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Estado de Minas MEDICINA DO FUTURO

A decisão soberana é do médico

A IA já está presente na prevenção e no diagnóstico precoce do câncer, proporcionando terapêutica menos agressiva, mais direcionada e efetiva, além de estratégias personalizadas de redução de risco


postado em 25/11/2019 04:00 / atualizado em 25/11/2019 15:10

(foto: Geraldo Goulart Neto/Revista Encontro)
(foto: Geraldo Goulart Neto/Revista Encontro)


São inquestionáveis os avanços da ciência e da tecnologia que a cada ano revolucionam o tratamento do câncer. A inteligência artificial (IA) na medicina se faz de extrema valia quando se analisa uma quantidade muito grande de informações, dados, imagens, laudos, resultados de estudos científicos e algoritmos de estratificação de risco, de prognóstico e de opções terapêuticas diversas.
O oncologista e oncogeneticista André Márcio Murad, diretor-executivo da Personal Oncologia de Precisão e Personalizada, diretor científico do Laboratório Personal de Genética Molecular e do Grupo Brasileiro de Oncologia de Precisão (GBOP) e professor na Faculdade de Medicina da UFMG, explica que os dois principais ramos associados à IA na medicina são virtuais e físicos. “O componente virtual inclui aprendizado de máquina e algoritmos, enquanto a IA física engloba dispositivos médicos e robôs para a prestação de cuidados. A IA é usada com sucesso na segmentação tumoral, no diagnóstico histopatológico, diagnóstico genômico e molecular, rastreamento do desenvolvimento do tumor e estratificação dos fatores prognóstico é preditivos.”
 
André Murad afirma que a IA pode ter um imenso impacto na oncologia chamada “de precisão”. “Medicina de precisão ou medicina personalizada é uma abordagem médica subjetiva, que permite que os médicos selecionem a opção de tratamento mais benéfica para o paciente.”
 

"O tratamento oncológico na medicina personalizada é baseado na assinatura molecular do tumor, histórico da doença e condição de saúde atual do paciente"

André Murad, oncologista

 
 
Ele destaca que a IA já oferece aplicações importantes nos processos de descoberta de medicamentos, identificação das vias moleculares de tumores, pesquisa e desenvolvimento de novos medicamentos chamados alvo-moleculares, validação de medicamentos, descobertas de doenças com o mesmo perfil genético, de novos biomarcadores, de mecanismos moleculares de efeitos farmacológicos, análise dos grupos de pacientes mais responsivos a um tratamento específico e também nos algoritmos de interpretação de sequenciamentos genômicos e imagens radiológicas e anátomo-patológicas. “Exemplificando. Estudo recente de coorte de 26.525 pacientes atendidos em práticas oncológicas em um grande sistema de saúde acadêmico, algoritmos de aprendizado de máquina identificaram com precisão pacientes com alto risco de mortalidade em seis meses, com boa discriminação e valor preditivo positivo. Quando o algoritmo de aumento de gradiente foi aplicado em tempo real, a maioria dos pacientes classificados como de alto risco foi considerada adequada pelos médicos oncológicos para a expectativa de que seriam portadores de uma doença grave.”
 
André Murad enfatiza que a IA já está presente na prevenção do câncer e no diagnóstico precoce por meio de exames de imagem de rastreamento. “Na prevenção, ela se aplica bem à elaboração de algoritmos de estratificação de fatores de risco para o desenvolvimento de determinados tipos de câncer, sejam eles ambientais ou hereditários, e, assim sendo, orienta estratégias personalizadas de redução de risco e rastreamento para diagnóstico precoce. No caso das síndromes hereditárias de predisposição ao câncer, a IA nos ajuda a identificar as variantes genéticas herdadas em nosso DNA com mais segurança e eficácia. Já com relação ao rastreamento para diagnóstico precoce, a IA pode analisar com precisão imagens tanto de órgãos quanto de exames radiológicos, anátomo-patológicos ou moleculares, identificando indícios de câncer em fase precoce, indicando uma terapêutica menos agressiva e mais direcionada e efetiva.”

TOMADA DE DECISÃO O resultado do uso da tecnologia é tão fundamental que a IA atua em procedimentos cirúrgicos, em exames ou mesmo na produção de medicamentos para o tratamento do câncer. “A IA já é utilizada na identificação correta e precisa das chamadas drogas alvo-moleculares por meio do sequenciamento genético tumoral. Melhor explicando: o DNA tumoral é sequenciado por meio da moderna tecnologia do sequenciamento de nova geração (NGS), que tem a capacidade de sequenciar todo o genoma de um tumor em poucos dias. Entretanto, várias variantes (como mutações) são identificadas, cabendo então ao auxílio da IA o cruzamento dessas variantes com as melhores drogas-alvo já testadas na literatura e que atuem especificamente em tumores com essas variações.” A IA se mostra promissora na cirurgia robótica, não só na padronização dos procedimentos pré-operatórios como no poder de decisão. 
 
André Murad destaca que, por meio da montagem e interpretação de algoritmos, que por sua vez levam em consideração inúmeros dados da literatura médica, fatores prognósticos, preditivos, biomarcadores sanguíneos ou moleculares, história clínica e mesmo exames de imagem, a IA auxilia o médico na decisão da melhor conduta.

CONTROLE DA SEPSE Outro grande ganho proporcionado pela inteligência artificial, lembra André Murad, é que ela também atua no monitoramento de pacientes internados, para o controle de sepse, por exemplo, e fora do ambiente assistencial, o chamado monitoramento remoto. “A sepse adquirida durante uma internação hospitalar é mais mortal que a sepse obtida em outros lugares: quase um terço dos pacientes que adquirem sepse em um hospital morrem no primeiro nos primeiros seis meses, em oposição a uma taxa de mortalidade de 9,5% no total de casos de sepse que é adquirido fora do sistema hospitalar. Uma nova ferramenta de IA captura cerca de 4.500 dados de pacientes que têm registro eletrônico – temperatura corporal, frequência cardíaca, exames de sangue, histórico médico passado, sexo, local onde vive e assim por diante – e processa todas essas informações por meio de um algoritmo que avalia o risco de desenvolver sepse. O médico consegue estabelecer o risco individual de sepse para cada paciente, adotando assim medidas profiláticas mais eficientes, tratamentos mais precoces e monitorização em ambientes intra e extra-hospitalares.”
 
Com tantos avanços e benefícios, a pergunta é: essa tecnologia será acessível a todos? Chegará ao Sistema Único de Saúde (SUS)?. André Murad acredita que, com a comprovação inequívoca de seu real benefício e custo/benefício e a queda expressiva de seus custos, o que sempre ocorre devido à inevitável concorrência, seu emprego será disponível na rede pública de saúde. Esse fato ocorreu com várias outras tecnologias hoje disponíveis no SUS, como as cirurgias videoassistidas e o PET-CT.
André Murad avisa que “a IA será sempre um método complementar e instrumento de auxílio e apoio às decisões médicas, e nunca um substituto das ferramentas tradicionais imprescindíveis, como a relação médico-paciente, o exame clínico minucioso e a experiência do médico assistente. A decisão final é e será sempre dele! O ato médico é de responsabilidade exclusiva do médico”.
 
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pesquisas contra o câncer
 
O oncologista e oncogeneticista André Márcio Murad, diretor-executivo da Personal Oncologia de Precisão e Personalizada e professor na Faculdade de Medicina da UFMG, explica o resultado de pesquisas importantes que mostram a evolução  na luta contra o câncer.

Pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e do Massachusetts General Hospital desenvolveram um modelo para prever o câncer de mama até cinco anos antes de ele se manifestar. Os pesquisadores testaram a tecnologia com dados de 2009 a 2012 provenientes de 90 mil mamografias de mais de 6 mil pacientes do Massachusetts General Hospital. O sistema de inteligência artificial conseguiu detectar padrões sutis que não podiam ser identificados por humanos nos tecidos mamários, conseguindo antever as chances do desenvolvimento do câncer. A inteligência artificial previu 31% dos casos de pacientes de alto risco, o que é uma melhora significativa na prevenção da doença, uma vez que as técnicas tradicionais anteriores podiam prever apenas 18% desses casos.

André Murad: “Temos grande expectativa de que essa aplicação da IA seja cada vez mais utilizada. Além de exames mamográficos, exames tomográficos de rastreamento podem ser melhor avaliados pela IA. Um estudo recente, conduzidos por pesquisadores do Google e diversos centros médicos dos Estados Unidos, mostrou ótimos resultados da IA na identificação precoce de câncer de pulmão. Só no ano passado, a doença causou a morte de 1,7 milhão de pessoas. Os pesquisadores criaram uma rede neural com base em IA, “treinada” por meio do uso de diversas tomografias de pacientes cujos diagnósticos eram já conhecidos. Alguns revelavam o aparecimento de câncer de pulmão, algumas tomografias apresentavam exames de pacientes saudáveis e outros exames apresentavam nódulos que depois foram identificados como malignos. A rede desenvolvida tem como base um algoritmo que aprende à medida que é utilizado. Ele passa por um processo conhecido como aprendizado profundo (deep learning), algo já usado para permitir que computadores compreendam a fala e identifiquem objetos. Essa experiência foi preliminarmente exitosa, tendo como o resultado a identificação correta da maioria dos casos de nódulos malignos.”

O Hospital do Câncer Mãe de Deus, de Porto Alegre, é o primeiro da América do Sul a usar plataforma de IA contra o câncer. Uma tecnologia desenvolvida pela IBM que abrevia a busca pelo melhor tratamento possível: Watson for Oncology.

André Murad: “Sim, é verdade. O Hospital Mãe de Deus foi o pioneiro na América do Sul a utilizar o Watson for Oncology. A solução Watson for Oncology fornece aos médicos alternativas baseadas em evidências científicas mundiais. A plataforma de computação cognitiva em nuvem aponta tratamentos individualizados e orientados ao perfil de cada paciente diagnosticado com câncer. Na prática, o médico inclui no sistema as informações clínicas do paciente, com o seu histórico e resultados de exames. Com esses dados, a solução o auxilia a reunir informações específicas para o tratamento do paciente. O Watson for Oncology informa a relevância de cada tratamento identificado e fornece links de apoio para cada alternativa, indicando aos oncologistas quais são as opções de tratamento, medicamentos e possíveis efeitos colaterais. A plataforma foi inicialmente treinada pelo Memorial Sloan Kettering Center, um dos mais importantes centros de estudos sobre o câncer no mundo, sendo atualmente beneficiado por um processo de treinamento colaborativo com centenas de médicos oncologistas. Mais recentemente, a IBM e o Instituto do Câncer do Ceará (ICC) firmaram parceria para inserir o uso da inteligência artificial (IA) em tratamentos oncológicos e na tomada de decisões clínicas de seus pacientes, lembrando que se trata de uma instituição pública. Entretanto, cumpre-me ressaltar que a decisão final será sempre do médico assistente. Nenhuma informação proveniente da inteligência artificial irá substituir o raciocínio clínico, a experiência intuitiva, a relação médico-paciente e a autonomia médica na tomada de decisões.” 


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