Jornal Estado de Minas

COVID-19

Coronavírus: estudo aponta tendências pós-pandemia

Jaqueline Bifano, psiquiatra (foto: Guilherme Breder)
 
Um estudo realizado pela Toluna, fornecedora de insights do consumidor sob demanda, identificou as principais mudanças nos hábitos e comportamentos dos brasileiros, após a chegada do novo coronavírus no país e a recomendação dos órgãos oficiais de saúde quanto as medidas de isolamento social. A pesquisa apontou, também, as tendências que, possivelmente, se tornarão o “novo normal” no cenário pós-pandemia



Para a psiquiatra Jaqueline Bifano, a necessidade de permanecer em casa por mais tempo fez com que as pessoas ressignificassem suas atitudes, passando a ter contato e adquirir somente o necessário, a analisar, em termos nutricionais e informativos, o que consomem e, também, a terem maior cuidado com a saúde física e mental

“A pandemia colocou toda a população em alerta sobre vários aspectos e hábitos do dia a dia. Sendo assim, alguns costumes, que antes não eram tidos como importantes, começaram a ser experimentados. Além disso, a necessidade de higienização de objetos, uso de máscaras e demais equipamentos de proteção impôs uma nova realidade às pessoas.” 

Neste contexto, Jaqueline comenta que, ao reinventar e criar novas habilidades e hobbies, uma nova ideia de futuro foi criada. “O mundo que existia antes do coronavírus ficou para trás. Mesmo que, de maneira hipotética, o vírus sumisse ou uma vacina e cura para a COVID-19 fosse encontrada na próxima semana, o Brasil e o mundo não seria mais o mesmo. E, as pessoas também não.” 

Por isso, a psiquiatra ressalta que um “novo normal” tende a surgir. “Todo esse cuidado com a própria saúde, física e mental, a atenção com a higiene e o consumo de forma mais ponderada e menos capitalista vão continuar presentes.” 

Jaqueline considera, ainda, essa tendência positiva. Isso porque, segundo a psiquiatra, as pessoas têm pensado e agido de forma mais humana, e percebido a fragilidade presente em cada vida, contato e relação. E, sendo assim, a percepção de falta de controle sobre a situação é constituída e toda a situação ressignificada

“O que antes não dávamos tanta importância, passa, agora, a ser essencial, como os hábitos de higiene mais minuciosos. O consumismo excessivo dá espaço para aquilo que é considerado de necessidade. As relações familiares ganham mais atenção, já que grande parte das famílias agora só conseguem se ver por vídeo ou se falarem por telefone.” 
 

 
Além disso, Jaquelique destaca que, ao se preparar para tempos difíceis, as pessoas tendem a se organizar e realocar as prioridades, dando, assim, maior valor a pontos que antes eram considerados supérfluos e deixados de lado. 



Para Luca Bon, diretor-geral da Toluna para a América Latina, ao analisar os resultados da pesquisa classifica essa tendência como um “acelerador do futuro”, ou seja, muitas mudanças ocorridas no modo comportamental das pessoas, em meio à pandemia, já seriam previstas, mas só seriam notadas a longo prazo. E, quanto a isso, acredita que alguns desses costumes tendem a ser benéficos

“Nós já deveríamos limpar tudo que entra em casa, deveríamos usar mais o trabalho e estudo remoto, principalmente nas grandes cidades, deveríamos já estar habituados ao ‘menos é mais’, tanto em consumo, quanto em atitudes”, ressalta. 

No entanto, Bon pontua que há ressalvas a serem feitas quanto a positividade desses novos hábitos, visto que o estudo feito aponta que mais de 50% das pessoas afirmam que não voltariam a frequentar shows, bares, shoppings, hotéis e/ou academias, sem antes tem certeza da existência de uma cura ou vacina contra a COVID-19



“Um ponto negativo é que os negócios terão de se reinventar, tanto estabelecimentos para shows, quanto eventos esportivos, para que novas formas de arrecadar dinheiro sejam aplicadas. Para a economia, os novos hábitos podem significar um problema.” 

Jaqueline destaca, também, que alguns costumes podem se tornar negativos ao serem condicionados de forma “paranoica”, a considerar que algumas pessoas já têm diagnóstico obsessivo e este pode ser um fator capaz de potencializar esse quadro.

Outro ponto ressaltado pela psiquiatra diz respeito ao exagero de proximidade, visto que o contato limitado durante a pandemia pode tornar as pessoas mais afetuosas, podendo, inclusive, invadir a privacidade e o espaço do outro quando esse contato for reestabelecido. 

“A acomodação também pode ser negativa. Atualmente, muitas pessoas estão trabalhando e realizando diversas atividades de casa. É muito importante entender que isso está acontecendo, hoje, pela necessidade, mas que, aos poucos, as atividades voltarão ao normal. Não podemos nos isolar por completo quando a pandemia acabar, seja no querer apenas o home office, seja no não querer mais frequentar academia ou mesmo no não ver os amigos.” 

Novos hábitos 


De acordo com a pesquisa realizada pela Toluna, os entrevistados apontam que alguns dos costumes adquiridos durante o isolamento social devem continuar a fazer parte de seus cotidianos. Entre eles, o hábito de higienização das mãos (59,5%), cozinhar (49,6%), fazer cursos online (43%) e ir ao mercado ou farmácia somente em casos essenciais (40,6%). 



Jaqueline acredita que a manifestação do desejo de dar continuidade a esses hábitos mostra que as pessoas são capazes de se reinventar, e que, por isso, se adaptam a situações e as transforma em pontos produtivos.

Além disso, a psiquiatra acredita que devido a maior atenção destinada aos cuidados físicos e mentais, algumas práticas destinadas a esse propósito também tendem a ganhar o título de “novo normal”

Luca Bon, diretor-geral da Toluna para a América Latina (foto: Divulgação)
“A rotina de uma alimentação mais equilibrada e técnicas que promovem mais tranquilidade, serenidade e saúde mental, como a ioga e meditação também podem ser aspectos capazes de continuar a fazer parte da vida de várias pessoas.” 

Ainda, para a psiquiatra, as vendas on-line e os serviços delivery também tendem a continuar no cenário pós-pandemia



O diretor-geral da Toluna para a América Latina, Bon, destaca, também, o home office como um novo costume a ser inserido no cotidiano do trabalhador brasileiro. Isso porque a produtividade não sofreu interferências e os gastos se tornaram menores.

“Muitos empresários perceberam que, durante o isolamento social, houve uma produção igual ou melhor àquela que era obtida no escritório, e ainda existe uma grande chance de economizar em custo fixo, como luz, aluguel, vale-transporte, entre outros”, comenta. 


A pesquisa 

 

O estudo foi feito ente os dias 14 de fevereiro e 17 de abril deste ano e a princípio buscava entender o posicionamento e a relação do brasileiro com o isolamento social. No entanto, Bon conta que os dados não apresentavam mudanças e apontavam para um constante medo da população quanto ao novo coronavírus. Por isso, a pesquisa passou a ser destinada a abranger as novas tendências no cenário pós-pandemia



Os resultados apresentados pelo estudo apontam que 63,6% das pessoas acreditam que o trabalho remoto irá se manter. Além disso, os índices indicam que 58% dos entrevistados acham que a educação a distância será postergada e 57% que a busca por novos conhecimentos continuará.

Ainda, 54,3% afirmam ser perceptível que novos modelos de negócios para restaurantes surgirão e 49,6% consideram a revisão de crenças e valores uma nova atribuição após o fim da pandemia. 
 
Bon pontua que outro resultado interessante diz respeito a uma pergunta incluída na pesquisa sobre o que mais tem feito falta ao brasileiro. “As respostas mais citadas foram ‘abraçar as pessoas’, seguida por ‘ter a rotina de volta’ e ‘encontrar com pessoas'. O povo brasileiro é conhecido por ser quente e gostar de abraçar e beijar, mas, infelizmente, terão que deixar essa normalidade para trás como parte do ‘velho normal’, pelo menos até que seja desenvolvido um medicamento ou vacina.” 

A pesquisa apresenta confiabilidade de 95% e margem de erro em torno de 3%. E, pode ser acessada pelo site da Toluna. 

* Estagiária sob a supervisão da editora Teresa Caram