Jornal Estado de Minas

VILA OU AMIGA DA MULHER?

Reposição hormonal na menopausa deve ser individualizada

Menopausa, hormônios, reposição hormonal... esses são termos comuns na vida de mulheres a partir dos 40 anos, e também capazes de causar medo e preocupação. Afinal, a partir dessa idade, uma série de dúvidas surgem a respeito de fertilidade, menstruação e saúde íntima. Que a menopausa é a última menstruação da mulher quase todo mundo sabe, mas o que os hormônios têm a ver com isso e quando a reposição hormonal se torna aliada da mulher? Aliás, ela é mesmo uma aliada ou uma vilã da saúde feminina?

Segundo o ginecologista Walter Pace, é importante, antes de mais nada, entender melhor sobre essa marca na vida da mulher – a última vez em que ovula e menstrua – para só depois entender o papel dos hormônios e a necessidade de reposição. Isso porque eles estão intimamente ligados. “A menopausa, de fato, é uma data. É a data da última menstruação. Ela normalmente se confunde com o período pré e após, que chamamos de climatério. Como fenômeno biológico, é importante que se entenda que a menopausa é a falência do ovário”, explica.




 
“É exatamente esse o nome que damos em medicina para a última data. E é extremamente importante que se entenda que hormônio não faz mal a ninguém, o que faz mal em hormônio é a carência ou o excesso. Um exemplo: uma pessoa, quando tem muita insulina no corpo, ela vai ter hipoglicemia, e se ela tiver pouca, ela terá diabetes. Nas duas situações, nós vamos ter que tratar. Outro exemplo é a tireoide. E assim funciona com todos os hormônios produzidos pelas várias glândulas que temos pelo corpo. Então, hormônios, em resumo, não fazem mal. O que faz mal, de fato, é o excesso ou a carência”, afirma.

No caso da menopausa, há redução dos hormônios reprodutivos. Ou seja, quando há falência do ovário, estabelece-se uma carência dos hormônios femininos que, claro, desempenham papéis importantes na qualidade de vida das mulheres. E, segundo Márcia Mendonça Carneiro, ginecologista do Grupo Oncoclínicas, as modificações que levam à menopausa podem começar até oito anos antes e se manifestar por irregularidade menstrual.

Entre os sintomas estão ondas de calor, alterações do sono e humor, ressecamento vaginal, além do aumento do risco de doenças cardiovasculares e osteoporose. Ainda, irritabilidade, indisposição, piora na qualidade da pele e do cabelo, diminuição da libido e memória e dificuldade de ganhar massa são outros sinais da menopausa. E eles têm relação importante com a depressão. “Muitas vezes, a queda dos hormônios leva a situações que se confundem com quadros de ansiedade, depressão e que levam ao uso de antidepressivos, ansiolíticos, medicamentos para dormir, que muitas vezes não têm a ver com um desequilíbrio do ponto de vista psicológico.” É o que explica Walter Pace.





De acordo com a especialista do Grupo Oncoclínicas, por essas razões, esse processo fisiológico é temido por algumas e cercado de mitos. “Soma-se a isso a questão cultural na qual parte da sociedade tem dificuldade em aceitar que o tempo também passa para as mulheres e que o importante é envelhecer bem e com saúde. Uma das crenças relacionadas a esse período de transição é o ga- nho de peso. As mudanças hormonais mudam a forma de deposição da gordura, mas associada a maus hábitos alimentares e ao sedentarismo é que irão resultar no aumento de peso”, esclarece.
 
(foto: Via Comunicação/Divulgação )
 

Muitas vezes, a queda dos hormônios leva a situações que se confundem com quadros de ansiedade, depressão e que levam ao uso de antidepressivos,  medicamentos para dormir, que muitas vezes não têm a ver com um desequilíbrio do ponto de vista psicológico”


Walter Pace, ginecologista

DOSAGEM DE HORMÔNIOS 

Em caso de sintomas, Walter Pace afirma ser muito importante que a paciente procure um médico, porque histórico e anamnese devem ser benfeitos, assim como exames laboratoriais, para dosar hormônios. A partir do momento em que for identificada a carência de hormônios, deve ser feita a reposição, o que mudou muito nos últimos anos.

“Hoje, temos formas de repor muito mais ‘naturais’ e seguras do que se fazia no passado. É importante que seja feito um acompanhamento pelo especialista, aquele que de fato conhece sobre os hormônios, sobre as características desses hormônios, das vias e da maneira mais propícia.”





“Também, cada dia mais, é importante individualizar essas mulheres, porque as mulheres de fato são diferentes. A reposição hormonal, assim como o atendimento, deve ser o mais individualizada possível em uma abordagem médica com boa coleta de informações, boa anamnese e boa avaliação física. E a partir do momento em que se identifica essas características de cada mulher, você vai repor. Hoje, essa reposição é feita com o principal hormônio, que é o estrogênio, e temos como repor hormônios de forma idêntica aos que produzimos.”

Ele explica, inclusive, que há a tendência de repor a testosterona, que apesar de ser hormônio masculino, o ovário também é o seu principal produtor. “Quando há falência, também tem o seu decréscimo, e a sua reposição em parâmetros femininos tem ga- nhos. Essas reposições devem ser feitas, preferencialmente, pela via periférica, porque reduz os efeitos colaterais, já que qualquer hormônio, quando usado oralmente, promove efeito de coagulação, que aumenta o risco de acidentes vasculares e efeitos indesejados.”

SINTOMAS 

Nesse cenário, a reposição hormonal é importante para restabelecer a qualidade de vida da mulher, haja vista a redução dos sintomas. “A reposição, de maneira geral, será sempre necessária em pessoas que tiverem sintomas correlacionados. Todas as vezes que a mulher manifestar qualquer tipo de sintoma, passa a ser necessário. Existem situações, no entanto, em que ela é mais necessária, por exemplo, pacientes com osteoporose, eles se beneficiam muito dessa terapia de reposição hormonal.”





A terapia deve ser iniciada assim que os sintomas são manifestados. “E embora a literatura diga que ela deve ser feita por 10 anos, é preciso entender que depois desse tempo o ovário não volta a funcionar e estará presente a carência. Então, como a via periférica devolve apenas o que o corpo deixou de produzir, e não há contraindicação ao longo do tempo, não tem por que interrompê-la, ela pode ser feita pelo tempo que for necessário. Agora, a terapia tradicional deve ser limitada”, explica Walter Pace.

Porém, ele pondera a existência de algumas contraindicações, principalmente quando o método de reposição hormonal adotado é o oral. “Quando usamos a boca e há a passagem pelo fígado, podemos alterar o fator de coa- gulação. E isso pode levar a determinados acidentes vasculares. Então, utilizando a via oral, com a passagem pelo fígado, todo e qualquer passado de doenças tromboembólicas e de acidentes vasculares deve ser contraindicado por essa via.”

“Quando temos o emprego da progesterona nessa reposição, temos que tomar muito cuidado com os fatores de risco para câncer de mama e todas e quaisquer doenças que envolvam a passagem desse hormônio pelo fígado. Quando utilizamos a via periférica, em que não há passagem pelo fígado, a maioria das contraindicações são bem menores. Acredito que a principal contraindicação quando utilizamos hormônios idênticos, empregando a via periférica, que é por transplante, gel ou via transdérmica, fica limitada à história de câncer anterior naquela pessoa.”




Palavra de especialista

Clécio Lucena - mastologista, cirurgião das mamas e professor do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da UFMG

Indicação requer cautela

“A reposição hormonal é uma terapia destinada a minimizar os efeitos da redução hormonal causada pelo processo do climatério e da menopausa. Seu uso pode aliviar os sintomas desses processos naturais. No entanto, há efeitos indesejados importantes, especialmente para as mulheres que já passaram pelo tratamento do câncer de mama. Uma das contraindicações formais da TH é naquelas pacientes que já passaram pelo tratamento desse tipo de câncer. Além disso, o uso prolongado dessas medicações implica aumento do risco do câncer de mama e devem ser sempre considerados riscos e benefícios no contexto do risco individual de cada paciente. Por isso, a indicação desse tipo de terapia deve ser feita com muita cautela e sempre por um profissional capacitado. Importante destacar que para iniciar essa terapia é preciso analisar sempre as suas reais indicações, bem como fazer uma boa investigação da história pessoal e a realização de exames específicos para descartar doenças coexistentes e termos segurança na melhor prescrição de cada mulher. Mulheres com casos de câncer de mama na família, em especial nos parentes de primeiro grau e em idade jovem, com perfil para serem portadoras de predisposição hereditária, necessitam de um julgamento mais criterioso antes de iniciarmos a terapia hormonal com segurança.”
 
*Estagiária sob a supervisão da editora Teresa Caram
 

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