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Estado de Minas REPORTAGEM DE CAPA

O que ensinam benzedeiros responsáveis por rituais para todos os males

Seja para curar um mal físico ou para blindar contra "inveja e mau-olhado", muitos recorrem aos benzedeiros, confiantes nos rituais para ajudar a resolver problemas


postado em 22/12/2019 04:00 / atualizado em 22/12/2019 08:31

Seu Mário, de 86 anos, dedica sua vida a apaziguar almas e expulsar dores e sofrimentos de quem o procura na comunidade dos Arturos, em Contagem(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Seu Mário, de 86 anos, dedica sua vida a apaziguar almas e expulsar dores e sofrimentos de quem o procura na comunidade dos Arturos, em Contagem (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)


Benzer ainda é comum em alguns bairros de Belo Horizonte e cidades de Minas. Bastante procurada, a prática produz filas diárias de pessoas de várias gerações na comunidade quilombola dos Arturos, em Contagem, região metropolitana da capital mineira. A busca é pelos poderes curativos que vêm das mãos e do espírito solidário de Mário Bráz da Luz, de 86 anos, 51 dos quais dedicados a apaziguar almas e expulsar dores e sofrimentos da carne. A preservação dessa e de tantas outras tradições de danças, festividades e eventos religiosos vindos dos tempos da escravidão tornaram os Arturos patrimônio imaterial e cultural do estado de Minas Gerais.
 
Bem-humorado, seu Mário conta que na juventude “desdenhava” da irmã Juventina, parteira e benzedeira. “Eu ria dela e dizia que ela ficava 'batendo beiço' durante os rituais de bênção. Até que um dia, eu já com 19 anos e trabalhando em uma fazenda, tive uma dor de dente muito forte. Estava transtornado e ela me chamou para benzer. Não é que voltei ao trabalho sem nenhuma dor?” Ela ensinou os 10 irmãos a benzer e disse ao Mário que ele seria “bom nesse afazer” porque era muito paciente. “E me passou o bastão. Ela adoeceu e me pediu para benzê-la, e acabou sarando. Continuo até hoje.”
 
(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press %u2013 8/4/14)
(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press %u2013 8/4/14)
 
A comunidade recebe gente de “toda parte” de segunda a sábado, em busca da “cura” proporcionada por Mário. Sentado em uma poltrona, com um terço nas mãos e alguns objetos e plantas ao redor, ele recebe as pessoas, com um largo sorriso, no terreiro diante da capela da comunidade. A rotina é longa: de segunda a sexta-feira, atende os combalidos das 8h30 às 17h30 e, aos sábados, até as 16h.

AMBIENTE DE TRABAHO O orçamentista Sideni de Souza Faria, de 40 anos, morador do Bairro Bernardo Monteiro, em Contagem, começou a visitar a comunidade dos Arturos por indicação da sogra, frequentadora da comunidade. Naquele dia, foi em busca de proteção contra “inveja e mau-olhado” em seu ambiente de trabalho. “Mais como precaução, porque recebi uma promoção e tive a intuição de que alguns não a aceitaram de bom grado.” Ele conta ser comum levar toda a família tanto para cura quanto para proteção.
 
Igara Laís e Silva Soares, de 28, advogada, visitou a comunidade pela primeira vez. Moradora do Bairro Santa Inês, Região Leste de BH, carregava no colo o filho mais novo, com um mês de nascido, e de mãos dadas com o mais velho, de 1 ano e 6 meses. “Meu marido e minha sogra sempre frequentaram e me falavam. Era meu sonho estar aqui. Meu filho já está com quase 2 anos e não fala, e o pequeno chora muito.” Com um terço em uma das mãos e um sininho de metal na outra, seu Mário discorreu várias palavras e orações, depois tirou uma água ungida de uma garrafa encheu o sino e deu ao pequeno para beber, que a degustou sem hesitar.
 
A sogra da advogada, Izabel de Araujo Rodrigues, a Iza, de 84, a acompanhou. “Há 30 anos, vim morar em Contagem com meu marido e conhecemos o Mário, que acabou morando por uns 14 anos no mesmo sítio.” Ela conta que lutou por muito tempo contra uma infecção crônica na garganta de um de seus filhos. “Ele tomava inúmeros medicamentos, sem solução, e foi curado pelas bênçãos do Mário.”

livro de orações  Rita de Cássia Pinho Vieira Maciel, de 58, conhecida como Mãe Rita, foi iniciada por uma mãe de santo, chamada Flor de Liz na região do Caiçara, onde passou a morar na adolescência. “Um dia ela me chamou, apontou uma gaveta e pediu que retirasse um livro de orações e o guardasse, dizendo 'daqui a um tempo vou passá-lo pra você'. Sete meses depois, Flor de Liz faleceu. “Passados uns meses, recebi um envelope que ela havia deixado em meu nome com um familiar para me entregar e dentro havia uma oração que uso nos benzimentos.”
 
Seus primeiros trabalhos tiveram início aos 21 anos, quando utilizou a bênção em favor do filho de uma amiga, com gastroenterite. “Ele chegou muito ruim em casa e fiz os procedimentos e ele ficou bem.” Desde então, nunca mais parou de benzer. Ela chega a atender até 30 pessoas em um só dia. Também benze a distância. Durante a conversa com a reportagem, os telefones da casa e o celular não paravam de tocar. Chegam pedidos de famílias até de países distantes, como Alemanha e Itália.

ESTRANGEIROS Ela recebe em sua casa, na região do Alvorada, em Contagem, visitas de estrangeiros que “vêm agradecer”, mas também pessoas em reclusão, ex-viciados em álcool e outras drogas. “Mas tem gente que não acredita e o familiar pode apenas trazer um objeto ou roupa dessa pessoa que eu benzo, também atendo crianças ainda no ventre, prematuros, cura de umbigo e outros que necessitam de alguma proteção espiritual”, ressalta. “Crentes ou não, rezo para todos com a mesma fé”, garante. As mãos são lavadas a cada cliente atendido, uma forma de descarregar as energias capturadas. Nunca cobrou ou cobra nada de ninguém. “Apenas peço ajuda para os rituais em homenagem a Obaluaê.”
 
Flávia Sílvia de Queiroz, makota (nome dado de acordo com a nação do candomblé para um cargo feminino de grande valor: a de "zeladora dos orixás"), é filha espiritual da mãe Rita. Trabalha no Hospital Municipal de Contagem. Ela conta que sua primeira filha, então com 2 anos, sofreu uma parada respiratória após engasgar. “Saí desesperada para a rua tentando parar um carro que nos conduzisse a um hospital, e encontrei mãe Rita vindo ao meu encontro.”
 
Rita conta que lavava roupa em sua casa na vizinhança de Flávia e teve um pressentimento que a fez deixar os afazeres e correr para rua. “Nos encontramos no momento em que passou um carro que nos acolheu”, levando-nos a um pronto-atendimento próximo. “Minha filha já não respirava e começava a roxear os lábios, Rita orava baixinho e benzia durante o caminho”, conta makota. Levada de imediato ao CTI, o médico que atendeu a criança disse que não sabia como ela sobreviveu e sem sequelas, fato comprovado depois de vários exames, uma vez que ficou por 20 minutos sem oxigenação no cérebro.


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