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Estado de Minas

Falar é um passo importante

Não guardar a dor para si mesmo configura uma das saídas para a cura. Psicóloga, que perdeu o marido por suicídio, hoje é especialista no tema luto e prevenção, e palestra em todo o país


postado em 21/07/2019 04:14

Luciana Carvalho Rocha, psicóloga, diz que, por meio da dor, a vida lhe ofereceu nova oportunidade(foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press )
Luciana Carvalho Rocha, psicóloga, diz que, por meio da dor, a vida lhe ofereceu nova oportunidade (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press )








Você aceitaria participar de um jantar cujo intuito é conversar sobre a morte? Pois saiba que a empreitada existe desde 2012 e já foi realizada milhares de vezes, em mais de 30 países. Em Belo Horizonte, a psicóloga Luciana Carvalho Rocha é uma das anfitriãs do evento. E não por acaso. Desde que perdeu o marido de forma traumática, ela se especializou em tanatologia, luto, prevenção e posvenção ao suicídio. “Apesar de eu ser psicóloga há duas décadas, o ocorrido me pegou totalmente desprevenida. Foi aquele impacto, susto, trauma. Fiquei catatônica, mas a preocupação com nossos dois filhos, que na época tinham 5 e 10 anos, me fez reagir”, lembra.

Durante o período de luto, Luciana conta que o apoio de familiares e amigos foi fundamental, assim como a decisão de falar a respeito da dor e da convivência com o companheiro, com o qual estava casada há 15 anos. “Desde o início, decidi que tinha que seguir em frente. E o que me ajudou muito foi falar sobre o ocorrido e sobre ele. Acredito que, diante de um evento traumático, é importante viver a dor e essencial poder falar sobre ela. O mesmo ocorre com a morte, com o luto, assunto que precisamos desmistificar”, afirma.

A cicatriz, revela, é permanente. Mas Luciana diz que um trauma pode ser também oportunidade de aprendizado e crescimento. “Se a pessoa decide tirar proveito da dor, pode se desenvolver como ser humano. Depois de sete meses da perda, resolvi que queria trabalhar com isso, com pessoas enlutadas. E me especializei em luto, cuidados paliativos e prevenção e posvenção ao suicídio. Hoje, viajo todo o Brasil ministrando palestras e ajudando outras pessoas, inclusive nas redes sociais e via Skype. Já atendi pacientes até dos EUA e da Europa. Recebo muito retorno positivo, o que gera gratidão: por meio da dor, a vida me ofereceu uma nova oportunidade”, conclui.

REDE DO BEM 

Outro exemplo impactante de que é possível dar a volta por cima diante de adversidades vem da advogada e também psicóloga Juliana de Souza Ervilha. Atualmente com 40 anos, ela estava no consultório, atendendo um paciente, quando sentiu o sintoma do que seria, mais tarde, diagnosticado como esclerose múltipla. “Estava com 28 anos e havia acabado de me matricular na Faculdade de Direito. Quando recebi o diagnóstico definitivo, não tinha nenhuma referência sobre a doença, ainda pouquíssimo conhecida. Vivi um período muito difícil, pensei em desistir do curso, passei por todo o processo de perda de autoestima devido às crises, a ter que usar bengala, a ficar sem saber para quem contar ou não”, lembra.

No entanto, apesar das dificuldades, Juliana optou por enfrentar a doença de cabeça erguida e começou a reagir. “Com pequenas e grandes conquistas pessoais fui percebendo que minha vida antiga estava acabada. Mas que havia ganho outra, que poderia ser boa também. Enfeitei a bengala, quando me internava ia de pijama novo, de batom, fazia as unhas no hospital. A minha perspectiva passou a ser a busca da saúde e não apenas a de tratamento da doença.”

Com o tempo, as crises ficaram mais espaçadas. Juliana trabalhou um período na área de direito. Passou pela felicidade de um casamento e pela dor da separação. Num insight, decidiu fazer um Instagram para falar sobre a esclerose múltipla e os impactos da doença no cotidiano do paciente. Na primeira publicação, conquistou 40 curtidas. “Surpresa, pensei: olha, tem gente que dá importância para o que eu falo! Dali não parei mais. Hoje, falo que a vida me deu um limão e fiz dele uma limonada. Direcionei o canal para ajudar outras pessoas, inclusive a linkar a oferta gratuita de remédios a pacientes que precisam deles e não têm condições de comprar. A Rede do Bem também aborda a fibromialgia – diagnóstico que recebi há 4 anos e passei a tratar da mesma forma. Hoje, me orgulho de dizer que a rede social conta com 23 mil seguidores.”

Juliana destaca que a conta tem seções como depoimentos, novidades sobre as duas doenças, respostas com informações checadas e precisas, além de campanhas para a doação de remédios. O resultado é pura satisfação. “Sim, eu tenho esclerose múltipla e fibromialgia. Mas a minha vida e a de todos esses pacientes é preciosa demais para deixar a peteca cair. O valor que essa vida nova tem é imensurável, não chega aos pés da outra vida, a perfeitinha. Aprendi a me preocupar com essas vidas, e passar essa mensagem para mais e mais pessoas só me deixa mais feliz. Aprendi que nenhuma dor é maior ou menor que a outra. O dono da dor é quem sabe. Tive e tenho momentos difíceis, mas estou aqui com a minha família, com os amigos, seguindo e ajudando muita gente a ser feliz com a própria existência. Vale a pena viver!”
 

Dicas para reagir 

A psicóloga Luciana Carvalho Rocha indica alguns passos para superar as dificuldades e seguir em frente. Confira:

» Aposte na flexibilidade: pessoas muito rígidas têm mais dificuldade de se adaptar a novas situações;

» Prefira a opção de focar nas coisas boas e não nas ruins. No caso de um luto, por exemplo, pense em como a pessoa viveu, que é muito mais do que a forma como morreu;

» Meditar ajuda a manter o equilíbrio e a aceitar mudanças;

» A revolta não ajuda: procure entender o que ocorreu e aceitar o que a vida coloca para você;

» Filtre os pensamentos; quem só pensa no negativo corre o risco de desenvolver ansiedade, depressão e outras doenças. É você o responsável por direcionar suas ações e pensamentos;

» Importe-se menos com a opinião dos outros e siga o seu coração. Cada luto é único e individual. Não há receitas prontas. Faça o que é bom para você;

» A dificuldade persiste? Procure ajuda profissional. Muitas vezes, a psicoterapia aliada a tratamento clínico com psiquiatra ajuda o indivíduo a superar um momento ruim ou um trauma;

» Viva o presente e não perca energia executando mais de uma atividade ao mesmo tempo. Seja inteiro naquilo a que se propõe a fazer;

» O momento de ser feliz é agora. Por isso, pense em fazer o que pode de melhor hoje;

» Lembre-se: a forma como olhamos para o mundo e para as situações faz toda a diferença. Procure ter gratidão pelo que você é e pela forma como vive.

cinco perguntas para...

ângela mathyde soares
professora, pedagoga, psicopedagoga, escritora e CEO da clínica Aprendizagem e Companhia – Saúde Integral



O que é um trauma? 
O trauma é um dano emocional e ocorre mediante acontecimentos com os quais o indivíduo não dá conta de lidar, não elabora. Um trauma pode provocar vários sintomas emocionais, físicos, de relacionamentos e mesmo a síndrome do coração quebrado. Órgãos como pulmão, coração e rim sofrem muito com as questões dos traumas.

As crianças também têm sintomas que indicam traumas? 
Sim. Sintomas recorrentes como barriga ou cabeça doendo, birra, medo de dormir (terror noturno) podem indicar que há problemas emocionais com as crianças.

O que causa os traumas infantis? 
Situações de separação, como não dormir mais com os pais ou começar a ir para a escola, se mal trabalhadas podem gerar um trauma. Também o bulliyng ou o descaso pela história e/ou a presença da criança. Pais que acham que o social da criança é sair com eles, por exemplo, limitando o programa ao determinado por eles e não ao desejo do filho. Há toda uma gama aí de falta de cuidados que pode ter impacto emocional na criança.

Há dicas para observar se há algo errado?
A criança deve ser bem assistida em todas as fases do desenvolvimento. Então, os pais precisam saber o que ocorre na escola. Nunca agir com descaso para que o filho não tenha o sentimento de abandono. Estar atento à rotina, demandas e sinais que a criança dá. Mais uma vez, sintomas como sentir muito medo, presença de terror noturno, falta de apetite, fazer xixi ou cocô na calça com frequência, abusar da TV, internet e/ou dependência de jogos deve ser observado. Também tiques nervosos, mordidas, o comportamento agressivo, opositor em tudo, desafiador.

E como é possível buscar ajuda? 
Há profissionais que ajudam na reorganização das funções no ambiente familiar, auxiliam o monitoramento da criança pelo responsável, no entendimento dessa relação. Alguns cuidados básicos devem ser sempre observados, como a atenção às falas na presença da criança. Ações como falar mal do cônjuge (do pai ou da mãe), por exemplo, geram estresse, sintoma que existe até em bebês. O ideal é pensar que todos os aspectos do desenvolvimento infantil devem ser bem trabalhados e bem assistidos.


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