Jornal Estado de Minas

TRANSMISSÃO

Coronavírus: cientistas acham indícios de que grávidas transmitem para bebês

Um estudo apresentado nesta quinta-feira, na conferência virtual Aids 2020, sugere que gestantes infectadas pelo Sars-CoV-2 podem transmitir o vírus para o feto. Pesquisas anteriores já relataram casos de recém-nascidos com COVID-19, mas a transmissão vertical — ou seja, de mãe para filho — intrauterina ainda não é uma certeza.


O autor do trabalho atual afirma que encontrou o coronavírus em amostras da placenta, do cordão umbilical, no líquido amniótico e na vagina de mulheres que deram à luz entre março e abril, no norte da Itália, região do país mais afetada pela pandemia. Ele, porém, diz que são precisos mais estudos para confirmação.

A pesquisa foi realizada com 31 mulheres. Segundo Claudio Fenizia, pesquisador da Universidade de Milão e um dos líderes do estudo, dessas, houve um caso de Sars-CoV-2 na mucosa vaginal e outro do vírus no leite materno. Além disso, dois bebês testaram positivo para o coronavírus.

Em uma delas, também foi encontrado o causador da COVID-19 na placenta e  anticorpos no sangue do cordão umbilical. “Esses dois casos sugerem fortemente a transmissão vertical intrauterina. Porém, os dois bebês nasceram saudáveis e não tiveram qualquer problema”, disse Fenizia à agência Ansa.


O cientista contou que a primeira criança, nascida de uma mulher que apresentava uma forma muito severa de COVID-19, testou positivo entre o sétimo e o 10° dia de nascença. O segundo, filho de uma paciente com sintomas pouco graves, foi diagnosticado com o vírus poucas horas depois de nascer.

“A coisa mais preocupante é que a placenta tinha anticorpos IgM, portanto, o bebê deve ter estado exposto diretamente ao vírus, provavelmente duas semanas antes”, relatou Fenizia. Os anticorpos IgM indicam exposição recente ao Sars-CoV-2.

Como a transmissão vertical intrauterina ainda foi pouco estudada, o cientista pede cautela na interpretação dos resultados e diz que o estudo  — que, em breve, será publicado na plataforma on-line Medrxiv para, depois, passar pela revisão de pares — não faz nenhuma conclusão.


Fenizia destaca que as mulheres pesquisadas na Itália estavam nos últimos estágios gestacionais, e que seria importante avaliar o impacto do vírus durante toda a gravidez. Ele está tentando coletar material de gestantes que estão perto de dar à luz, mas que foram infectadas no início da gravidez.

No hospital

Na literatura científica sobre a COVID-19, há alguns relatos de casos de recém-nascidos que testaram positivo para o vírus, mas, até agora, não foi possível determinar como se infectaram — uma possibilidade, por exemplo, é terem se contaminado no ambiente hospitalar.

Um estudo feito em Wuhan, onde foram detectados os primeiros casos conhecidos da doença, três de 33 bebês nascidos em um hospital local estavam com Sars-CoV-2 (nenhum grave), mas as amostras retiradas do líquido amniótico, do sangue do cordão umbilical e do leite materno deram negativo, descartando a transmissão vertical intrauterina.


Uma revisão internacional de casos conduzida pela Universidade de Nottingham, no Reino Unido, concluiu, recentemente, que a transmissão do vírus pelas gestantes é incomum, mesmo se os bebês nascem de parto natural, quando o contato com a mucosa vaginal poderia aumentar o risco de infecção.

Os autores fizeram uma meta-análise de 49 estudos que incluíram 666 recém-nascidos e 656 mulheres (algumas deram à luz gêmeos). Das que fizeram parto normal, oito de 292 (2,7%) tiveram bebês que testaram positivo. O índice entre as mães submetidas à cesária foi ligeiramente maior: 20 crianças (5,3%) tinham o vírus no organismo.

“Esses dados mostram que a infecção neonatal por COVID-19 é incomum, e também que os bebês afetados são quase todos assintomáticos”, diz Kate Walker, pesquisadora da área de obstetrícia da Universidade de Nottingham. Ela afirma que nenhum bebê amamentado com leite materno contraiu a doença, mesmo estando as mães infectadas.