Jornal Estado de Minas

REABILITAÇÃO MUSCULAR

Triciclo melhora qualidade de vida de pessoas com lesão muscular; entenda

Pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) desenvolveram um triciclo que permite a reabilitação muscular de pessoas com limitação de movimentos – paraplegia ou tetraplegia. O equipamento, batizado de Power Trike, está em fase avançada de pesquisas e faz com que o paciente movimente os membros antes completamente inativos


O projeto é desenvolvido por pesquisadores da UFMG em parceria com a Universidade de Brasília (UnB); a Universidade Montpellier, na França; e a empresa mineira Visuri.




 
O objetivo do triciclo não é a cura, mas a melhoria da qualidade de vida, incentivando a independência, autonomia e inclusão social das pessoas – segundo o Censo Demográfico de 2010, cerca de 7% da população brasileira apresenta dificuldade em se locomover.  

Elaborado segundo o conceito de máquinas que formam unidade com o corpo, o equipamento tem um sistema híbrido que alia ferramentas diagnósticas, terapêuticas, assistivas e de longa duração. 

O triciclo utiliza a eletroestimulação funcional para mover os membros paralisados por meio de eletrodos que possibilitam contrações musculares, gerando movimentos cíclicos e a possibilidade de deslocamento.

A pessoa se movimenta por meio da força gerada pelas próprias pernas paralisadas, que são estimuladas artificialmente, em conjunto com os músculos preservados e os parcialmente preservados.





"O dispositivo vai garantir acessibilidade urbana com ativação duradoura da musculatura paralisada e avaliar em tempo real a função neuromuscular, prevenindo polineuromiopatias e contribuindo para restauração e reabilitação", explica Henrique Martins, professor do Departamento de Engenharia Elétrica da UFMG e integrante do projeto.

‘Emoção de pedalar novamente’


As pesquisas com voluntários começaram em 2018, quando pesquisadores da UnB, por meio do Núcleo de Tecnologias Assistivas, Acessibilidade e Inovação da Universidade (NTAAI), e a Visuri iniciaram em conjunto o desenvolvimento do sistema.

Os atendimentos são oferecidos no núcleo em parceria com a Associação de Centro de Treinamento de Educação Física Especial (Cetefe). 

“Os voluntários são submetidos a uma consulta médica, avaliações de densitometria óssea e avaliação do nível neurológico da lesão”, detalha o pesquisador David Lobato, que conduz os atendimentos no NTAAI.



O tratamento é baseado em eletroterapia, eletrodiagnóstico motor e sensorial, fortalecimento da musculatura paralisada por meio de eletroestimulação e ciclismo estático e dinâmico assistido pelo triciclo.

O assistente social José Higino Oliveira Souza, 36 anos, morador de Brasília, conta que sofreu um acidente aos 17, teve lesão medular nas vértebras C6 e C7 e ficou tetraplégico

Ele é paratleta desde 2010. Integrou a Seleção Brasileira de Rúgbi
em cadeira de rodas, disputou os Jogos Paralímpicos do Rio'2016 e de outras edições da Paralimpíada.

Em 2018, surgiu a oportunidade de participar do projeto, na Cetefe, em Brasília, ainda no início do desenvolvimento. "Fiz muitos anos de fisioterapia sempre mais focada nos membros superiores, em função do rúgbi e para as funções do dia a dia. E a Trike me trouxe uma nova perspectiva de movimento das pernas”, diz.





Higino conta que teve vários ganhos nesses dois anos de terapia: “Além da melhora do tônus muscular e da redução dos espasmos, senti a emoção de pedalar novamente. Mexeu com minha autoestima. Gostava muito de fazer isso antes do acidente. O que me atraiu a participar do projeto-piloto foi a possibilidade de sentir de novo o movimento das pernas e de dar uma volta, umas pedaladas, me lembrar das sensações de quando pedalava."

Diagnóstico, intervenção e assistência


Em Belo Horizonte, o pesquisador Tiago Coelho Magalhães, doutorando em Engenharia Elétrica na UFMG, trabalha atualmente no Laboratório de Engenharia Biomédica (Leb-UFMG) com o paciente voluntário Jonatas Moreira, que apresenta quadro de paraplegia com lesão torácica (T8), desde 2007. 

Os atendimentos resultaram em melhorias fisiológicas significativas e serão publicadas em artigos científicos, Além disso, o paciente conseguiu aumentar o tempo de pedalada, que chega aos 40 minutos de forma contínua.



A pesquisa também prevê assistência para atletas paralímpicos do Centro de Treinamento Esportivo (CTE) da UFMG, que ainda não foi iniciada devido à pandemia da COVID-19

Em janeiro deste ano, o projeto foi aprovado pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), que garante a continuidade das pesquisas e do triciclo híbrido.

A expectativa é que, ao final do projeto, em até três anos de trabalho, seja possível entregar um produto de qualidade, eficiente e acessível. 

“O objetivo é também incorporar a Power Trike ao mercado e à tabela de órteses, próteses e meios auxiliares de locomoção concedidos pelo SUS (Sistema Único de Saúde). O objetivo é desenvolver um sistema com um conjunto de serviços inovadores para diagnóstico, intervenção profilática e terapêutica, bem como assistência de longa permanência”, afirma Henrique Martins.
 
*Estagiária sob supervisão da subeditora Kelen Cristina

audima