ficou muito inquieto com a história (a China é o maior importador do minério de ferro extraído em Minas).”

Em 2017, Ai Weiwei levou ao Festival de Cinema de Veneza seu documentário Human flow – Não existe lar se não há para onde ir, a respeito da condição em que vivem refugiados em distintas partes do mundo.

EX-VOTOS A exposição Raiz toma todas as áreas do CCBB. Para o visitante, o melhor é iniciar a visita pelo terceiro andar. É uma versão de Sementes de girassol, com duas toneladas das sementes em porcelana, que recebe o público na entrada. Já na primeira sala, vemos o resultado do trabalho do artista no país. Ali estão 100 peças em madeira (muitas delas inéditas, feitas para a mostra em BH). São ex-votos produzidos em Juazeiro do Norte, mas ao modo Weiwei.

As imagens constroem um caleidoscópio da própria trajetória do artista – há representações de trabalhos recentes, que se relacionam à questão dos refugiados, como também objetos pessoais do artista, além de sua própria imagem, tudo isso reinterpretado pelos artesãos cearenses. A madeira continua presente na sala seguinte, com uma representação do mapa da China feito em marchetaria perfeita. A madeira utilizada foi recuperada de templos destruídos da Dinastia Qing.

Arte e ativismo são indissociáveis na obra deste chinês de 61 anos, filho do poeta Ai Qing. O Dia Nacional da Literatura da China é dedicado ao poeta que, no final dos anos 1950, perseguido pelo governo, foi obrigado a se exilar no Deserto de Gobi. Foi ali que Weiwei passou seus primeiros 20 anos. Tanto por isso, o discurso sobre perseguição e perda de direitos civis é tão forte em sua obra.

Trabalhos conhecidos de Weiwei se misturam na mostra Raiz com aqueles produzidos durante sua imersão no Brasil. Assuntos relacionados à China são muito presentes, mas, desde a prisão, em 2011, o discurso dele se tornou mais global. O imenso inflável negro que domina toda a área do pátio do CCBB (em frente aos cafés) remete aos refugiados da Guerra da Síria que tentam chegar à Europa pelo mar.

A Revolução Cultural Chinesa, ocorrida a partir de 1966, durante a Era Mao Tse-Tung (1949-1976), tentou apagar todos os aspectos burgueses daquele país. “A China apagou sua memória, e Weiwei faz um trabalho de resgate”, comenta Dantas. Uma das obras mais conhecidas do artista, Deixando cair uma urna da Dinastia Han (2015), faz menção a isso. São três grandes telas, feitas em Lego, que reproduzem fotografias. Nelas, o artista pega um vaso de porcelana de 2 mil anos da Dinastia Han e o deixa cair, propositalmente, no chão.

“Isto, para os olhos de um ocidental, é um sacrilégio. Por um artista plástico, é um crime duplamente maior. Mas,  para a China, a foto é a da banalidade, já que Mao Tse-Tung ordenou que todas as antiguidades deveriam ser destruídas, pois elas representavam um passado que a China deveria esquecer”, explica Dantas.

CÂMERA A motivação de Weiwei para este trabalho foi deveras prosaica, segundo conta o curador. Weiwei havia comprado uma câmera Nikon que tinha um obturador (dispositivo mecânico que controla o tempo de exposição de um filme à luz em uma câmera) muito rápido. “E ele queria saber se conseguiria captar o vaso caindo no ar”, diz Dantas. Weiwei, por sinal, tinha oito vasos históricos para o “experimento”. Não houve necessidade de usar todos – alguns exemplares estão na exposição, mas pintados de cores fortes, que apagaram sua história anterior.

A imagem de Weiwei está presente em várias de suas obras. Artista/ativista que documenta todos os seus passos e os divulga nas redes sociais, ele aparece em uma grande reprodução na selfie que fez quando foi preso na China. Uma parede traz, plotado, diferentes desenhos que remetem ao gesto do dedo médio levantado. Eles fazem referência ao gesto que o artista fez (e fotografou) para uma série de trabalhos em que ironizou monumentos chineses. “E a imagem passou por toda a censura chinesa, porque, na China, o dedo médio (em riste) não quer dizer nada”, afirma Dantas, explicando a maneira como o trabalho de Weiwei permite diferentes leituras. “Ultrapassar fronteiras a partir de um código é muito do que ele faz.”

Em uma sala no térreo do CCBB podemos ver uma reprodução do corpo do artista. O trabalho Duas figuras (2018), produzido no Brasil, tem um molde corporal de Weiwei (que levou oito horas para ser feito) deitado em um colchão (que era do próprio Dantas e foi utilizado a pedido de Weiwei) ao lado de uma mulher baiana, que está de costas para ele (os dois nunca se viram). Ao fundo, um punhado de sementes vermelhas, conhecidas popularmente como olho-de-dragão.

“O pai de Weiwei esteve no Brasil nos anos 1950, quando ficou amigo de Jorge Amado (1912-2001). (Na volta) ele levou o olho-de-dragão para a China. Quando Weiwei encontrou aqui a semente, comprou sacos e sacos. Esse trabalho traduz bem a mutuofagia. Cada um dá um pouco de si e aceita um pouco do outro”, afirma Dantas.

AI WEIWEI – RAIZ
Abertura para o público quarta (6), às 10h, no Centro Cultural Banco do Brasil, Praça da Liberdade, 450, Funcionários, (31) 3431-9400. Visitação: até 28 de fevereiro, de quarta a segunda, das 10h às 22h; de 1º de março a 15 de abril, das 9h às 22h. Entrada franca.


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