Jornal Estado de Minas

ALIMENTAÇÃO

Por que incluir peixes na alimentação?

  “Não agrada ao meu paladar, não gosto do cheiro, nem do gosto. Já provei de água doce e salgada, mas não gostei. Meu pai era um grande apreciador e cozinheiro de peixes. Na minha infância, tive oferta de várias formas: frito, ensopado, assado, mas realmente nunca apreciei”.



É, pelo visto, Jacqueline Fonseca, de 52 anos, contadora e bancária, não está disposta a incluir o pescado em alguma de suas refeições. O lado bom é que ela se dispôs a experimentar; não gostou. Mas gosto pode mudar.
 
Jacqueline revela que até pouquíssimo tempo atrás não comia nada. Mas andou se arriscando a comer camarão e bacalhau. Os outros frutos do mar, nem pensar. Ou seja, existe uma abertura para o paladar e suas escolhas são excelentes, saborosas e nutritivas.

Ainda que ela faça parte do grupo que “sim, consumo carne vermelha, ovos e frango. No meu dia a dia, quase sempre filé de frango. E me sinto bem. Combina com minha alimentação saudável”.
 
A contadora e bancária Jacqueline Fonseca, de 52 anos, assume que não gosta de peixes, mas diz que já se arrisca a consumir camarão e bacalhau (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
Ainda resistente a outras opções, Jacqueline enfatiza que sardinha não é uma alternativa, infelizmente nem em conserva e nem natural. O atum fresco também jamais. Já o atum em conserva tolera no preparo de três pratos: “Pizza, patê e torta”.



Mesmo com camarão, bacalhau e atum em seu cardápio, ainda que esporádico, de vez em quando, Jacqueline confessa que não imagina mudar o hábito alimentar incluindo um pescado ao menos uma vez por semana: “Nem sequer penso nisso. Realmente, peixe está fora do meu cardápio habitual. Mas com orientação e adequação da minha nutricionista, consigo me alimentar de forma saudável sem ter que comer peixe”.

Resistência


Cristiane Neiva, pesquisadora e diretora do Instituto de Pesca (IP-APTA), destaca os ácidos graxos (ou gorduras) poli-insaturados, como os chamados ômega 3, relacionados ao desenvolvimento neurológico, principalmente na infância e mesmo na gestação (foto: Arquivo Instituto de Pesca/Divulgação)
Bem, se Jacqueline será ou não convencida a consumir mais peixe no dia a dia é uma incógnita, mas colocá-lo no cardápio não é só questão de paladar. Gostar ou não gostar. Mas o brasileiro que tem resistência ao consumo de pescado ou outros frutos do mar, infelizmente, cria barreiras ao alimento diante de dúvidas, mitos, falta de abertura para experimentar, insegurança no preparo, enfim, todos argumentos frágeis e facilmente contornados.

Basta querer. Diante deste cenário, o Instituto de Pesca (IP-APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, desenvolve pesquisas e ações voltadas a disseminar a importância do consumo de animais aquáticos para mostrar seus vários benefícios à população.




 
Com variedade de espécies, o peixe é uma opção valiosa de proteína de alta qualidade, além de trazer sabor e variedade às refeições.

“Usamos o termo pescado para nos referir a todos os organismos aquáticos: peixes, crustáceos (camarões, lagostas, siris, caranguejos), moluscos (mariscos, mexilhão, polvo, lula, ostras) e, além desses, os répteis (a exemplo do jacaré, tartaruga), os anfíbios (rãs) e alguns equinodermos, como o pepino-do-mar”, explica Cristiane Rodrigues Pinheiro Neiva, pesquisadora e diretora do Instituto de Pesca (IP-APTA).
 
Conforme Cristiane Rodrigues Pinheiro Neiva, ao pensar em alimentação mais saudável, o pescado é um alimento estratégico. Tanto pela alta qualidade das proteínas quanto pela presença de nutrientes importantes, como os ácidos graxos (ou gorduras) poli-insaturados, como os chamados ômega 3, relacionados ao desenvolvimento neurológico, principalmente na infância e mesmo na gestação.

Os benefícios não param por aí, como acrescenta Rúbia Yuri Tomita, também pesquisadora do IP-APTA: “Tem ainda os micronutrientes, como os minerais, que são importantes para o funcionamento do organismo, como o manganês, magnésio, zinco, cobre, entre outros, além das vitaminas do complexo B”.




 
 
 
Cristiane Neiva, pesquisadora e diretora do Instituto de Pesca (IP-APTA), destaca os ácidos graxos (ou gorduras) poli-insaturados, como os chamados ômega 3, relacionados ao desenvolvimento neurológico, principalmente na infância e mesmo na gestação (foto: Arquivo Instituto de Pesca/Divulgação)
 
 
Rúbia Yuri Tomita destaca que, que apesar de alguns peixes terem mais gordura que outros, isso não deve ser considerado um problema, pois trata-se de “gordura boa”. E que uma pesquisa que fizeram em 2016 mostrou que peixes como sardinha e trilha têm mais gordura e são mais calóricos; já tambaqui, abrótea e pescada-branca são mais magros.

A indicação é buscar a riqueza da diversidade de pescado e não ter uma preocupação com qual seria “mais saudável”, pois todos são. O importante é: “Procurar a diversificação quando falamos no consumo de frutas, legumes e verduras. E, no que diz respeito ao pescado, também é importante. Não consuma apenas salmão, por exemplo. Busque variedade”, aconselham as pesquisadoras.
 
Há várias espécies de peixes e todos ricos em nutrientes (foto: RitaE/Pixabay)
  

Dúvidas frequentes e mitos 

Para confirmar sua sábia escolha, incentivá-lo a comer com mais frequência ou ainda dar argumentos para quem não gosta, repensar, experimentar e incluir o peixe nas refeições, Cristiane Rodrigues Pinheiro Neiva e Rúbia Yuri Tomita respondem às dúvidas frequentes e mitos sobre o consumo de 
pescado que vão fazer você incluir mais peixes na alimentação. 




 
1 – Quais as melhores espécies para consumir?
Pela variedade, temos oportunidades de consumir espécies marinhas ou de água doce, provenientes da pesca ou da aquicultura ou ainda em preparações simples ou gourmet. Os consumidores podem variar a preparação utilizando pescados magros, como pescada, linguado, merluza ou bacalhau, e gordos, como sardinha, salmão, atum e cavalinha. O sabor de cada espécie sofre influências do conteúdo de gordura, sendo, em geral, os peixes gordos considerados por alguns consumidores como os mais saborosos, enquanto os magros apresentam sabor suave e agradam aos paladares mais requintados.

2 – Os benefícios à saúde são reais?
Sim. Há muitos dados científicos sobre os benefícios que o consumo de pescado e algas trazem à saúde, como redução do risco de morte por doença coronária e derrame, diminuição do risco de diabetes, aumento do período de gestação e melhora do desenvolvimento cognitivo e do desenvolvimento neural infantil (quando consumido antes e durante a gestação) e redução do risco de câncer de tiroide em mulheres.

3 – O pescado é um alimento do futuro?
O pescado representa um alimento importante para o futuro em termos de nutrição, segurança alimentar e sustentabilidade e é a terceira proteína mais consumida pela humanidade depois de cereais e leite. Uma alimentação rica e segura na infância estimula uma alimentação saudável na vida adulta. Portanto, a criança que cresce comendo peixe, provavelmente será um consumidor saudável quando adulto.





4 – Não gosto do cheiro... o que fazer?
O cheiro de peixe pode ser desagradável para muitas pessoas e é um indicador de como está o frescor do pescado, sendo uma característica importante para ser observada ao comprá-lo. Peixes frescos e com qualidade apresentam cheiro e sabor suaves, sendo os odores ruins sinais de deterioração. Escolha locais de compra que demonstrem e garantam a procedência e os cuidados higiênicos e sanitários necessários e recomendados pelas autoridades sanitárias. Como o peixe e os frutos do mar estragam mais rápido do que outras carnes, organize-se quanto à quantidade comprada e sua conservação refrigerada até o momento do preparo. Na dúvida, congele pequenas porções a serem consumidas de cada vez, descongele-as sob refrigeração e evite o recongelamento.

5 – Como fazer com a presença de espinhas?
Algumas espécies de peixe têm pequenos ossos ou espinhas intramusculares, o que pode causar acidente na hora do consumo. A sugestão é atenção para a retirada desses espinhos antes do consumo ou o preparo de peixes sem elas, como cação, pirarucu, pintado, tambaqui e bagre, principalmente, quando forem ser servidos pratos à base de pescado para as crianças. Outra opção é a compra de filé ou de carne mecanicamente separada, que apresentam menores chances de ter espinhas.

6 – Peixe pode ser consumido por crianças?
Sim, pode. Os especialistas em saúde recomendam incluir o pescado de duas a três vezes por semana para adultos, com porções de 100g a 120g, e de uma a duas vezes por semana para as crianças com porções de 30g ou mais, conforme a idade. O Guia Alimentar para Crianças Menores de 2 anos, desenvolvido pelo Ministério da Saúde (MS), recomenda que a partir do sexto mês pode-se fazer a introdução do peixe na dieta dos bebês. As crianças podem ser mais receptivas ao pescado se a escolha começar por espécies com sabor mais suave, como a pescada, a tilápia ou o linguado. Para conquistar o paladar infantil, busque novas formas de preparo e inove nas receitas. Uma sugestão de preparo é a de iscas ou pedaços de peixes empanados. Tempere com sal e limão, mergulhe as tiras no ovo batido e cubra com farinha de rosca caseira, regue com azeite, leve ao forno e sirva com um delicioso molho de iogurte ou mostarda com mel. O preparo ao forno de filés com azeite, tomates, cebolas e batatas em rodelas e ervas frescas também pode ser ótima alternativa à fritura. E não se esqueça da praticidade dos enlatados no preparo de saladas de batata, patês e molhos para massas. Há um aumento de crianças consumindo peixes crus, que precisa atenção e cuidado para afastar o risco de contaminação microbiológica. O peixe cru fica delicioso e mais seguro se servido como ceviche, mergulhado no caldo de limão, azeite e rodelas finas de cebola.





7 – Qual pescado devo escolher? 
Todos. Fazendo experimentações, o consumidor vai ter a oportunidade de escolher entre peixes de extrativismo (pesca) ou cultivo, de água salgada ou doce, e uma enormidade de sabores e características nutricionais.

8 – Pescado é muito difícil de preparar
No passado, esse era um dos pontos que levavam o consumidor, por vezes, a não escolher o pescado, pela dificuldade em eviscerar, descamar etc. Hoje, no entanto, encontramos filés já sem pele, sem espinhos, sem vísceras, prontos para o preparo.

9 – Só como o pescado se for fresco; nada de congelado
O pescado tem que ser de qualidade, seja fresco, seja congelado ou conservado de outra forma, ou seja pronto para o consumo. A cadeia produtiva está cada vez mais organizada e a qualidade cada vez melhor. Os órgãos de inspeção estão trabalhando bastante e atuando no sentido de coibir falsificações e fraudes, tentando transmitir uma segurança maior para o consumidor. Fresco ou congelado, é essencial comprar pescado em estabelecimentos de confiança, que cumpram os requisitos higiênico-sanitários e sejam aprovados pelos órgãos fiscalizadores.





10 – Tenho medo de comer peixeporque tem muita espinha
É uma preocupação até certo ponto exacerbada, que acaba se tornando um demérito na percepção popular sobre o pescado. Muita gente não come pensando nesse risco. Embora algumas espécies tenham muitas espinhas e que seja necessário atenção ao consumi-las, há muitos peixes com bem poucas, a exemplo dos bagres, do cação, da truta, do pirarucu, entre outros. Esse é um mito importante que podemos melhorar, tanto na escolha da espécie quanto nos modos de preparo, optando, por exemplo, pelos filés, que já vêm sem espinhas.

11 – Eu não como camarão porque me causa alergia
De acordo com as pesquisadoras, esse receio se volta aos crustáceos e mariscos em geral, mas principalmente ao camarão. Frequentemente, quando questionamos as pessoas sobre esse respeito, elas próprias dizem que nunca comeram, mas conhecem casos de conhecidos, parentes etc. A literatura científica indica que, normalmente, esses casos de reações alérgicas ao consumo de frutos do mar (camarão mais comumente) estão na verdade relacionados ao uso de aditivos na conservação desse produto (por exemplo, sais de sulfito), para que mantenham um aspecto visual apropriado e não se deteriorem rapidamente. No momento da pesca, o pescador adiciona esses sais de sulfito e, se a concentração máxima permitida for desrespeitada, pode acontecer de as pessoas terem reações alérgicas – que, em casos extremos, podem ser graves. Há pessoas que têm reações a variados tipos de proteínas presentes em alimentos, não apenas no pescado, mas isso é mais raro. Essas alergias estão relacionadas mais ao uso do aditivo. Como combater isso? Na opinião das especialistas é preciso conhecer o fornecedor, de quem se compra o camarão, começar a ver e tomar cuidado com a origem do que se consome.