Jornal Estado de Minas

COMPORTAMENTO

Stalking: prática agora é crime e há proteção da lei

Justiça e leis, sabemos, nem sempre andam juntas ou na mesma sintonia. Mas, ainda que em determinados casos sejam dissociadas, são fundamentais, essenciais e vitais na luta por direitos e deveres, punições e absolvições. Em 31 de março de 2021, foi sancionada a Lei 14.132/21, que incluiu o artigo 147 no Código Penal, criminalizando a conduta de perseguição: o stalking. Lei que está valendo desde 1º de abril e prevê pena de seis meses a dois anos de prisão, além de multa.





Mas, qual é a sua importância? Para Leonardo Vilela, professor de direito processual penal da Estácio Belo Horizonte, mestre em direito público e advogado, a lei é muito importante para trazer novas formas de combate à violência, especialmente contra a mulher, a principal vítima desses crimes.

“A internet e o anonimato que muitas pessoas acreditam que existe fomentaram diversas condutas de perseguição causando danos psicológicos e até físicos. Por isso essa lei é muito importante e bem-vinda.”
 
Será que a lei do stalking será colocada em prática? Será aplicada? Para Leonardo Vilela, falando especificamente de violência doméstica ou contra a mulher, em geral, um feminicídio ou violência física é precedido de violências psicológicas ou formas consideradas por muitos como “leves” de violência psicológica (como o stalking).

Segundo ele, existem vários estudos que demonstram que quando se coíbe a violência contra a mulher logo nos seus primeiros sintomas, pode-se evitar um mal maior. “Por isso, espero que tenhamos efetividade de tal lei. Muitas vidas podem ser salvas.”





Não é sempre, mas os stalkers são na maioria homens. O que nos remete aos casos de violência contra a mulher que envolvem o medo de denúncia, medidas protetivas frágeis (em muitos casos o distanciamento não é respeitado e ocorre o feminicídio). Com a lei do stalking, as vítimas estão sujeitas ao mesmo cenário? A vítima que ficar cara a cara com o seu stalker durante o processo penal será protegida?

“Por vários motivos, a polícia e o Judiciário são lentos. Isso traz um problema sobre a efetividade das leis. A criação de varas específicas de violência doméstica melhora a situação, mas essas varas estão restritas a cidades maiores. O resultado é justamente a falta de efetividade das medidas, não porque a lei é ruim ou falha, mas porque as instituições de Estado que deveriam investigar e julgar estão sem condições de fazer isso de maneira eficiente. A vítima, em uma situação de violência (seja física ou psicológica) deve procurar imediatamente a delegacia especializada (Delegacia da Mulher ou de crimes informáticos). E ela não precisa de ter medo, pois a lei brasileira prevê diversas medidas de proteção, entre elas a de não precisar prestar declaração com o agressor na mesma sala”, enfatiza Leonardo Vilela.

PRINT DE TELA NÃO É PROVA 


Como toda nova lei e, principalmente, diante de novos comportamentos, dúvidas e questionamentos são naturais. Então, até que ponto o stalking será configurado como crime? Quais limites e contornos a lei impõe entre a paquera incisiva e a perseguição? Quando a vítima reconhece sua privacidade invadida e daí terá a segurança de agir?

Conforme Leonardo Vilela, a lei poderia ter delimitado melhor qual a exata conduta criminosa. Com a atual redação, explica, podemos considerar crime qualquer conduta feita com certa rotina que envolva perseguição – seja física ou via internet, causando medo na vítima, fazendo com que sua liberdade de ir e vir fique comprometida ou invadindo sua privacidade, seja expondo informações íntimas ou atacando a reputação da vítima por qualquer meio.

(foto: Arquivo Pessoal)
 

Diante do enfrentamento do stalker, é preciso que as vítimas reúnam provas, mas como conseguí-las? Essa é outra barreira. Fazer “prints” de conversas, guardar gravações, conseguir fotos são provas de stalking? O ideal, de acordo com recomendação de Leonardo Vilela, é que, em qualquer situação como essa, a vítima procure a polícia. Como na maioria das vezes o crime se dá via internet, a polícia está preparada para a coleta de provas de forma eficiente para que possam ser usadas em um processo.




 
“É importante não apagar mensagens e, caso tenha testemunhas, levar seus dados para a polícia. Caso a vítima queira se resguardar, ela pode também procurar um cartório de notas para fazer a chamada ata notarial, onde o cartório irá certificar que as mensagens são legítimas. O "print" de uma tela, isoladamente, não pode ser considerado prova em um processo judicial. É importante também que a vítima não incentive o agressor de qualquer forma. Além de se colocar em situação de risco, essa ação pode ser considerada ilegal e prejudicar o processo.”
 
Leonardo Vilela explica que, quando se tratar de violência doméstica ou contra a mulher, a orientação é procurar a Delegacia da Mulher, onde ela terá um atendimento humanizado e preparado para seu acolhimento. “Se não for o caso de violência contra mulher, ou nas localidades onde não houver essa delegacia, e o crime for praticado via internet, a vítima deve procurar a delegacia especializada em crimes informáticos. Esse é um crime que precisa que a vítima se manifeste para que o Estado possa agir. A vítima tem seis meses após saber quem é o ofensor para se manifestar nesse sentido (que é chamado tecnicamente de representação penal). Caso ela não saiba quem é a pessoa praticando a conduta, deve tomar as atitudes mesmo assim, para que a polícia possa chegar ao autor e, consequentemente, permitir que ela faça a representação.”

QUEM É A VÍTIMA DO STALKER?*

A lei está aí, portanto não pense duas vezes em denunciar um stalker (foto: kropekk_pl/Pixabay )

Qualquer pessoa pode ser vítima de assédio persistente, independentemente da idade, género, religião, classe social/nível socioeconómico, formação ou estado civil. No entanto, as investigações sobre esta forma de violência têm chegado à conclusão que as mulheres jovens representam um grupo mais vulnerável.



  1. Vítima de ex-parceiros (as).
  2. Vítimas de conhecidos(as) ou amigos (as).
  3. Vítimas no contexto de uma relação profissional. Determinadas profissões ganham destaque, como profissionais de saúde, assistentes sociais, advogados, professores e psicólogos. E há casos que o fim da relação profissional pode gerar situações de assédio persistente.
  4. Vítimas em contexto laboral: habitualmente praticado por empregadores, colaboradores, colegas ou clientes.
  5. Vítimas por desconhecidos(as)
  6. Celebridades vítimas
  7. Falsas vítimas: são situações em que os papéis se invertem, isto é,  o autor dos comportamentos de assédio persistente acusa intencionalmente a sua vítima de o perseguir, assediar, como forma de retaliação ou com o objetivo de prolongar ou manter os contatos com o mesmo.
*Fonte: APAV - Apoio à vítima

 


audima