Jornal Estado de Minas

SAÚDE

Enxaqueca: confira os sintomas da dor de cabeça latejante


De repente, um pequeno incômodo, uma pontada, e para quem conhece bem os sinais sabe que a enxaqueca está a caminho. Começa como uma fagulha e pode chegar a uma labareda. É uma intercorrência multifatorial enfrentada por 15% da população e a Organização Mundial da Saúde (OMS) a considera uma das dores mais incapacitantes do mundo.



Há vários tipos de dor de cabeça e diferentes tratamentos; vai desde uma dor de cabeça tensional ou migranosa (enxaqueca) até secundária, relacionada com um tumor ou infecção.
 
Quem conhece muito bem este quadro de dor é Thays Avelar Lopes, de 26 anos, psicóloga. Ela revela que ainda não tem o diagnóstico fechado de enxaqueca, apenas sugestão do médico e não fez nenhum exame para confirmar: “Sei que é um tratamento para o resto da vida e convivo com ela desde os meus 15 anos. Começou com uma dor de cabeça e enjoo, seguido de dormência na região da boca e os dedos. Fiquei muito assustada, mas por sorte meu pai já teve e me auxiliou. A dor começa, geralmente, perto de quando vou ficar menstruada ou quando viajo para algum lugar, já fico à espera. Às vezes, chega de repente também, começa com dor de cabeça normal e depois a visão fica turva, começa a dar enjoo, aí já tenho certeza de que está chegando a crise. A minha é genética”.
 
A psicóloga Thays Avelas lida com a enxaqueca há 15 anos e diz que não tem uma frequência determinada e a duração pode variar, mas já ficou com dor um dia todo (foto: Arquivo Pessoal)
Thays enfatiza que durante as crises não consegue ler, não fica em lugar com muito barulho, precisa se deitar e esperar a crise passar. A enxaqueca a atrapalha em questões de serviço e até mesmo passeios.

“Não tenho uma frequência determinada e a duração pode variar. Já fiquei um dia todo com a dor de cabeça. Infelizmente, é uma doença que nos trava, como se não tivéssemos como recorrer.” Para superar a dor, a psicóloga conta que o alívio está nos remédios: “É só tomar e já melhoram bastante os sintomas”.




 
O médico Galileu Chagas, coordenador do Serviço de Neurologia do Hospital Vila da Serra, explica que, do ponto de vista técnico, trata-se de um transtorno episódico cujo principal componente é a dor de cabeça. “Em outras palavras, podemos explicar que existem vários tipos de cefaleia (dor de cabeça) primária, isto é, que não são secundárias a algum fator externo, como um tumor ou infecção, mas que acompanham a pessoa ao longo da vida, sem significar presença de outra doença subjacente – a enxaqueca é uma cefaleia primária.”
 
Galileu Chagas ensina que cefaleia é apenas o termo médico para dor de cabeça; tem o mesmo significado. Mas enquanto cefaleia é um termo genérico, podendo significar qualquer dor de cabeça, a enxaqueca é um diagnóstico específico, com características próprias e tratamento direcionado.

Ele explica que o diagnóstico é feito da seguinte forma: o paciente precisa ter tido cinco crises prévias de dor de cabeça com duração de 4 a 72 horas e pelo menos duas das seguintes características: localização unilateral, qualidade pulsátil, dor moderada ou intensa e piora com atividade física. Além disso, faz parte do critério diagnóstico que o paciente tenha náuseas e vômitos ou fotofobia (hipersensibilidade à luz) e fonofobia (hipersensibilidade aos sons) durante os episódios de dor de cabeça.





NÃO TEM CURA

Galileu Chagas, coordenador do Serviço de Neurologia do Hospital Vila da Serra, explica que o tratamento da crise de dor cabeça (cefaleia) é diferente do tratamento da dor de cabeça crônica (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)


A enxaqueca não tem cura. Mas Galileu Chagas alerta que não é motivo de desespero: “Temos de tomar muito cuidado com essa resposta. É comum pacientes perderem a esperança na melhora da própria dor de cabeça. Contudo, o que observo na prática clínica é que muitas vezes eles não receberam o tratamento adequado. Se manejada da forma correta, com tratamento medicamentoso e aderência a medidas não farmacológicas, como atividade física e melhora do sono, a enxaqueca pode ter ótimo controle. Alguns pacientes passam vários anos sem nenhuma crise”.
 
A importância do tratamento adequado é fundamental para espaçar o máximo possível alguma crise. Daí a importância do diagnóstico correto. Segundo o médico, o tratamento da crise de dor cabeça (cefaleia) é diferente do tratamento da dor de cabeça crônica.

Enquanto no primeiro o objetivo é dar um alívio rápido de uma crise de cefaleia, o segundo visa à instituição de uma profilaxia secundária, isto é, um tratamento preventivo para evitar a recorrência de novas crises.



Ambos os tratamentos podem ser semelhantes ou diferentes conforme o diagnóstico. Por exemplo, o tratamento da cefaleia em salvas é diferente da cefaleia da enxaqueca. Enquanto o tratamento da cefaleia tensional tem algumas semelhanças.
 
Galileu Chagas conta que a enxaqueca é um transtorno muito comum, que afeta 12% a 15% da população em geral. Acomete principalmente a faixa etária entre 30 e 39 anos, com redução de sua prevalência com o aumento da idade. “Embora também tenha um componente genético, sendo comum que várias pessoas de uma mesma família tenham o diagnóstico, existem alguns fatores de risco, como a obesidade. Sedentarismo e comorbidades, como transtornos de ansiedade e de humor, também influenciam a ocorrência e a gravidade das crises”, explica o especialista.
 
O médico confirma: é verdade que a enxaqueca é mais frequente em mulheres do que em homens, com uma prevalência que chega a 24% nas mulheres jovens, enquanto em apenas 7% nos homens. “Embora não saibamos o motivo exato de isso acontecer, é possível que tenha relação com uma questão hormonal – estrogênio (hormônio feminino).”




 
E a enxaqueca pode acontecer em qualquer idade e, por vezes, inicia-se ainda na infância, como alerta Galileu Chagas. “Sua prevalência aumenta ao longo dos anos e particularmente na adolescência. Estima-se que a prevalência da enxaqueca aos 10 anos de idade seja de cerca de 5%, sendo que na maioria dos casos há histórico familiar.”
 

O QUE DIZ A CIÊNCIA?

  1. Evidência de que opioides oferecem alívio da dor de cabeça causada pela enxaqueca é baixa ou insuficiente, conforme estudo de meta-análise em grande escala da Mayo Clinic, publicado na revista médica Jama, em 2021: https://jamanetwork.com/journals/jama/fullarticle/2781052. O estudo concluiu que os triptanos, AINEs (medicamentos anti-inflamatórios não esteroides, como aspirina, diclofenaco, ibuprofeno e cetorolaco) ou uma combinação de ambos ofereceu a maior base de evidência de alívio em duas horas, assim como em um dia após o início dos sintomas.
  2. Em abril de 2011, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o uso do botox para o tratamento de enxaqueca crônica em adultos. A indicação para enxaqueca crônica é bastante específica. São considerados com a doença pacientes que apresentam mais de 15 dias de dor de cabeça por mês, cada crise com duração média de quatro horas diária.
  3. A aplicação de botox para o tratamento de dores de cabeça surte efeitos somente em pacientes com enxaqueca crônica. A substância parece não ser relevante no alívio dos sintomas de dores de cabeça menos frequentes ou de cefaleia tensional – o tipo mais comum do problema entre adultos. Essas conclusões foram obtidas após pesquisadores da Faculdade de Medicina de Wisconsin, nos Estados Unidos, analisarem 27 trabalhos sobre o assunto, em 2012. O estudo completo foi publicado na revista Journal of the American Medical Association (JAMA). O título original da pesquisa é: Botulinum toxin A for prophylactic treatment of migraine and tension feadaches in adults.
  4. Anticorpos monoclonais, com uso autorizado no Brasil em 2019, é o que há de mais moderno para o tratamento da enxaqueca crônica. No país, há três disponíveis e todos são de aplicação subcutânea, por injeção ou caneta, como a de insulina, que pode ser feita em casa. O uso é mensal e a duração do tratamento é definida pelo médico.